Descrição de chapéu Eleições 2018

Avanço bolsonarista leva à Câmara novatos, militares e ativistas da nova direita

Partido forma segunda maior bancada com grupo inexperiente e heterogêneo e já se movimenta para reivindicar presidência da Casa

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

São Paulo

A onda conservadora que pode levar Jair Bolsonaro (PSL) ao Palácio do Planalto já garantiu uma cadeira na Câmara dos Deputados para a advogada Christine Tonietto, 27, militante católica que fez campanha contra o aborto e diz ter orado contra o comunismo na véspera da eleição.

Em agosto, ela estava na plateia de uma audiência do Supremo Tribunal Federal quando o ministro Luís Roberto Barroso defendeu o direito ao aborto. A advogada argumentou que a maioria da população é contra a legalização e sugeriu que cabe ao Congresso dar a última palavra sobre o assunto, não ao STF.

Barroso defendeu seu ponto de vista, apontando os riscos enfrentados por mulheres que fazem aborto em condições inseguras, e acusou de intolerância os defensores da criminalização. Homens na plateia o chamaram de abortista, aos gritos, e o ministro deixou o auditório sob vaias e aplausos.

Eleita pelo PSL com 38 mil votos no Rio, Tonietto faz parte de um grupo barulhento que acompanhará a ascensão da direita ao poder se Bolsonaro vencer o segundo turno da disputa presidencial. Com 52 deputados eleitos, seu partido terá a segunda maior bancada da Câmara a partir de fevereiro, desbancando siglas tradicionais como o MDB e o PSDB.

Desde o fim da ditadura militar (1964-1985), nunca um partido acumulou tanta força em tão pouco tempo. Bolsonaro e a maioria dos deputados que ajudou a eleger entraram em março no Partido Social Liberal, que conseguira só uma cadeira na Câmara na eleição anterior, em 2014.

 
Eduardo Bolsonaro (PSL), eleito deputado federal mais votado do país
Eduardo Bolsonaro (PSL), eleito deputado federal mais votado do país - Reprodução /Facebook

O PSL foi a sigla que recebeu mais votos na eleição para a Câmara desta vez, alcançando 11% do total. O PT, que fez 56 deputados e formou a maior bancada, só atingiu patamar semelhante na terceira eleição que disputou após sua fundação, segundo o cientista político Jairo Nicolau.

Três deputados foram reeleitos com a legenda do PSL, entre eles Eduardo Bolsonaro (SP), um dos filhos do capitão reformado, e há outros políticos profissionais na bancada eleita. Mas a maioria dos seus integrantes é formada por novatos que disputaram sua primeira eleição, como Tonietto.

Dos 52 eleitos, 30 concorreram pela primeira vez agora, o equivalente a 58% do total.  “É um partido de cidadãos comuns, mais do que qualquer outro”, diz Nicolau, professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro. “São pessoas que dificilmente teriam chance em legendas tradicionais.”

O subtenente do Exército Hélio Fernando Barbosa Lopes, que Bolsonaro e seus amigos chamam de Hélio Negão, foi o mais votado no Rio. Em Mato Grosso, o campeão foi o pecuarista Nelson Ned Previdente, que faz sucesso como Nelson Barbudo num canal de vídeos na internet.

“Sempre houve pessoas com esse perfil no Congresso, mas esta é a primeira vez que chegam com tanta legitimidade”, diz Antônio Augusto de Queiroz, diretor do Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap). “Se tiverem a força do governo a seu lado, não serão minoritários como os que os antecederam.”

Em São Paulo, onde Eduardo Bolsonaro obteve 1,8 milhão de votos e se tornou o campeão da eleição para a Câmara, o partido teve apoio suficiente para conquistar mais sete cadeiras na Casa, calcula Lara Mesquita, da Fundação Getulio Vargas. Só não conseguiu porque outros candidatos não alcançaram a votação mínima exigida pela lei.

Policiais e militares ocuparão 21 das 52 vagas conquistadas pela bancada bolsonarista. Há dois generais da reserva, quatro delegados e um tenente-coronel da Polícia Militar de São Paulo, todos eleitos com promessas de endurecimento no combate ao crime.

A ala mais ruidosa reúne uma dezena de ativistas que ganharam notoriedade na campanha pelo impeachment de Dilma Rousseff (PT), em 2016. Quase todos novatos, são personalidades atuantes nas redes sociais, como a jornalista Joice Hasselmann e o ex-ator pornô Alexandre Frota.

“Embora heterogênea, a bancada representa o mais puro sentimento de mudança que a sociedade expressou na eleição”, diz o deputado eleito Luciano Bivar (PE), que presidia o PSL antes da chegada de Bolsonaro e deve reassumir o posto no próximo ano. 

Só 15 dos 52 eleitos pela sigla contaram com ajuda financeira do partido na campanha, e Bivar e o deputado reeleito Marcelo Álvaro Antônio (MG) ficaram com dois terços do dinheiro. A maioria se contentou com declarações de apoio de Bolsonaro e seus filhos. 

No encontro que os eleitos tiveram com o capitão na sexta (12), a ordem foi para que todos se mobilizassem para assegurar sua vitória no segundo turno. Só depois disso o partido pretende começar a discutir a atuação da bancada. 

Seus integrantes já começaram a se mexer em busca de posições de destaque. Bivar diz que o partido irá reivindicar a presidência da Câmara e passou a ser visto pelos colegas como candidato à vaga. Não é o único. “Avisei que estou à disposição”, diz Delegado Waldir (GO), reeleito com a maior votação do seu estado.

DESTAQUES DA BANCADA ELEITA

- 30 dos 52 deputados eleitos pelo PSL concorreram pela primeira vez a uma eleição
- 29 dos eleitos são do Sudeste, sendo 12 do Rio de Janeiro e 10 de São Paulo

- 10 não declararam bens ao TSE, embora quatro tenham se apresentado como empresários ao se registrar 

- 37 foram eleitos sem ajuda financeira do PSL e declararam gastos de apenas R$ 113 mil na campanha, em média

 

CAMPEÕES DE VOTO 

Eduardo Bolsonaro (SP)

Aos 34, filho mais novo de Bolsonaro na política, foi reeleito com 1,8 milhão de votos. Defende o fim da indicação de ministros do STF pelo presidente da República

Hélio Barbosa Lopes (RJ)

Subtenente do Exército, 49, adotou o nome de Bolsonaro na campanha e conseguiu 345 mil votos. Em 2016, como candidato a vereador de Nova Iguaçu, ele só teve 480

Delegado Waldir (GO)

Está no segundo mandato e foi reeleito. Delegado da Polícia Civil, 55, abriu mão de mordomias na Câmara e promete fazer do combate à corrupção sua prioridade

Marcelo Álvaro Antônio (MG)

Aos 44, exerce o primeiro mandato. Está na política desde 2012, quando mudou de nome para adotar o do pai ex-deputado e se eleger vereador em Belo Horizonte

Nelson Barbudo (MT)

O pecuarista, 58, conquistou mais de dois milhões de seguidores com um canal de vídeos na internet, em que defende o agronegócio e vocifera contra comunistas

MILITARES E POLICIAIS 

General Girão (RN)

General da reserva, 63, disse a seguidores em maio que abandonassem a ideia de uma intervenção militar na política porque ela só daria munição para a esquerda

General Peternelli (SP)

General da reserva, 64, foi indicado no início do governo Michel Temer para presidir a Funai, mas acabou descartado após protestos de lideranças indígenas

Cabo Junio Amaral (MG)

Policial militar, 31, fundou um grupo de direita em Minas Gerais. Defende o aumento das penas previstas para crimes violentos e a criminalização do comunismo

Major Fabiana (RJ)

Policial militar, 39, ganhou fama em 2014 ao controlar sozinha um tumulto numa favela do Rio, de salto alto e sem disparar um tiro, quando estava a caminho do trabalho

Daniel Silveira (RJ)

Policial militar, 36, foi um dos que destruíram num evento de campanha uma placa em homenagem à vereadora Marielle Franco, assassinada em março no Rio

ATIVISTAS DA NOVA DIREITA

Joice Hasselmann (SP)

Jornalista, 41, deixou a mídia tradicional para abrir o próprio canal de vídeos na internet e ganhou fama com o movimento pelo impeachment de Dilma

Alexandre Frota (SP)

Ex-ator de filmes pornográficos, 55, virou ativista político com a campanha pelo impeachment e o surgimento do movimento Escola sem Partido

Dayane Pimentel (BA)

Professora, 33, chamou atenção de Bolsonaro com vídeos em que declarava admiração por ele na internet. Virou presidente do diretório do PSL na Bahia

Luiz Philippe de Orleans e Bragança (SP)

Descendente de D. Pedro 2º, 49, é fundador de um dos movimentos que organizaram manifestações pelo impeachment de Dilma

Caroline de Toni (SC)

Advogada, 32, é discípula do filósofo Olavo de Carvalho, guru da nova direita, e foi autora de um dos primeiros pedidos de impeachment apresentados contra Dilma

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.