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PF recorreu à Lei de Segurança para 'firmar competência' federal sobre caso Bolsonaro

O agressor poderia ter sido indiciado por tentativa de homicídio

Rubens Valente
Brasília

A Polícia Federal optou por usar a LSN (Lei de Segurança Nacional) para indiciar Adelio Bispo de Oliveira pelo ataque contra o deputado federal Jair Bolsonaro (PSL-RJ) como estratégia para "firmar a competência" da Justiça Federal sobre o caso, segundo investigadores que atuam no caso.

Ele poderia ter sido indiciado por tentativa de homicídio, mas no decorrer do processo a defesa do acusado poderia levantar dúvida legal sobre a competência do inquérito e do julgamento.

O indiciamento da PF ainda será avaliado pelo Ministério Público Federal, a quem cabe confirmar ou discordar do indiciamento e do tipo penal usado. A Procuradoria da República pode até mesmo discordar do entendimento da PF e passar a acusar Oliveira de tentativa de homicídio.

Logo após o ataque surgiu uma dúvida sobre a quem caberia a condução do inquérito para investigar o crime, se à Polícia Federal, junto com o Ministério Público Federal e acompanhamento da Justiça Federal, ou se à Polícia Civil de Minas Gerais, ao lado do Ministério Público estadual e da Justiça comum mineira.

A PF é a responsável legal sobre a segurança dos candidatos à Presidência, como no caso de Bolsonaro, mas não foi encontrado nenhum caso semelhante, em todas as campanhas eleitorais desde a redemocratização, em 1985, que deixassem a PF na condução do inquérito acima de qualquer dúvida. Por isso a LSN foi empregada como um reforço legal à competência federal, de acordo com investigadores.

A princípio a PF pretendia indiciar Oliveira por tentativa de homicídio, mas a ideia mudou ao longo da noite desta quinta-feira.

A PF confirmou que Oliveira foi indiciado sob acusação de infringir o artigo 20 da LSN. Segundo a PF, o próprio Oliveira afirmou, em depoimento, que agiu movido por razões políticas ou religiosas, o que deu base ao enquadramento.

O artigo prevê inicialmente pena de três a dez anos de reclusão, porém ela é aumentada para de seis a 20 anos caso o crime envolva "lesão corporal grave".

O artigo estabelece o crime de "devastar, saquear, extorquir, roubar, sequestrar, manter em cárcere privado, incendiar, depredar, provocar explosão, praticar atentado pessoal ou atos de terrorismo, por inconformismo político ou para obtenção de fundos destinados à manutenção de organizações políticas clandestinas ou subversivas".

A LSN lista os crimes "que lesam ou expõem a perigo de lesão a integridade territorial e a soberania nacional, o regime representativo e democrático, a Federação e o Estado de Direito e a pessoa dos chefes dos Poderes da União".

Criada em 1983, quase no final da ditadura militar (1964-1985), a partir da atualização de outras leis que existiam pelo menos desde os anos 30, a LSN é considerada por especialistas como um entulho autoritário.

Desde os anos 90 organizações não governamentais de direitos humanos defendem a revogação da lei, que tem sido usada nos últimos anos contra diversos grupos, como indígenas que participam de invasão de terras, membros do MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra) e, a partir dos protestos de junho de 2013, grupos de black blocs.

Em 2007 e 2008, o Ministério Público Federal do Rio Grande do Sul recorreu à LSN contra o MST com base no mesmo artigo 20 agora usado contra Adelio Bispo de Oliveira.

Em 2014, um grupo de ONGs levou o uso da LSN contra movimentos sociais à CIDH (Comissão Interamericana de Direitos Humanos) da OEA (Organização dos Estados Americanos).

Desde os anos 2000, pelo menos, tramitam propostas no Congresso Nacional para extinguir a LSN.

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