Empresa subornou tribunal de contas em 4 linhas do Metrô, afirma delator

Ex-executivo da Andrade Gutierrez diz que propina era para evitar que corte mudasse licitações

Mario Cesar Carvalho
São Paulo

Flávio Barra, delator da Andrade Gutierrez, diz que a empreiteira pagou R$ 22,5 milhões em propina para conselheiros do Tribunal de Contas do Estado de São Paulo para eles não alterarem editais de licitação que restringiam a disputa em quatro linhas do Metrô, segundo documentos sigilosos obtidos pela Folha.

As linhas em que o cartel das empreiteiras ditou as normas da concorrência, segundo a empreiteira, são a 2-Verde, 4-Amarela, 5-Lilás e 17-Ouro.

O Tribunal de Contas é o órgão responsável pela lisura dos contratos do Estado.

A Folha revelou em março de 2017 que a empresa delataria conselheiros do órgão.

Na linha 2-Verde, o ex-diretor da empreiteira diz que o suborno seria de R$ 1,5 milhão, ou 1% do contrato da empreiteira na obra, de R$ 156,8 milhões, em valores de 2003.

Na linha 4–Amarela e na 5-Lilás, o suborno teria sido de R$ 10 milhões em cada. Já na 17-Ouro, teria sido de R$ 1 milhão.

Os subornos pagos eram geralmente de 1% do valor do contrato, de acordo com Barra, que foi diretor responsável pelos contratos com o Metrô e a CPTM até 2008 e admitiu ter comandado o esquema de caixa dois da empreiteira.

Na linha 2, diz o delator, o suborno foi pago para que o Tribunal de Contas permitisse que um contrato de 1991 fosse retomado em 2003 sem uma nova licitação.

O contrato de 1991 não tinha mais valor 12 anos depois porque a Lei das Licitações determina que esses negócios caducam em cinco anos.

Barra não explica no documento ao qual a Folha teve acesso por que a Andrade Gutierrez pagou propina na obra da linha 4-Amarela. 

Mas o Tribunal de Contas chegou a suspender a PPP (Parceria Público Privada) por considerá-la irregular.

No caso da linha 5-Lilás, o delator diz que o suborno visava manter um edital que restringia a competição ao estabelecer que uma empresa que ganhasse um lote não pudesse participar de outro.

Os R$ 10 milhões foram “para a aprovação do edital e sua manutenção, mesmo com a impugnação feita por outras empresas”, segundo Barra.

A Justiça condenou 12 empresas e o ex-presidente do Metrô Sergio Avelleda em fevereiro deste ano por causa de irregularidades na licitação da linha 5. 

O Ministério Público diz que a obra custou R$ 326,9 milhões a mais por causa da restrição à competição.

Em 2010, a Folha revelou quem seriam os vencedores da linha 5-Lilás.

O executivo afirma que a propina das linhas 2 e 4 foi entregue a Eduardo Bittencourt por meio de um intermediário chamado Luiz Carlos Ferreira, designado na delação como operador de suborno dentro do Tribunal de Contas. 

“Todos os pagamentos foram feitos em espécie, no escritório do operador”, declara.

As empreiteiras citadas também participaram da obra da linha 4-Amarela.

Bittencourt também é citado no relato sobre a propina de R$ 10 milhões na linha 5-Lilás.

“O contato foi feito com o conselheiro Eduardo Bittencourt, que teria feito o pedido em nome dos demais conselheiros do TCE-SP (Fulvio Biazzi, Robson Marinho, Roque Citadini, Edgard Camargo Rodrigues, Renato Martins e Claudio Alvarenga)”.

O delator, porém, faz uma ressalva e diz que “apesar de ter sido informado de que todos os conselheiros do TCE-SP receberam os recursos ajustados, nunca tratou desse assunto com Claudio Alvarenga”.

Biazzi e Alvarenga se aposentaram. Bittencourt e Marinho foram afastados do cargo pela Justiça. 

Bittencourt é acusado de ter um patrimônio de mais de R$ 50 milhões, enquanto Marinho é acusado de ter recebido US$ 3 milhões da Alstom. 

OUTRO LADO

O Tribunal de Contas diz por meio de nota de sua assessoria de imprensa que “desconhece o teor das supostas delações e permanece à disposição para prestar eventuais esclarecimentos”.

O conselheiro Roque Citadini afirma que as acusações não fazem sentido, já que foi contrário à PPP (Parceria Público-Privada) da linha 4-Amarela e votou contra os interesses das empreiteiras nas linhas 5 e 17. “Meus votos expressam  minha posição no caso”, diz Citadini.

Fulvio Biazzi afirma repudiar veementemente as acusações do delator, a quem chama de “facínora”.

“Não tenho nada a ver com isso. Minha vida é um livro aberto. Minhas contas estão à disposição”, afirma Biazzi.

O advogado de Eduardo Bittencourt, Paulo Sérgio Santo André, diz que, apesar de não conhecer a delação, repudia as acusações.

“Bittencourt tem histórico de votos contrários a várias empreiteiras e sempre atuou dentro da legalidade”, afirma o advogado.

Segundo ele, a delação do ex-executivo não é uma “verdade absoluta, como tem sido demonstrado em recentes decisões dos tribunais”.

A Andrade Gutierrez diz que “apoia toda iniciativa de combate à corrupção”, que se desculpou por ilicitudes e que colabora com as investigações.

Delação cita propina em quatro linhas do Metrô

LINHA 2-VERDE

R$ 1,5 milhão
Dinheiro entregue em espécie a um representante de Eduardo Bittencourt, segundo o delator Flávio Barra

LINHA 4-AMARELA
R$ 10 milhões

O delator relata o mesmo método

LINHA 5-LILÁS
R$ 10 milhões

Segundo delator, Bittencourt diz que fez o pedido em 
nome dos conselheiros Fulvio Biazzi, Robson Marinho, Roque Citadini, Edgard Rodrigues, Renato Martins e Claudio Alvarenga. Barra, porém, afirma que nunca falou de suborno com Alvarenga

LINHA 17-OURO
R$ 1 milhão

Pagamento foi feito a intermediário de Roque Citadini, de acordo com delator

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