O ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Marco Aurélio Mello afirmou nesta terça (3), em Portugal, que existem três Supremos e que “a divergência intestina”, entre as duas turmas e o pleno do STF, traz descrédito à corte. Marco Aurélio fez o encerramento do Seminário de Verão da tradicional Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra.
“Nós temos três Supremos. Infelizmente. O vocábulo Supremo dá a ideia de órgão único, mas, pela necessidade de dinamizar os trabalhos, o Supremo está dividido. E a divergência intestina é péssima. Entre a primeira e a segunda turma. Entre a segunda e o pleno. É o que causa maior descredito”, afirmou à Folha o ministro, em referência ao tensionamento do debate no STF sobre a constitucionalidade da prisão em segunda instância, um dos pilares da Lava Jato.
“O ideal seria a modificação do sistema para nós não estarmos recebendo em cada gabinete, por semana, cerca de 150 novos processos”, completou.
a semana passada, decisões aprofundaram divergências que já existiam. Julgamentos da Segunda Turma, onde a maioria é contra prisão em segunda instância, soltaram condenados, incluindo o ex-ministro José Dirceu.
Marco Aurélio, que é da Primeira Turma, concedeu habeas corpus em decisão liminar ao ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha (MDB-RJ) e voltou a se queixar que a presidente da corte, Cármen Lúcia, evita marcar o julgamento em plenário de ações de relatoria dele sobre o tema.
No pleno do STF, onde recursos do ex-presidente Lula têm sido rejeitados, não há uma maioria definitiva.
todas as instâncias
Em Coimbra, Marco Aurélio novamente defendeu sua posição no tema, contrária à prisão antes de esgotadas todas as instâncias e recursos.
“Paga-se um preço por se viver em um Estado democrático de Direito e é módico: o respeito à ordem jurídica e à lei das leis, que é a Constituição. Com todas as letras nós temos nela que ninguém será considerado culpado antes da preclusão maior. Mil vezes ter-se culpados soltos do que um inocente preso”, afirmou o ministro.
tornozeleira
O magistrado também criticou despacho do juiz federal Sergio Moro, que, três dias após a concessão do habeas corpus a Dirceu pela Segunda Turma, determinou que o petista usasse uma tornozeleira eletrônica.
“Decisão do Supremo não é passível de aditamento. A ordem foi concedida segurando ao cidadão liberdade, e tornozeleira cerceia a liberdade”, disse Marco Aurélio.
A decisão foi cassada na última segunda (2) pelo ministro Dias Toffoli, que também integra a Segunda Turma e é contra a prisão em segunda instância.
número de ministros
Marco Aurélio ainda rebateu a proposta do pré-candidato Jair Bolsonaro (PSL) de aumentar de 11 para 21 o número de integrantes do Supremo, o que lhe permitiria indicar a maioria em seu mandato.
“Para quê? Para não se julgar nada no plenário? Hoje a nossa produção no plenário já é pífia. Com 21, eu fico a imaginar o que se tornará o plenário”, disse o ministro.
Bolsonaro anunciou a proposta na última segunda (2), em entrevista à TV Cidade, de Fortaleza, ao criticar as últimas decisões do STF. Segundo ele, seria uma maneira de “colocar dez isentos lá dentro”.
“A proposta peca pela falta de razoabilidade e ofende os atuais integrantes do Supremo. No que ele pretende colocar, na visão dele, que é uma visão de um populismo de direita, dez juízes independentes. Os [atuais] 11 são independentes”, completou o ministro.
Toffoli participou do seminário em Portugal, mas se recusou a falar com a reportagem. O ministro do STF Ricardo Lewandowski também foi um dos palestrantes do evento, repleto de magistrados brasileiros, incluindo ministros do STJ (Superior Tribunal de Justiça) e do TST (Tribunal Superior do Trabalho).
Comentários
Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.