Supremo decide que ações para ressarcir cofres públicos não prescrevem

Entendimento se restringe a atos de improbidade administrativa praticados com intenção

Reynaldo Turollo Jr.
Brasília

O STF (Supremo Tribunal Federal) decidiu nesta quarta (8), por 6 votos a 5, que ações de ressarcimento ao erário não prescrevem quando o ato de improbidade administrativa que causou o prejuízo tiver sido praticado com dolo (intenção) por agentes públicos ou terceiros.

Isso significa que, mesmo que o tempo passe, o Estado não perde o direito de cobrar do agente o dano causado aos cofres públicos.

Os ministros terminaram de julgar um recurso extraordinário referente a um caso específico de São Paulo que tem repercussão geral (aplicação do entendimento para todos os outros casos). Segundo o STF, havia 999 ações paradas na Justiça esperando o desfecho desse julgamento.

Sessão Plenária do STF, em Brasília, sob a presidência da ministra Cármen Lúcia
Sessão Plenária do STF, em Brasília, sob a presidência da ministra Cármen Lúcia - Pedro Ladeira/Folhapress

A posição da corte passou por uma reviravolta. Na semana passada, quando o julgamento começou e foi suspenso por causa do horário, o placar já tinha maioria de seis votos para que as ações de ressarcimento por ato de improbidade prescrevessem em cinco anos.

Os ministros Luís Roberto Barroso e Luiz Fux, que tinham votado desse modo, mudaram de lado, formando a nova maioria no sentido inverso. Ao longo da semana, agentes do Ministério Público deram declarações de que, se vingasse o entendimento de que tais ações prescrevem, o combate à corrupção e a Lava Jato estariam em risco.

O relator do recurso, ministro Alexandre de Moraes, que acabou sendo vencido, considerou que a imprescritibilidade tem caráter excepcional no ordenamento jurídico brasileiro, mesmo na esfera penal, que é mais grave — pela Constituição, destacou, somente os crimes de racismo e de ação de grupos armados contra o Estado Democrático não prescrevem.

“Não seria razoável que, considerando-se as mesmas condutas geradoras tanto de responsabilidade civil como de responsabilidade penal, houvesse imprescritibilidade de uma única sanção [a de ressarcimento] pela prática de um ilícito civil definido como ato de improbidade, e não houvesse na esfera penal, que é de maior gravidade”, disse o relator.

“Nosso ordenamento afasta a imprescritibilidade das ações civis patrimoniais. Como resultado, não deveria ter surgido qualquer dúvida quanto à prescritibilidade de todas as sanções civis por ato de improbidade administrativa, inclusive as de ressarcimento ao erário.”

Para Moraes, esse entendimento não traria prejuízo ao combate à corrupção e à improbidade porque, nas hipóteses graves, que configuram crime, o prazo de prescrição que vale é o previsto no Código Penal. O ministro disse que o que atrapalha o combate à corrupção é a incompetência de quem (promotores e procuradores) não consegue ajuizar as ações no prazo. “Chegou-se ao absurdo de dizer que atrapalha a Lava Jato, para conseguir apoio da imprensa”, criticou.

Moraes foi acompanhado por Dias Toffoli, Ricardo Lewandowski, Gilmar Mendes e Marco Aurélio.
Edson Fachin abriu a divergência em relação ao relator. “Houve, por escolha do poder constituinte, não apenas o alçamento da boa governança a patamar constitucional, mas da compreensão da coisa pública — não raras vezes tratada com desdém [...] — como um compromisso fundamental a ser protegido por todos”, afirmou.

“O comando [constitucional] estabelece como um verdadeiro ideal republicano que a ninguém, ainda que pelo longo transcurso de lapso temporal, é autorizado ilicitamente causar prejuízo ao erário, locupletando-se da coisa pública ao se eximir do dever de ressarci-lo”, disse.

Fachin foi seguido por Rosa Weber, Celso de Mello, Cármen Lúcia, Barroso e Fux.

Ao final, Barroso, que havia mudado de lado, propôs que só não prescrevam as ações de ressarcimento relativas a atos de improbidade praticados com dolo (com a intenção do agente), tese acatada pela maioria que venceu.

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