Descrição de chapéu Eleições 2018

Presidenciáveis contam com fim de privilégios para resolver do déficit à reforma da Previdência

Em boa parte das propostas, o tema aparece como saída para a crise fiscal do Estado

Bruno Carazza

"Saúde, educação e segurança" sempre foi um trinômio fácil de encontrar nas propagandas de políticos em tempos de eleição. Neste ano, podemos acrescentar mais um: a eliminação de privilégios aparece com destaque em todos os planos de governo dos candidatos à Presidência, embora não haja consenso sobre o que isso quer dizer e, pior ainda, como será feito.

Em boa parte das propostas, o tema aparece como saída para a crise fiscal do Estado. Nas propostas de Geraldo Alckmin, Alvaro Dias, Ciro Gomes e Jair Bolsonaro, o combate aos privilégios é visto como o caminho para um Estado mais eficiente e com orçamento equilibrado. 

No plano de Henrique Meirelles, o fim dos privilégios deve ser a pedra de toque da reforma da Previdência, igualando o regime dos servidores públicos ao INSS —embora o projeto encaminhado pelo candidato, enquanto ministro da Fazenda, tenha mantido a aposentadoria especial dos militares. 

Na proposta de Lula/Fernando Haddad o foco está no Ministério Público e no Judiciário. Eliminar privilégios, no programa do PT, seria uma espécie de acerto de contas daqueles que se sentem perseguidos pelo sistema judicial.

Curiosamente, as concepções mais amplas do que seja combater privilégios vêm dos representantes dos partidos mais novos e, de certa forma, mais programáticos. Somente Guilherme Boulos (PSOL), Marina Silva (Rede) e João Amoêdo (Novo), cada um na sua posição no espectro ideológico, apresentam propostas para atacar o problema em suas três dimensões: políticos, a elite do funcionalismo público e o alto empresariado dependente de subsídios e benefícios fiscais.

O termo "privilégio" vem do latim privatus legium. Lei privada. No Brasil, sob o pretexto de conceder direitos, garantias e incentivos a categorias profissionais, setores econômicos e grupos sociais, criamos um emaranhado de normas especiais que fragilizam o preceito de que as leis devem ser gerais e abstratas.

Com o tempo, setores econômicos foram identificando no Estado uma fonte quase inesgotável de receitas. Obter acesso privilegiado ao poder tornou-se uma estratégia de negócios para grandes grupos econômicos (rent seeking). Sob o pretexto de incentivar a economia nacional, transferimos renda para o topo da pirâmide por meio de regimes tributários especiais, crédito subsidiado em bancos públicos, subvenções e regulação favorável.

Em outra direção, em tempos de farinha pouca, a elite do funcionalismo público nos três Poderes tratou de garantir o seu pirão primeiro. Além de defender com unhas e dentes seu regime previdenciário especial, obtiveram toda sorte de penduricalhos salariais: auxílio-moradia, bônus de produtividade, honorários de sucumbência aumentam em alguns milhares de reais os rendimentos que já se encontram muito acima da média.

Atacar os privilégios, portanto, é urgente na estratégia de superar a grave crise fiscal e nossa indecente desigualdade social. O grande problema é que poucas tarefas são mais difíceis do que extinguir benesses e monopólios. O poder de articulação e pressão desses grupos de interesses é imenso. Exemplos não faltam.

O projeto de lei sobre o cadastro positivo encontra-se estagnado no Congresso por força do lobby dos cartórios, que veem na troca de informações sobre o histórico creditício dos consumidores uma ameaça aos seus ganhos milionários.

Devido à resistência de grupos de interesses, propostas recentes de reforma fiscal como a reoneração da folha de pagamentos, o fim dos regimes especiais do cinema e do audiovisual e a suspensão dos reajustes do funcionalismo público foram derrotadas no Congresso.

a direção oposta, o centrão patrocinou, à custa de toda a sociedade, uma verdadeira farra na concessão de diversos Refis a devedores contumazes da Receita.

Diante desse cenário de "salve-se quem puder", ver os principais candidatos à Presidência pregando o fim dos privilégios é um sinal de evolução. A grande questão é saber se algum deles está disposto a colocar o guiso no gato.

Bruno Carazza é doutor em direito (UFMG), mestre em economia (UnB) e autor do blog  “O “E$pírito das Leis”

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