Descrição de chapéu Eleições 2018

Em meio a debate sobre segurança, TSE planeja colocar código da urna na internet

Iniciativa, ainda sem data, deverá ocorrer antes da próxima eleição

Raphael Hernandes
São Paulo

O chefe da seção de voto informatizado do TSE (Tribunal Superior Eleitoral), Rodrigo Coimbra, afirmou nesta quarta-feira (19) que o Tribunal trabalha para divulgar na internet os códigos que compõem o sistema da urna eletrônica para inspeção do público.

Coimbra afirmou que ainda não é possível estipular uma data para a iniciativa entrar em prática, mas disse à Folha acreditar que ocorrerá antes da próxima eleição.

“A gente está na fase inicial de analisar a viabilidade”, declarou. “Estamos trabalhando para permitir isso [a abertura do código na internet]”.

Para o funcionamento de programas computadorizados, como é o caso do sistema da urna eletrônica, existe toda uma programação (um conjunto de palavras e símbolos) com instruções de como eles devem funcionar. Esse é o chamado “código-fonte”, e é o que seria disponibilizado pelo TSE.

Esse sistema não deve funcionar fora da urna eletrônica. A presença do código online serviria para inspeção.

Entre os pontos que o TSE analisa para possibilitar a publicação do código online, elucida Coimbra, estão questões legais, como a disponibilização de porções do código originalmente fornecidas por empresas privadas e que talvez não possam ser abertas ao público.

Além disso há dúvidas práticas em relação a como funcionaria mobilização de uma equipe para prestar suporte e tirar dúvidas das pessoas que analisarem esse conteúdo.

Atualmente, as urnas podem ser auditadas a pedido do Ministério Público, da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) ou dos partidos políticos. Em 2014, o PSDB pediu uma auditoria nas urnas após o então candidato Aécio Neves ser derrotado na eleição presidencial, mas não encontrou fraude.

Além desta possibilidade, o TSE disponibiliza o código-fonte das urnas por um período de seis meses antes da eleição para a inspeção de partidos e de especialistas. O conteúdo a ser colocado online deve ser semelhante a esse.

A gravação desse código nos cartões e a instalação deles nas máquinas de votar são feitas em cerimônias públicas, que podem ser acompanhadas por qualquer cidadão.

Também são realizados testes públicos de segurança, nos quais especialistas em segurança da informação buscam vulnerabilidades nessa programação.

À rádio CBN o secretário de tecnologia da informação do TSE, Giuseppe Janino, afirmou que nenhum partido acompanhou a cerimônia de lacração das urnas, quando autoridades validam o programa que será usado pelas urnas e o código é gravado nos cartões que serão instalados nos equipamentos. Essa é uma oportunidade para fiscalizar o trabalho do TSE e ajudar na prevenção de fraudes.

Janino criticou também a ausência dos partidos nesse período de seis meses para inspeção dos códigos e nos testes públicos de segurança.

SEGURANÇA

No fim da tarde desta quarta, Coimbra participou de um debate sobre a segurança das eleições e a possibilidade de fraude no pleito, durante o evento de segurança da informação Mind the Sec, em São Paulo.

Na discussão, ele aproveitou para reforçar que “não existem fraudes” na eleição brasileira. “Existem suspeitas, sempre existem, mas fraude de fato não existe”.

O especialista do TSE dividiu o palco com Diego de Freitas Aranha, professor assistente da Universidade de Aarhus, na Dinamarca, que é um dos principais nomes na defesa da adoção do voto impresso no país e que desde 2012 contribui com o Tribunal para encontrar falhas de segurança na urna eletrônica.

A discussão sobre o voto impresso voltou ao noticiário neste domingo (16), após o presidenciável Jair Bolsonaro (PSL) divulgar vídeo no qual coloca em dúvida a lisura do processo eleitoral.

De um lado, defensores da impressão veem na medida uma forma de auditar os resultados da eleição e conceder mais transparência a ela.

Do outro, a argumentação endossada pelo TSE de que o processo é suficientemente seguro e que a impressão é mais fácil de ser fraudada que o sistema digital, além de trazer complicações como eventuais problemas físicos na impressora e o fato de não ser acessível a deficientes visuais.

Durante reforma da legislação eleitoral feita em 2015, Bolsonaro propôs uma emenda que instituiu a impressão do voto na eleição. Em junho, a emenda foi suspensa pelo STF (Supremo Tribunal Federal) e não estará em vigor no pleito, inclusive em 2018, até ter o mérito julgado pelo Supremo.

Nesta quarta, o ministro do STF Marco Aurélio disse que as urnas nunca sofreram contestação “minimamente séria” desde sua implantação, em 1996.

Antes dele, o ministro Dias Toffoli, presidente do STF, e a ministra Rosa Weber, presidente do TSE, também defenderam a segurança do processo eleitoral no Brasil.

Apesar disso, Aranha sustenta a impressão do voto como uma forma de auditar a eleição analisando informações que não ficam armazenadas no sistema da própria urna que, argumenta, se for comprometida daria a impressão de estar funcionando normalmente.

“Todos os dados disponíveis para auditoria foram produzidos por equipamentos cuja integridade se pretende verificar”, disse Aranha à Folha, por email, antes do debate.

FISCALIZAÇÃO

No último teste público de segurança, em 2017, Aranha liderou uma equipe formada por ele e mais quatro especialistas. O grupo encontrou uma brecha para instalar um sistema adulterado na urna eletrônica. Segundo o TSE, o problema já foi corrigido.

Falhas de segurança no código-fonte da urna deixavam expostas as chamadas “chaves criptográficas”. Em posse delas, um fraudador poderia ler e alterar o conteúdo de cartões de memória da máquina e, com isso, adulterar o sistema do equipamento eleitoral.

A equipe demonstrou ser possível, ao trocar o sistema por uma versão falsa, quebrar o sigilo do voto, interferir com o armazenamento da votação e alterar mensagens na tela exibida para o leitor (como inserir um texto dizendo "vote 99").

Para Aranha, as vulnerabilidades da urna oferecem risco ao processo eleitoral, o que não significa que necessariamente se tornem fraude na prática. “Para isso acontecer, vale a lógica econômica do custo/benefício para o fraudador, que torço para ser mais benéfica na tradicional compra de votos e mesários para votar por eleitores faltosos”, afirmou, por email.

Para um ataque dessa sorte ocorrer, dependeria da troca do conteúdo do cartão lido pela urna para instalar o sistema executado durante a votação. Para tanto, a peça deveria ser conectada a um computador preparado para alterar seu conteúdo, antes de ser instalada na urna eletrônica.

Esse processo seria possível, segundo Aranha, com um fraudador dentro do TSE ou então um fraudador externo, com um treinamento específico, na cerimônia de lacração da urna.

Segundo Coimbra, do TSE, no entanto, uma fraude nesse momento seria dificultada pela presença de diversas autoridades na cerimônia --acompanhada por fiscais de partidos, do Ministério Público e possivelmente pela imprensa. “Ou seja, um ambiente em que há significativa fiscalização e controle.”

Uma vez que as urnas estejam lacradas, uma adulteração (seja acoplando um aparelho externo à urna ou modificação nos cartões de memória) não poderia ser feita sem que o lacre seja violado, o que possibilita a identificação da tentativa de fraude.

Nesse caso, um juiz eleitoral analisa a situação e pode até anular os votos daquela seção eleitoral.

O TSE afirma que a falha apontada pela equipe de Aranha, bem como as apontadas por outros especialistas que participaram dos testes, já foram corrigidas. Uma delas permitia que o código da urna fosse executado em outros equipamentos.

O pesquisador não cessa as críticas e diz que a solução adotada pelo tribunal mitiga o problema, em particular em relação a fraudadores externos, mas não resolve completamente a questão. “Os técnicos da Justiça Eleitoral continuam tendo acesso facilitado à chave criptográfica cujo vazamento poderia gerar um impacto catastrófico”. Ou seja, um ataque operado por técnicos do TSE ainda seria possível, segundo Aranha.

Em resposta, Coimbra diz que os técnicos do TSE estão sob constante escrutínio e que um código malicioso poderia ser facilmente identificado por especialistas de um dos Tribunais Regionais Eleitorais.

Em nota, o TSE afirma que a discussão em cima dos testes de segurança da urna “revela o sucesso da implantação dessa sistemática pela Justiça Eleitoral.” E que graças à contribuição dos especialistas “os sistemas que serão utilizados nas Eleições 2018 são amplamente seguros e confiáveis.”

“Embora não exista sistema inviolável, em 22 anos de uso da urna eletrônica jamais foi constatado qualquer caso de fraude e manipulação dos resultados capaz de macular o processo eleitoral brasileiro”, diz o texto.

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.