Bolsonaro tem maior aprovação em grupo que viu golpe de 64

Em faixa com mais de 70 anos, ele atinge 67% dos votos válidos, 11 pontos a mais que média nacional

Marina Merlo Simon Louis Ducroquet Marco Rodrigo Almeida
São Paulo

A intenção de voto no candidato Jair Bolsonaro (PSL) é maior no grupo de eleitores que presenciou o golpe militar de 1964, aponta pesquisa Datafolha.

Na faixa etária do eleitorado com mais de 70 anos, que tinha pelo menos 15 anos quando os militares tomaram o poder, em 1º de abril de 1964, Bolsonaro atinge 67% dos votos válidos, contra 33% de seu oponente, o petista Fernando Haddad. Esse grupo representa 8,2% do eleitorado geral.

No total dos válidos no país, Bolsonaro marca 56%, ante 44% de Haddad.

O Datafolha entrevistou 9.173 eleitores em 341 cidades no levantamento, encomendado pela Folha e pela TV Globo e realizado na quarta (24) e na quinta (25). A margem de erro é de dois pontos percentuais para mais ou menos.

Ao longo de sua carreira política iniciada há quase 30 anos, Bolsonaro, capitão reformado do Exército, fez inúmeros elogios à ditadura militar brasileira. Em entrevista a um programa de TV, em 1999, declarou, por exemplo, que “através do voto você não vai mudar nada neste país”.

“Você só vai mudar, infelizmente, quando nós partirmos para uma guerra civil aqui dentro. E fazendo um trabalho que o regime militar não fez. Matando 30 mil, começando por FHC”, afirmou na ocasião, em referência ao ex-presidente tucano.

Em abril de 2016, ao votar a favor da abertura do processo de impeachment de Dilma Rousseff, Bolsonaro defendeu no plenário da Câmara a memória do coronel Carlos Alberto Brilhante Ustra, um dos principais símbolos da repressão durante a ditadura militar.

“Nesse dia de glória para o povo tem um homem que entrará para a história. Parabéns presidente Eduardo Cunha. Perderam em 1964 e agora em 2016. Pela família e inocência das crianças em sala de aula, que o PT nunca teve. Contra o comunismo, pela nossa liberdade, contra o Foro de São Paulo, pela memória do coronel Carlos Alberto Brilhante Ustra, o pavor de Dilma Rousseff, pelo Exército de Caxias, pelas nossas Forças Armadas, por um Brasil acima de tudo e por Deus acima de todos, o meu voto é sim”, afirmou.

Mauro Paulino, diretor-geral do Datafolha, relaciona a aparente contradição, de o candidato que elogia a ditadura ter maior aprovação no grupo que presenciou esse período, ao grau de escolaridade dos eleitores com mais de 70 anos.

“Esse é o grupo etário com menor escolaridade, 64% têm apenas o ensino fundamental. Embora tenham vivido integralmente a ditadura, essas pessoas possuem menos informações sobre o que de fato ocorreu no período.” 

No segmento com mais de 50 anos —e que tinha, portanto, 16 anos ou mais quando a ditadura acabou—, o resultado fica na mesma faixa dos números nacionais: 58% para Bolsonaro e 42% para Haddad.
O padrão se mantém nos segmentos com menos de 50 anos —55% a 45%— e no de mais de 35 anos —58% a 42%.


Haddad obtém seu melhor resultado no grupo com menos de 25 anos, dos que nasceram entre o governo de FHC e o de Lula, no qual marca 51%, ante 49% do candidato do PSL. Ainda assim, estão empatados na margem de erro. 

Pesquisa Datafolha divulgada no dia 5 de outubro apontou uma aprovação recorde da democracia entre os brasileiros. Para 69% dos eleitores, o regime democrático é a melhor forma de governo.


O índice é o mais alto registrado desde 1989, no ano da primeira eleição para a Presidência da República após a ditadura militar (1964-1985), quando a questão foi aplicada pela primeira vez.

Nesse grupo com apreço pelo democracia, o menor índice de apoio vem dos eleitores de mais de 60 anos: 64%. Em consequência, a defesa da ditadura nessa faixa, 14%, também fica numericamente à frente da média nacional (12%).

“Os fatos são relacionados. Bolsonaro tem maior aprovação nesse segmento que menos aprova a democracia”, diz o cientista político Fernando Abrucio, professor da FGV.

“O discurso do Bolsonaro é focado no medo. No medo da violência, no medo do MST, no medo das transformações sociais. De fato, o medo venceu a esperança nesta eleição. Tornou-se a variável chave para a definição do voto. E esse grupo dos mais velhos é mais sensível a esse discurso, pois têm valores mais tradicionais”, completa Abrucio.

Pesquisa Datafolha apurada nos dias 17 e 18 de outubro também mostrou que o legado da ditadura é mais bem avaliado pelos cidadãos com mais de 70 anos. Nesse segmento, as realizações do período foram positivas para 43% e negativas para 36%. Entre todos os entrevistados, 51% disseram que o legado é negativo, contra 32% que o consideram positivo. 

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