Descrição de chapéu Eleições 2018

Com chance real em MG, Zema ameniza ruptura com política e revê privatizações

Empresário, que disputa com Anastasia, abandona aos poucos propostas para empresas estatais

Carolina Linhares
Belo Horizonte

Diante da perspectiva de sair vencedor na eleição para o Governo de Minas Gerais, o empresário Romeu Zema (Novo) vem amenizando ou até abandonando propostas que defendia, como a privatização das estatais mineiras.

Em pesquisa Datafolha de sábado (27), ele aparece com 70% dos votos válidos contra 30% de Antonio Anastasia (PSDB), senador e ex-governador. No primeiro turno, o empresário chegou a 43%, e o tucano teve 29%.

Sem a presença do PT no segundo turno, já que o governador Fernando Pimentel (PT) terminou em terceiro, a campanha se desnacionalizou. O embate pautado pelo impeachment e pela prisão de Lula (PT) passou a resumir-se a um confronto entre experiência e novidade.

Disputando a primeira eleição, Zema diz que nunca se envolveu com política, embora a Folha tenha revelado que ele, seu irmão e seu pai se filiaram ao PR em 1999, ao qual se manteve ligado até janeiro deste ano, quando passou para o Novo. Ele diz que nem se lembrava da filiação anterior, feita a pedido de um amigo.

Zema era praticamente desconhecido até o debate da Rede Globo, no dia 2 de outubro, único para o qual foi convidado. Na ocasião, após defender o voto em Jair Bolsonaro (PSL), saiu de 9% de intenção de votos para vencer em primeiro turno.

O empresário de Araxá (MG), dono de uma rede de 800 pontos de venda em dez estados que vai do varejo de eletrodomésticos à distribuição de combustíveis, com 5.300 empregados, defende o fim das “mordomias dos mesmos políticos de sempre”.

A Procuradoria Regional Eleitoral de Minas investiga se houve abuso de poder econômico ao usar lojas e funcionários para pedir votos. A Justiça determinou a retirada de bonecos de tamanho real de Zema das lojas e de imagens do empresário nos caminhões da rede. A campanha nega irregularidades.

O Novo trouxe propostas de apelo popular como acabar com a corrupção, não negociar cargos, não se aliar a outros partidos, montar um secretariado técnico e não usar dinheiro público para financiar a campanha. Zema também agrada os colegas empresários ao pregar o estado mínimo, que não intervém para regular e fiscalizar

Zema encarnou o rechaço à classe política, representando uma ruptura com as gestões PSDB e PT que governaram Minas desde 2003. Hoje o estado estima um déficit orçamentário de R$ 11,4 bilhões e atrasa salários de servidores e repasses às prefeituras.

Ao passar para o segundo turno, porém, Zema intensificou o contato institucional com entidades religiosas, militares, sindicatos de servidores, prefeitos, Judiciário e admitiu rever propostas.

O caso mais emblemático foi a privatização de estatais, como Cemig (energia) e Copasa (saneamento). Zema passou a dizer que as empresas estão desvalorizadas e não vale a pena vendê-las neste momento, somente após “arrumar a casa”.

O candidato do Novo justifica que o plano é dinâmico. “Vendo, discutindo e escutando as pessoas, vi que dava para melhorar muito o plano de governo”, afirmou.

Plano escondido

Um outro programa de governo, que nunca foi registrado na Justiça, mas chegou a ser divulgado no site de Zema e retirado após o primeiro turno, lista ações também abandonadas pelo candidato, como implantar sistema de áudio para localizar acionamento de armas de fogo e estabelecer alíquota única de ICMS.
 
O plano, escondido por Zema e alardeado por Anastasia, chega a dar nomes para programas e detalha as privatizações, incluindo universidade estadual e entidades de pesquisa rurais. Fala em corte de homenagens e banquetes, eliminação de isenções e benefícios fiscais, prontuário biométrico, expansão do Prouni para educação básica, desmobilizar todas as invasões em um ano, além de tirar das mãos do estado programas sociais, cultura, turismo, saneamento e fiscalização ambiental.
 
Segundo a campanha de Zema, a versão é apenas “uma compilação de apontamentos de filiados e simpatizantes do Partido Novo”.
 
“Na elaboração do plano tinha um grande distanciamento da realidade do estado. Quando Zema toma a proporção de um candidato mais viável, vai abandonando determinado discurso”, diz Malco Camargos, doutor em ciência política e professor da PUC Minas.
 
“A proposta disruptiva é suficiente para colocar na pauta da eleição, mas não é possível governar assim. Agora ele vai tendo que tratar esse plano de maneira que não rompa com todos os procedimentos da política.”
 
As contradições deram impulso à argumentação de Anastasiade que Zema é despreparado, pois comandar suas empresas não vale como experiência de gestão pública. Insistentemente, o senador pediu que os eleitores comparassem as propostas e trajetórias dos dois. “Não podemos correr riscos diante da crise do estado”, disse.
 
O tucano também subiu o tom em debates do segundo turno. Chamou Zema de “candidato ioiô”, “pequeno reizinho que nasceu em berço esplêndido”, “menino chorão”, além de dizer que ele não gosta de servidores e vai governar para os ricos, “os pobres que se lasquem”.
 
Anastasia começou a exibir no horário eleitoral trechos dos primeiros debates do segundo turno e, na reta final, Zema desistiu de participar de dois, no SBT e na CBN, se preservando para o da Globo, quando reapareceu ensaiado e com números na ponta da língua, mas ainda foi alvo de ataques do tucano.
 
O desempenho de Zema nos primeiros debates influenciou na estratégia de retirada. “Ele não vai se expor apenas para que Anastasia treine golpes em cima dele”, disse o coordenador político da campanha, Mateus Simões.
 
Enquanto Zema diz que a classe política se apropriou do estado, Anastasia tenta se descolar do padrinho Aécio Neves (PSDB), acusado de corrupção, e afirma que é servidor técnico há 35 anos. Ainda apela ao antipetismo, embora tenha ficado neutro entre Bolsonaro e Fernando Haddad (PT).
 
No plano econômico, os candidatos coincidem nas propostas para solucionar o déficit: não reduzir impostos, cortar gastos, inclusive servidores de indicação política, negociar a dívida com a União e melhorar o ambiente de negócios para ampliar a arrecadação.

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