Descrição de chapéu Eleições 2018

Bolsonaro enfrentará 'teto' anti-Lula e expertise de rua do PT, diz analista francês

Cientista político Frédéric Louault afirma que candidato do PSL terá de se expor

Paris

Se Jair Bolsonaro (PSL) vai ao segundo turno como favorito, seu caminho até 28 de outubro deve incluir ao menos três grandes obstáculos: a expertise do PT em campanhas, a antecipação do voto útil antipetista para a primeira rodada da eleição (possivelmente esvaziando esse “banco de votos”) e sua provável caracterização como candidato das elites pelo campo adversário.

A avaliação é do cientista político Frédéric Louault, professor da Universidade Livre de Bruxelas.

“Bolsonaro terá de se expor mais nessa segunda fase, em que vai bater de frente com a prática ‘de rua’ que o PT tem, que inclui ‘know-how’ em campanhas em nível local e redes importantes de apoio e divulgação”, diz ele, também vice-presidente do Observatório Político da América Latina e do Caribe, da Sciences Po (Instituto de Estudos Políticos de Paris).​

Jair Bolsonaro acena a eleitores durante carreata em Ceilândia, no Distrito Federal
Jair Bolsonaro acena a eleitores durante carreata em Ceilândia, no Distrito Federal - Evaristo Sa/AFP

Além disso, afirma Louault, as porcentagens do primeiro turno parecem indicar uma “fuga” antecipada de eleitores avessos ao PT para o guarda-chuva do capitão reformado. “Mesmo que ele precise avançar pouco para ganhar a eleição, sua reserva de votos pode ter se esgotado já agora, deixando-o com pouca margem de manobra para o segundo turno.”

O pesquisador acha improvável que se forme, em torno de Fernando Haddad, uma frente republicana nos moldes da que, ao longo das últimas eleições presidenciais francesas, tem visto nomes da esquerda e da direita moderada somarem esforços no segundo turno para evitar a ascensão ao poder da ultranacionalista Reunião Nacional (antiga Frente Nacional).

“Isso não vai funcionar no Brasil, é um discurso que não encontra eco entre antipetistas, para quem o PT encarna uma ameaça à democracia tão grande –senão maior—do que uma eventual eleição de Bolsonaro”, diz Louault.

Por isso, prossegue o professor, a estratégia de Haddad deveria passar pela recuperação do capital de seu partido enquanto “protetor dos pobres”, e isso não só no Nordeste, mas também nas periferias das grandes cidades, onde ele precisará tirar a enorme vantagem do adversário.

“Há uma fatia do eleitorado mais sensível a efeitos de campanha, ao uso da emoção para caracterizar certos perigos. O PT pode escolher enquadrar Bolsonaro como um candidato das ‘elites opressoras’, mas isso significaria polarizar ainda mais o debate”, observa.

Segundo o cientista político, o candidato petista poderia optar por um “jogo tático”, induzindo o oponente e seus auxiliares (como o boquirroto candidato a vice, general Mourão) ao erro, a se excederem na retórica radical, por exemplo –o que afugentaria alas da classe média desiludidas com o PT, mas de perfil moderado em matéria de usos e costumes, que votaram em Marina Silva (Rede) ou Geraldo Alckmin (PSDB) no domingo (7).

“Como são menos experientes, os bolsonaristas estão mais vulneráveis a armadilhas, podem cair em contradição sobre o eventual programa de governo, fazer anúncios apressados que deem ao campo petista a chance de caracterizá-los como ineptos, como aqueles que vão derrubar a economia e desmantelar os serviços públicos”, afirma Louault.

Ele pondera, entretanto, que a força torrencial da “campanha de desinformação e simplificação de questões” conduzida nas redes sociais pela equipe do militar fragiliza a estratégia de apostar em tropeços discursivos dele.

Qualquer que seja o resultado do segundo turno, o risco de degradação da democracia no Brasil é acentuado, na opinião do professor. “Por um lado, há uma ameaça de não aceitação do resultado [em caso de vitória de Haddad]; por outro, delineia-se um desprezo pelas instituições republicanas, a começar pela Justiça, já criticada por Bolsonaro durante a campanha n figura do TSE. Vai ser difícil governar.”

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