Omissão de Joesley não livra Temer e Aécio, diz procurador

Autor de denúncia contra executivos da JBS e ex-procurador, Frederico Paiva afirma confiar no Supremo

 Frederico Paiva falando ao microfone
O procurador Frederico Paiva durante audiência pública na Câmara dos Deputados - Luis Macedo - 13.mai.2015/Reprodução/Câmara dos Deputados
Camila Mattoso
Samara (Rússia)

O procurador Frederico Paiva, do Distrito Federal, que assinou a denúncia contra executivos da JBS e o ex-procurador Marcello Miller, diz que “as omissões” de Joesley Batista “não apagam” os ilícitos cometidos pelo presidente Michel Temer e pelo senador Aécio Neves (PSDB-MG).

Na denúncia, o procurador sustenta que Miller, enquanto ainda fazia parte do Ministério Público, foi o estrategista da delação. Dos sete executivos que firmaram o acordo, cinco correm o risco de perder os benefícios por omissões, pactuados com o então procurador-geral Rodrigo Janot. Na semana passada, a Justiça aceitou a denúncia.

 

O que sua denúncia pode provocar? 
Isso é de atribuição do Supremo Tribunal Federal. Vai caber a eles decidir sobre a rescisão do acordo.

Qual a lição que esse caso Miller deixa? 
A função pública é 24 horas por dia. Desvios de conduta merecem punição. Em um país assolado pela corrupção, isso tem que ficar claro para todo servidor público. A função pública é sagrada e não pode ser usada como um meio para se enriquecer.

A delação da JBS deixa uma mancha no Ministério Público? 
Não. O Ministério Público está cortando da própria carne. Houve uma transgressão do Código Penal e isso será objeto de apreciação pela Justiça. Acho que um caso que atinge um ex-procurador deve ser punido com rigor. No plano teórico se pode questionar se a imunidade total e absoluta foi a melhor saída para o caso. Eu acredito que um acordo de colaboração tem de ser usado com responsabilidade e não pode significar impunidade.

Então o sr. acha que foi um erro o benefício da imunidade para os delatores? 
Eu acho que o instituto é novo e está em pleno processo de amadurecimento. O instituto é bastante útil. Agora, no plano teórico é questionável se a imunidade absoluta pode ser concedida. No plano prático, eu não participei, então não posso opinar.

Depois de tudo que aconteceu, o sr. acha que a JBS merece credibilidade?
As operações Bullish e Greenfield têm revelado que as múltiplas aquisições da empresa foram obtidas por meio de atos de corrupção. Eu acredito que os irmãos Batista não contaram tudo. São pessoas que lidam com corrupção com a maior naturalidade.

Há vários casos contra políticos sendo arquivados por falta de provas. As investigações são ruins? 
O crime de corrupção é de difícil descoberta. É preciso salientar que eram casos totalmente desconhecidos do poder público. Não se obtém êxito de 100% nas investigações. Em um país em que a prática política coincide com a prática de crimes, é preciso muitos anos para que o quadro mude. O Judiciário como um todo precisa evoluir muito ainda. A gente começou o trabalho, que está em andamento, mas já tem forte resistência, muito no Judiciário. É nítido o movimento de proteção da classe política, mas eu confio no Judiciário e confio no STF.

A participação de Miller na delação da JBS é a principal defesa do Temer e Aécio. Não tem receio de que sua denúncia possa ajudá-los de alguma forma? 
A participação do Miller não era de conhecimento do Ministério Público. Eu cumpri meu dever. Constatei elementos de crime e fiz a denúncia. A lei prevê que as provas podem continuar sendo utilizadas. Essa decisão cabe ao Supremo e não a mim. O que eu acho é que a omissão de Joesley Batista não apaga os ilícitos praticados por Aécio Neves e Michel Temer. Há duas denúncias contra Temer e elas vão voltar a tramitar no ano que vem. É o Supremo que vai decidir sobre as omissões de Joesley.

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