Descrição de chapéu Eleições 2018

Eram projetos políticos que colocaram a vida em risco, diz governador do ES sobre greve da PM

Hartung (MDB) afirma que entregar estado um brinco gera desgaste e prepara livro sobre legado

O governador do Espírito Santo, Paulo Hartung (MDB)
O governador do Espírito Santo, Paulo Hartung (MDB) - Joel Silva - 10.fev.2017/Folhapress
Carolina Linhares
Vitória

Ao fazer um balanço sobre a greve da Polícia Militar que marcou seu terceiro mandato no governo do Espírito Santo, Paulo Hartung (MDB) afirmou que as lideranças do movimento tinham interesses eleitorais. Como mostrou reportagem da Folha, nomes que estiveram em evidência em fevereiro do ano passado estarão nas urnas em outubro

“Eram projetos políticos que colocaram em risco a vida de pessoas”, disse em entrevista.

Hartung se irritou ao ser questionado sobre sua responsabilidade na crise, afirmando que o erro foi de quem participou de algo ilegal. “Tenho muito orgulho da condução que demos.”

Para o governo, a resposta capixaba evitou que o movimento se espalhasse pelo país. “A pauta de segurança é nacional. É só olhar quem está liderando as pesquisas”, disse Hartung, que se colocou como anti-Bolsonaro e democrata.

O governador evitou avaliar se as punições pela greve são razoáveis. São acusados de crime militar 513 policiais e 3.000 são investigados. A PM já excluiu 23 policiais, mas pode chegar a 83. O secretário de Segurança Pública, coronel Nylton Rodrigues, que acompanhou a entrevista, afirmou que as sanções obedecem ao cumprimento da lei sem excessos.

Hartung, que não pretende disputar a reeleição e prega renovação na política, defendeu seu legado por deixar o estado com dinheiro em caixa e bons índices de segurança e educação. “Para entregar o governo um brinco, deu trabalho. Dá desgaste e gera incompreensões.” 

De saída do MDB, ele pretende fazer política por meio de artigos e palestras, além de voltar a atuar como economista. A próxima tarefa é lançar seu livro “Espírito Santo - Como o governo capixaba enfrentou a crise, reconquistou o equilíbrio fiscal e inovou em políticas sociais”.

 

Por que decidiu não disputar a reeleição? Tenho uma trajetória política longa, disputei oito eleições. Na minha visão, está na hora de passar o bastão. Não é uma posição contra a política. O que decidi foi não concorrer a mandatos eletivos. A democracia representativa está em crise. A sociedade quer uma renovação, mas tem um muro de pedra quase intransponível para tentar proteger o status quo.

O que espera para o futuro do estado? Estamos deixando um legado diferenciado no Brasil. Veja em que condições o Espírito Santo vai ser entregue vis-à-vis os outros estados federados. Nós, governadores desse mandato, administramos em condições desafiadoras: crise econômica, social, ética.

Aqui vamos entregar um governo organizado, contas em dia, políticas públicas funcionando, dinheiro em caixa, uma coisa talvez raríssima nesse quadro que o Brasil está vivendo. 

Estou até escrevendo um livro sobre isso. Sobre a experiência administrativa. Vamos contar a história desse governo. O que fizemos, como fizemos.

O momento mais difícil foi a greve da PM? Foi um momento desafiador, mas não foi o único. Cheguei ao governo, tinha contas atrasadas para pagar. Tive que organizar. Tinha um orçamento errado na Assembleia, superestimado. Eu conto essa história no livro. Tive que conversar com a Assembleia depois de eleito para não votar, porque estaria autorizando despesas que não ia ter receita correspondente. Tive que fazer uma negociação para diminuir cerca de 10% do orçamento de Poder Judiciário, Assembleia, Ministério Público, Defensoria, Tribunal de Contas. Foi um momento de muita tensão.

Depois teve que ficar três anos sem fazer correção salarial dos servidores. Não é fácil. O tempo inteiro tinha que mostrar as contas às diversas categorias. Quando assumi, o estado já estava no limite de alerta da Lei de Responsabilidade Fiscal. As pessoas sempre acham que tem um jeitinho nessa coisa de setor público, mas não podia aumentar a folha de pagamento.

Outros estados não fizeram isso? A primeira vez que os governadores foram a Brasília pedir para renegociar suas dívidas, você vai encontrar uma declaração minha contrária. Quando você não cuida do seu estado, só tem um caminho: empurrar para a União. Só que desorganiza o Brasil. Veja meu entorno: Minas, Rio. O que se quer é mais tentar responsabilizar Brasília pelas atitudes que não foram tomadas no dia a dia das administrações.

Nós tomamos a pancada que todos os outros tomaram com a crise, e ainda com perdas da Samarco e do petróleo. Com tudo isso, você está diante de um estado organizado nessa bagunça que está o Brasil.

O que nós brasileiros precisamos é olhar no branco do olho dos nossos problemas. Para entregar o governo como vamos entregar, um brinco, deu trabalho. Dá desgaste e gera incompreensões.

Se a gente não fizer o certo, vamos continuar a vida inteira no nosso país patinando. E ficando com essa conversa de que somos o país do futuro. O futuro não se realiza, porque é um sequencial de flertes com coisas erradas, com populismo, com demagogia.

Esse desgaste pesou para não concorrer? Não. As pesquisas que recebemos davam governo bem avaliado e governador competitivo. É uma decisão não comum na política. Será que está na hora de fazer as coisas comuns ou mostrar que não tem apego, que tem ideal?

Olhando hoje, qual foi o saldo da greve? O saldo é negativo para a sociedade. As consequências de uma greve ilegal como essa foram gravíssimas. Vidas humanas foram ceifadas. Isso é uma coisa triste, lamentável. Foi um processo de muito sofrimento.

Mas tudo que é limão, eu procuro fazer uma limonada. Fizemos uma reforma na PM, trocamos uma coisa pré-histórica, que era você ser promovido por tempo de serviço e evoluímos na meritocracia.

Eu estava no hospital, sendo submetido a cirurgia de câncer de bexiga. E um processo cirúrgico dá uma incerteza na cabeça de qualquer ser humano. 

Nós conversamos o tempo inteiro com as categorias. A gente sabia que as pessoas tinham dificuldade de entender o que se passava na economia. Não tínhamos como dar dinheiro, mas dávamos conversa. Conversamos ao limite, virou madrugada. Na verdade o convencimento dos capixabas com a situação fiscal veio quando o Rio começou a quebrar. Tenho muito orgulho da condução que nós demos.

Que parcela de responsabilidade o sr. tem pelo saldo negativo? Nenhuma, querida. Pelo amor de Deus. Eu?

Sim, pelas mortes. Você está brincando comigo. Não é sério isso.

Garantir a segurança das pessoas é responsabilidade do estado. A greve foi ilegal, inconstitucional. Estou cumprindo a minha responsabilidade. Fazendo um belo governo. Vou entregar um belo estado. Será que o Brasil não vai reconhecer as coisas boas que nós temos?

É claro que lideranças desse movimento cometeram um grave erro. E tudo ligado a projeto eleitoral. Você vê que eles estão disputando eleição aí. 

O salário estava em dia. A gestão nossa manteve as contas em dias. Tinha gasolina para colocar nas viaturas. A responsabilidade é de quem liderou isso.

E quem liderou isso? Na época o sr. disse que tinha a mão peluda da política nisso. Se você quiser ter trabalho, é só pegar a lista de candidatos que estiveram dentro da greve e estão aí disputando a eleição. Eram projetos políticos que colocaram em risco a vida de pessoas.

Eu fiz meu trabalho. Mas pergunto na visão do sr: quem teve responsabilidade? Pode citar nomes? Claro que não. Não sou investigador. Quem cometeu o erro lá foi responder na Corregedoria [da PM]. A minha missão eu cumpri bem.

Acha que há candidaturas oportunistas? Não vou fazer frasezinha. Não sou criança. Estou indo embora, minha filha, me deixa descansar. Tem responsável por esse movimento? Tem. Lideranças que se envolveram, todas com projeto político. Usaram a instituição [PM] para interesse de disputa eleitoral. E fizeram mal à sociedade. Nós fomos recuperar a polícia, investimos, porque agora passou a ter um dinheirinho maior.

A arrecadação cresceu? A partir do segundo semestre do ano passado. Nós demos benefícios aos policiais, chegamos a fazer neste ano correção salarial [de 5%].

Esses candidatos usam a pauta da segurança pública? Na época da greve, um estudo de acompanhamento de redes sociais mostrou que 80% das postagens não tinha origem no Espírito Santo, tudo vindo de fora, ligado à bancada da bala, a grupos organizados no país. Ninguém sabe por que foi aqui. Ficou claro que era uma coisa nacional e se repetiu em alguns estados. A pauta de segurança não é capixaba, é nacional. É só olhar quem está liderando as pesquisas.

Quem o sr. apoia para a Presidência? Sou anti-Bolsonaro, sou democrata, acredito na democracia como valor. Pretendo ter um candidato. Vou esperar um pouco mais para escolher [dias após a entrevista, Hartung declarou voto em Geraldo Alckmin (PSDB)].

E no estado? No estado, estou quietinho governando o estado. A única tarefa minha é entregar esse estado direitinho.

Está de saída do MDB? Daqui a pouco, deixa ver o que vai acontecer com a vida partidária do país também. Vou ficar fazendo política, escrevendo artigo, terminando o livro.

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