Descrição de chapéu Eleições 2018

Bolsonaro cresce por 'coerção do voto evangélico', não por ato das mulheres, diz organizadora de protesto

Candidato saltou de 30% para 40% dos votos entre os evangélicos neopentecostais

Thaiza Pauluze
São Paulo

No sábado (29), atos contra Jair Bolsonaro ecoavam a voz de milhares de mulheres num sonoro “ele não”. Dois dias depois, na segunda-feira (1º), o candidato do PSL ao Planalto havia crescido quatro pontos nas pesquisas de intenções de voto, chegando a 31% —alta puxada sobretudo pelo voto feminino. Nesta quinta (4), ele chegou a 35%.

Teria o mega protesto aberto as comportas do antipetismo e iria, ele sim, ajudar a eleger o capitão reformado? Foi nessa linha a crítica do terceiro lugar nas pesquisas, Ciro Gomes. Para o pedetista, o protesto foi um “grosseiro equívoco que está convidando o país para bailar na beira do abismo” ao colocar o lado destro da disputa como “referência no debate”.

Equívoco é “colocar a responsabilidade num ato histórico das mulheres”, rebate a artista visual Fábia Karklin, 39, criadora do evento que deu início ao ato em São Paulo (e acabou se espalhando para mais de 30 cidades). Esse tipo de análise “é machista e misógino”, ela diz.

 
Ato contra o candidato à Presidência Jair Bolsonaro, no Largo da Batata, em São Paulo
Ato contra o candidato à Presidência Jair Bolsonaro, no Largo da Batata, em São Paulo - Eduardo Anizelli - 29.set.2018/Folhapress

O crescimento deve-se muito mais, para Karklin, a declaração de apoio do líder da Igreja Universal e dono da TV Record, o bispo Edir Macedo, e a orientação de outros líderes para que pastores peçam voto ao candidato à direita.

 

Bolsonaro saltou de 30% para 40% dos votos entre os evangélicos neopentecostais de meados de setembro até o começo desta semana, de acordo com o Datafolha. O segmento pretende dar 48% dos votos válidos (que excluem eleitores indecisos, brancos e nulos) para o capitão reformado.

“Esse uso da religião para os interesses dos poderosos é o grande erro. Isso sim deve ser questionado. É muito mais a coerção do voto evangélico do que o ato das mulheres”, diz a artista visual.

Coerção feita principalmente pelo WhatsApp, defende. “Há grupos de igreja, criados há muitos meses, espalhando boatos que deturparam o ato.” Desde sábado, vários grupos de WhatsApp com religiosos receberam imagens em que mulheres que foram às ruas no sábado apareciam de peito de fora, homens se beijavam. Algumas feitas em outros protestos, antes das eleições.

E são os eleitores de Bolsonaro os que mais se informam pelas redes sociais. De acordo com o Datafolha, 61% leem sobre política no WhatsApp.

Para a paulistana, quem realmente risca o fósforo na lógica antipetista e pró-Bolsonaro “é quem tem inserção na grande mídia” e também a própria mídia, que, segundo ela, “não está comprometida em frear o avanço do fascismo”.

Karklin foi quem fez o post no grupo de Facebook “Mulheres Unidas Contra Bolsonaro” convocando outras a organizar um ato contra o candidato “reacionário, antidemocrático”. Rapidamente compraram a ideia 50 mulheres e 38 organizações, entre movimentos identitários, blocos de carnaval, torcidas organizadas e partidos políticos.

Não foi um movimento apartidário, ela diz, “para não ficar uma massa amorfa”, mas rejeita a pecha de que o ato tenha sido instrumentalizado pelo PT —partido que está em segundo lugar na corrida e pode se beneficiar com o enfraquecimento do primeiro colocado.

“Há um avanço do discurso de que não votar no Bolsonaro significa votar no PT. Como se não houvesse outra opção de voto”, mas, segundo ela, tinha na organização “eleitora do Ciro, da Marina Silva, (Rede), do João Amoêdo (Novo), do Guilherme Boulos (Psol), do Fernando Haddad (PT), muitas anarquistas, outras indecisas”, diz. “Só não tinha nenhuma eleitora do Geraldo Alckmin (PSDB), nem do Cabo Daciolo (Patriota).”

A tarefa lhe rendeu ataques. Suas contas em redes sociais foram hackeadas. Foi xingada no inbox de vadia, puta, e leu que, ao invés de organizar atos, deveriam “ir lavar uma louça”.

Mas, ao menos com uma eleitora bolsonarista, o embate deu certo. “Ela queria entender o porquê do protesto, expliquei e no final ela mudou de voto”, diz Karklin, que vai de Boulos no domingo (7). “A eleição vai se fazer no dia do voto, não com pesquisa. Intenção é uma coisa, voto é outra.”

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