Descrição de chapéu Eleições 2018

Protagonistas da greve da PM capixaba de 2017 disputam eleição

Sete policiais militares envolvidos no movimento tentam ser deputados; maioria enfrenta processos civis e militares

Carolina Linhares
Vitória

Ao menos nove personagens que estiveram em evidência durante a greve da Polícia Militar que comprometeu a segurança no Espírito Santo durante 21 dias, em fevereiro do ano passado, terão seus nomes nas urnas nas eleições deste ano —a maioria pela primeira vez.

O estado contabiliza 17 candidaturas de policiais militares, sendo que sete são associadas ao protesto em que mulheres obstruíram os portões de unidades de polícia impedindo a saída para patrulha.

O governo Paulo Hartung (MDB) recorreu às forças armadas federais e, ainda assim, 227 pessoas morreram naquele mês, alta de 134% em relação ao mês anterior. A reivindicação de aumento salarial não foi atendida por falta de recursos.

Os sete policiais candidatos respondem a investigações, cinco foram presos e um excluído. O partido que concentra essas candidaturas, com quatro nomes, é o PSL, de Jair Bolsonaro.

O coronel Carlos Alberto Foresti, que foi preso acusado de apoiar a greve em áudios e vídeos na internet, chegou a percorrer o estado como pré-candidato a governador pelo partido, mas foi substituído na última hora pelo deputado federal Carlos Manato (PSL), aliado de Bolsonaro.

Surpreendido pela mudança, Foresti migrou para o PHS e lançou candidatura a deputado federal. Em 2016, foi candidato a vereador. A Polícia já decidiu pela sua demissão, mas o processo ainda precisa ser validado pela Justiça.

Durante a greve, Foresti, que comandava o Centro de Operações da PM, teve um surto ao saber que dois policiais tinham sido baleados e foi hospitalizado. Ele chegou a ordenar que os policiais desligassem seus rádios.

Ele é acusado, em processos por crime militar e crime comum, por incitar a desobediência, organização criminosa e fazer críticas. Sua defesa diz que ele não incentivou a greve, apenas mostrou revolta pelo risco que os policiais corriam.

A mesma ordem de prisão de Foresti, ainda em fevereiro, foi expedida para dois candidatos do PSL já veteranos em eleições, também acusados de organização criminosa e incitação: o capitão Lucínio de Assumção (PSL), ex-deputado federal aliado de Bolsonaro, que disputa a Assembleia, e o sargento Aurélio Robson (PSL), que concorre como primeiro suplente ao Senado.

O partido terá ainda dois novatos nas urnas tentando a eleição para deputado estadual: o coronel Rogério Lima e o coronel Alexandre Quintino.

Presente na mídia, Rogério era presidente da associação de policiais oficiais, uma das entidades que participou da negociação para o fim da greve. Hoje responde a dois procedimentos administrativos na PM por críticas ao governo e por defender anistia.

Quintino era comandante da região sul e, na época, deu uma entrevista na TV dizendo que o movimento era “legítimo e necessário”, pois os policiais estavam “passando necessidade”.

Pela declaração, compartilhada por Bolsonaro no Facebook, responde a um processo administrativo na PM, que pode culminar em exclusão, e a um processo judicial por crime militar.

Já para o soldado Nero Walker (PP), as consequências da greve chegaram a colocar sua primeira candidatura em risco. Nero foi preso por mais de nove meses acusado de incitar o movimento, por ter gravado um vídeo do lado de fora de um batalhão mostrando que a obstrução permanecia.

Ele é um dos 23 policiais excluídos da corporação após a greve e também responde a processos judiciais. Pela demissão de serviço público, teve a candidatura à Assembleia indeferida pelo Tribunal Regional Eleitoral com base na Lei da Ficha Limpa, mas recorreu.

O quinto policial preso a concorrer, também pela primeira vez e a uma cadeira no Legislativo estadual, é o sargento Ronaldo Trugilho (PSB), o Trugilho do Colete. O episódio que inspirou seu nome de urna foi precursor da greve e evidenciou precariedade na PM: em dezembro de 2016, se recusou a revezar um colete a prova de balas, pois queria mantê-lo no caminho até sua casa, após o fim do turno. 

O secretário de Segurança à época, André Garcia (MDB), deixou a pasta para entrar na política e concorre a deputado estadual. Foi o secretário mais longevo no posto e comemora a taxa de homicídio em queda no estado. 

ALAVANCA

Procurados pela Folha, os candidatos avaliaram que não tiveram ganho eleitoral com a greve, mas acusaram os demais de tentar surfar no movimento.

“Não estou concorrendo por causa de greve, tenho uma história como secretário. Mas sei que muitos usaram isso para se viabilizar, está claro. Grande parte dos que estavam fomentando são candidatos”, disse Garcia.

O secretário viu oportunismo político num momento de crise econômica. “Muitos pagaram para ver. Falta de aviso não foi, nem falta de diálogo. Faltava dinheiro. Meu papel era garantir que a lei fosse cumprida e não agir como líder sindical”, diz.

A respeito das punições, afirma que injustiças devem ser revistas, mas “não há que se falar em anistia para quem cometeu crime”. “Muitos jovens acharam que poderiam fazer um movimento estudantil numa instituição militar. Quem está pagando o preço desses equívocos ainda não compreende que a culpa é de quem movimentou a máquina para infringir a Constituição”, completa.

Nero, por sua vez, se considera perseguido e diz que a greve poderia ter sido evitada com aumento salarial. “Não acho correto que o governo tenha permitido que isso acontecesse”, afirma.

Antes de ser preso, estava afastado da atividade por estresse. O soldado foi expulso em junho num processo que diz ter tido falhas. “Eles forçam muito a barra para tentar me imputar uma conduta criminosa, mas revirando a minha vida, não encontraram nada que desabonasse minha conduta social.”

“Foi uma decepção. Eu permanecia preso por mero abuso de poder. E esse desgosto se transformou em preocupação. Não quero que policiais passem por isso. Para lutar contra isso, me torno candidato”, justifica.

“Há perseguição e retaliação, sou vítima disso”, diz Rogério. O coronel afirma que o clima está ruim na PM. “Fui sondado por vários partidos para tentar dar voz aos militares. Estou no PSL porque a bandeira da segurança pública é mais clara.”

Quintino afirma que se candidatou atendendo a pedidos de colegas. “Tem a ver com a liderança do meu trabalho durante trinta anos de polícia, não por causa de greve”, disse.

Trugilho diz que sua prisão foi uma injustiça e que o estado foi negligente por não ter coletes suficientes. "Decidi ser candidato para representar a classe, mas não há correlação com o evento de 2017."  

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