Descrição de chapéu Eleições 2018

Após queda, Dilma trata disputa entre PT e PSDB em MG como 'luta decisiva'

Ex-presidente, afastada em 2016 do cargo, disputa vaga ao Senado por Minas Gerais

Carolina Linhares
Belo Horizonte

No salão de um clube em Belo Horizonte, na noite de segunda (10), a ex-presidente Dilma Rousseff (PT) sobe ao palco para discursar a centenas de mulheres num evento organizado pela sua campanha ao Senado de Minas Gerais.

Incomodada por ter ao seu lado apenas as principais deputadas, ela ordena ao cerimonial que todas as candidatas mulheres, do PT e do PCdoB, sejam chamadas ao palanque. A ordem gera burburinho sobre como fazer todo mundo caber ali.

“Eu quero todas. Fim de papo”, insiste Dilma em seu estilo "duro". “A mídia dizia que eu era uma mulher dura; se fosse um homem, seria firme”, afirmou ao público em uma fala sobre o machismo no impeachment. “E, como eles não têm o menor compromisso com a lógica, eu era também uma mulher frágil”, completou, arrancando risadas em uma das tiradas que repete em eventos de campanha.

Dilma Rousseff posa para selfie em celular de uma apoiadora na Convenção Estadual do PT de Minas Gerais que oficializa sua candidatura ao Senado nas eleições de 2018
Dilma Rousseff participa da Convenção Estadual do PT de Minas Gerais que oficializa sua candidatura ao Senado nas eleições de 2018, em agosto - Roberto Stuckert Filho

Naquela noite, a ex-presidente lançou mão de outras marcas registradas, como digressões em discursos de mais de meia hora e gafes ---errou três vezes o nome da ex-BBB Mara Telles (PCdoB), candidata a deputada.

Dilma lidera a corrida para o Senado com 26%, segundo pesquisa Datafolha divulgada no último dia 6. Uma das duas vagas em disputa na Casa é a do senador Aécio Neves (PSDB), ex-governador do estado que perdeu para a petista em Minas na eleição presidencial de 2014 e, desgastado por denúncias de corrupção, desistiu da reeleição neste ano para tentar a Câmara.

Aécio e seu sucessor, Antonio Anastasia (PSDB), que está em primeiro na corrida para o governo de Minas segundo o Datafolha, são sempre mencionados por Dilma como parte do impeachment. A Justiça Eleitoral chegou a suspender uma das propagandas da petista que aponta Anastasia, relator do processo, como autor de "um golpe violento, descarado e contra a vida".

estratégia de nacionalizar a campanha num estado prioritário do ponto de vista eleitoral também serve ao governador Fernando Pimentel (PT), que tenta a reeleição. Ao pedir votos para ele, Dilma diz aos militantes que o caos financeiro no estado, com atraso de salários e confisco de de verbas de prefeituras, se deve à herança tucana e a um cerco de falta de repasses de Michel Temer (MDB).  

“Nós vamos, aqui em Minas, combater esse golpe que tem dois dos principais protagonistas. Um que perdeu a eleição, outro que destruiu o orçamento e entregou ao Pimentel um governo falido. Aqui vai se travar a luta decisiva. Porque, se nós não ganharmos aqui, nós perderemos o Brasil”, disse a ex-presidente na convenção petista em agosto.

Embora ajude a trazer votos, Dilma é um entrave político para o PT mineiro pelo perfil autoritário. A Pimentel, amigo de militância estudantil contra a ditadura em BH, mandou que escolhesse entre ela ou MDB em sua coligação. Quis, de todo jeito, tirar Miguel Corrêa (PT), candidato ao Senado, de sua chapa depois do envolvimento na compra de influenciadores digitais.

A reclamação chegou a Fernando Haddad (PT), agora candidato a presidente.

substituição do ex-presidente Lula (PT) nas urnas foi um revés para Dilma, que não tem afinidade com Haddad e já foi criticada por ele. Mas os dois estiveram juntos em ato em BH no último dia 28, e o petista começou a ser mencionado nas propagandas da ex-presidente ---há um jingle que os une.

“Nós resistimos porque achamos que Lula é inocente. Esperamos até o fim do prazo. O PT registrou Haddad como indicado para representar nossos anseios, para ser o Lula para milhões de brasileiros. Acredito que vamos ganhar essa eleição”, disse Dilma no primeiro evento após a troca.

A Justiça Eleitoral ainda não aprovou a candidatura da petista, que foi contestada por dez pessoas diferentes, incluindo a filha de Eduardo Cunha (MDB). Eles argumentam que o impeachment deixou Dilma inelegível, mas a votação separada na época manteve seus direitos políticos. O caso pode chegar aos tribunais superiores.

A ex-presidente não planejava voltar a pedir votos, mas atendeu a um pleito de Lula, um dia antes de sua prisão, em abril, para que se candidatasse em seu estado natal. “O Lula me chama, eu estava vendo com ele como a gente fazia para ir ao sindicato dos metalúrgicos, e diz: 'Dilminha, vá pra Minas'. [...] Nessa situação, ninguém tem direito de voltar pra casa e cuidar da vida, por mais velho que você seja.”

Por servir ao propósito de denunciar a prisão de Lula, que Dilma considera uma etapa do “golpe”, sua eleição é prioridade para o PT. O partido já investiu R$ 2,7 milhões na campanha, a mais cara ao Senado até agora, que deve bater o teto legal de R$ 4,2 milhões. A equipe, coordenada pela ex-ministra Eleonora Menicucci, é separada das demais campanhas petistas no estado. 

“Essa eleição tem lado. Eu não chorei uma vez naquele impeachment. Agora eu entro naquela cela em Curitiba, eu desmaio chorando. Porque Lula não é uma pessoa que pode viver sozinho numa cela, ele gosta de gente. [...] Essa é uma eleição Lula livre”, disse Dilma.

O desabafo foi feito em ambiente intimista, quando ela foi ouvida, na noite de quinta (13), por cerca de cem pessoas em um restaurante em região nobre de BH, que costuma ser ponto de encontro da esquerda classe média-alta.

A petista se permitiu piadas com a Ursal e uma fala mais aprofundada sobre economia e política externa, repetida também em uma palestra na Universidade Federal de Minas Gerais no mês passado, quando foi ovacionada por estudantes invadiram o auditório já lotado para sentar no chão. 

Para receber Dilma no restaurante, porta e janelas foram fechadas. Houve entrega restrita de convites a fim de evitar o fanatismo que a petista desperta e pelo receio de atrair protestos.

Embora a preocupação seja permanente, houve apenas um episódio de hostilidade até agora. Numa manhã de domingo, Dilma foi xingada na lagoa da Pampulha, novo cenário de seus passeios de bicicleta, feitos antes no Palácio da Alvorada e no rio Guaíba, em Porto Alegre.

Na Grande BH, Dilma esteve em mais de dez eventos, mas não divulgou alguns, como uma visita a acampamentos do MST na sexta (14). Em geral, ela aproveita o palanque em atos de deputados. Também rodou por 17 cidades de diferentes regiões.

Como em seu jingle, ela tenta colar a imagem de mineira, explicando que só saiu do estado por perseguição da ditadura. Já disse que Minas “é um estado que não é coxinha em sua alma”, mas sua frase de efeito que arranca aplausos é: “Um golpe me tirou, o outro me trouxe de volta”.

Dilma passou a morar com a mãe de 95 anos em sua casa nos arredores da Pampulha no fim de junho, quando assumiu a candidatura em reunião do PT. Na ocasião, afirmou que não iria “dar mole para a imprensa”, que acusa de julgar sem dar espaço à defesa. Ao chegar e sair de eventos, ela evita jornalistas.

Do Fiat Freemont preto ao palanque e no caminho de volta, é cercada pelos quatro seguranças do Planalto a que tem direito e, muitas vezes, tem o reforço de outros contratados ou de voluntários do MST.

Os militantes também a rodeiam na batalha por uma foto. No fim do dia de celebridade, a petista chega a reclamar de dores e hematomas causados pelos puxões e apertos que recebe. Vencida pelo cansaço do ritmo de campanha, cancelou a participação em dois eventos na última semana.

“Eu já tirei, querida”, responde ríspida a uma das clientes do restaurante que lhe pede uma foto antes de entrar no carro. Professoras sindicalizadas tiveram mais sorte em um evento em que Dilma topou tirar fotos coletivas para cada região do estado.

Durante quase 30 minutos houve uma confusão de senhoras com dificuldade de vencer a barreira de homens do MST e subir no tablado para tirar uma lasquinha de Dilma quando suas regiões eram anunciadas ao microfone.

A petista chegou a gargalhar da situação e ainda assim a organizadora Bia Cerqueira (PT), candidata a deputada estadual, procurou justificar o estresse fotográfico: “É importante pra elas”. “Pra mim também, dá força”, ouviu de volta. 

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