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Em Brasília, Boulos leva campanha para o bar e bebe 'litrão' com universitários

Evento em reduto de estudantes da UnB contou com público que é cativo de seu partido, o PSOL

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Brasília

"Nunca vi ninguém tomar café aqui, e faz sete anos que eu frequento", ri o militante do PSOL Kaio Mendes, 24, no bar Pôr do Sol, reduto dos estudantes da UnB (Universidade de Brasília) no final da tarde de terça-feira (28). 

Com uma camiseta laranja do Rua, movimento ligado ao partido, o ex-aluno da universidade espera a chegada do presidenciável Guilherme Boulos para uma agenda chamada oficialmente de 'Café com juventude' na capital federal.

Nas redes sociais, um evento paralelo chamava possíveis eleitores para tomar uma bebida diferente com o coordenador do MTST (Movimento dos Trabalhadores sem Teto): o "Litrão com Boulos", na Asa Norte, reuniu 760 interessados no Facebook.

No bar, às 18h30, militantes se aglomeravam nas mesas de plástico azuis e garrafas de um litro de cerveja —Brahma ou Antártica, a R$ 7,50 cada— dividiam espaço com megafones, santinhos e panfletos de candidatos a deputado federal e distrital.

A ideia inicial, disse o estudante de serviço social da UnB Lucas Ladeira, 24, era fazer a agenda com estudantes na própria universidade. Como a lei eleitoral não permite atos de campanha em prédios públicos, porém, movimentos locais sugeriram a mudança.

Um palco foi montado de frente para o bar, onde ficam normalmente mesas do Vale da Lua, outro "pé-sujo" muito frequentado pelos universitários da capital. "Aqui já é um ponto de referência para os estudantes, seja para recepção de calouros ou outros eventos", afirmou ele.

Dos poucos sem garrafas na mesa, o estudante de relações internacionais Bruno Engelberg, 23, é filiado ao PDT. "A gente veio mais para acompanhar mesmo, conhecer a agenda", afirmou.

Se o público em sua maioria fazia lembrar uma calourada universitária, os gritos remetiam às manifestações de esquerda. "Não acabou, tem que acabar/ eu quero o fim da polícia militar" e "aqui está o povo sem medo, sem medo de lutar", entoavam, com o som de instrumentos de percussão decorados com adesivos de "Fora Temer" ao fundo.

Uma hora depois do horário marcado, o candidato chegou, recebido com gritos de "fica, vai ter Boulos". "Aqui nós temos um encontro...", começou a dizer no palco, quando foi interrompido por um militante que gritava: "beber uma?". "Daqui a pouco!", rebate o candidato.

Durante cerca de dez minutos, o candidato do PSOL, que soma apenas 1% de intenção de voto nas pesquisas, fez seu discurso habitual. Defendeu as ocupações de sem teto ("dizer que quem ocupa é vagabundo, dizer que quem ocupa está tomando o que é dos outros. As pessoas que acreditaram ocuparam porque não tiveram alternativa"), a taxação de grandes fortunas, a criação de vagas em universidades públicas, e criticou adversários.

"Eu fiquei abismado de ver aquela turma toda lá falando que é a renovação na política", afirmou. "O Álvaro Dias [Podemos], com 30 anos de PSDB e aquele botox desbotado falando que é renovação?", disse, arrancando risos e gritos da plateia.

Ao falar sobre Jair Bolsonaro, Boulos acusou o presidenciável do PSL de "não juntar lé com cré". "Tem candidato que vai lá [no Jornal Nacional] hoje e quero ver se vai levar cola na mão de novo", afirmou. No debate da RedeTV!, o deputado foi criticado por escrever na mão temas sobre os quais questionaria a candidata da Rede, Marina Silva. O capitão reformado foi para a bancada do JN com as palavras "Deus", "família" e "Brasil" escritas na mão esquerda.

Boulos terminou a fala cumprimentando Mônica Benício, a viúva da vereadora Marielle Franco, assassinada em março no Rio de Janeiro. "Marielle", gritou. O público respondeu: "presente!".

Depois, foi sabatinado por membros do movimento estudantil sobre temas como a descriminalização do aborto e políticas afirmativas raciais. "Já que divulgaram que vai ter litrão, vamos ter que ter litrão", anunciou afinal o candidato no microfone, antes de descer do palco.

Deixando de lado os clássicos pastel e pingado, fez fotos com o público bebendo Brahma em um copo americano decorado com um adesivo pela legalização da maconha —entregue por um estudante de jaqueta militar e meias estampadas com um arco-íris "fora Temer". Depois, trocou por um copo de plástico enquanto circulava entre as mesas ("este aqui tá mais gelado", disse a um assessor que tentava lhe devolver o de vidro após uma das fotos).

Nas redes sociais, uma das principais críticas a Boulos é de que sua candidatura seria identificada apenas com a esquerda universitária, uma "candidatura de DCE [Diretório Central dos Estudantes]". Nesta terça, no Twitter, uma usuária fez piada: "Guilherme Boulos está lançando hoje sua candidatura ao DCE Honestino Guimarães acompanhem", escreveu.

Questionado sobre fazer um evento para um público que é cativo de seu partido, o candidato afirmou que era importante "renovar o compromisso com a juventude" e disse que ali não havia apenas estudantes. "A verdade é que aqui tinha a juventude das universidades, e é muito importante a gente estar renovando o compromisso com a juventude. Essa candidatura é a única que vem falar olho no olho com as pessoas", disse. "A gente talvez seja a candidatura que faz eventos em ambientes 'não controlados' entre todas as candidaturas."

Minoria frente à militância universitária, o evento também reuniu membros do MTST, que percorreram os 38km entre Planaltina (região administrativa do DF) e o Plano Piloto em caravana do movimento. "Ele apoia todas as famílias que necessitam de moradia digna", diz a doméstica Ana Maria Marques, 40, que veio com a filha Penélope, de seis meses.

O aposentado Hudson, 65, era um dos poucos que não estava lá para acompanhar o evento do candidato. Numa mesinha de canto, acumulava às 20h quatro garrafas de Original. "Vim só tomar minha cervejinha. Eu não voto não, não tem nada que valha a pena", afirmou.

Boulos deixou o bar por volta das 21h, recusando convite de Kaio para se sentar à mesa dos militantes. "O que eu mais queria agora era tomar uma, mas não vai dar", respondeu, afirmando que teria que pegar um voo às 6h do dia seguinte para cumprir agenda em São Paulo.

Entre os não-militantes, um dos mais satisfeitos era Alonso José da Silva, 44, há 21 anos dono do bar conhecido como PDS. As vendas de cerveja subiram 20% em relação às terças-feiras comuns. "Tinha que ter um evento desses aqui toda semana", afirmou ele, que diz estar acompanhando os debates na televisão para decidir seu voto. 

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