Descrição de chapéu Eleições 2018

Festa bolsonarista tem Pai Nosso, tropa de choque, 'Bolsonaro é amor' e hostilidade contra a imprensa

Eleitores se reuniram na avenida Paulista para as comemorações

Anna Virginia Balloussier
São Paulo

Com rojões, gritos de “chora, PT”,  “vai pra Cuba que o pariu” e “ô, ô, ô, Bolsonaro é amor”, selfies com polegar e indicador estirados para simular arma e hostilidade à imprensa, eleitores se reuniram em frente a um sapo inflável gigante na avenida Paulista, neste domingo (28). O candidato do coração deles, Jair Bolsonaro (PSL), foi eleito presidente do Brasil

O anfíbio, parte de uma campanha da Fiesp contra “engolir sapos” (impostos), foi o ponto de partida para uma caminhada de poucos metros e muitos percalços até o Masp —numa festa que contou com
uma paródia do funk “Baile de Favela” (“as minas de direita são a top mais bela/ enquanto as minas de esquerda têm mais pelo que cadela”).

Eleitores comemoram vitória de Jair Bolsonaro na avenida Paulista
Eleitores comemoram vitória de Jair Bolsonaro na avenida Paulista - Rahel Patrasso/Xinhua

A dez minutos do fim da eleição, simpatizantes do capitão reformado e de Fernando Haddad (PT) se envolveram numa briga que, com socos e pontapés de sobra, invadiu uma pista da avenida. 

Tudo começou quando dois grupos antagônicos começaram a discutir, ainda na esportiva, sobre qual candidato sairia vencedor neste domingo.

O que no início era uma implicância com clima de brincadeira degringolou para uma pancadaria assim que um homem (que não estava em nenhuma das turmas) avançou aos berros contra o técnico de informática Raphael Mello, 36, vestido com uma camisa amarela em apoio a Bolsonaro. 

O agressor acusou Raphael de estar “provocando” e tentou dar um murro nele. “Achou que eu era qualquer bosta e veio agredir”, contou enquanto um amigo, ao saber que ele falava com uma repórter da Folha, dizia “a teta tá acabando, a teta tá acabando”. 

“A gente não quer brigar, só quer comemorar porque acha que Bolsonaro é o melhor para o Brasil”, disse Raphael após a confusão se dissipar com a chegada de uma viatura policial. Os PMs foram elogiados por bolsonaristas e petistas. 

Mais tarde, o batalhão de choque avançaria contra adolescentes reunidos no vão do Masp, um rolezinho que acontecia desde o começo da tarde. Bolsonaristas disseram que alguns deles estavam os roubando. 

“Deixa os ratos correrem”, disse um militante no mesmo caminhão de som onde o deputado estadual eleito pelo PSL Douglas Garcia, 24, discursou contra a “esquerda nojenta que por muito tempo tomou conta do país”.

Douglas é cofundador do movimento Direita São Paulo e do bloco carnavalesco Porão do Dops.

“A sua passagem pra Cuba já foi comprada, Pablo Vittar?”, provocou o novo deputado, referência à cantora trans que se posicionou contra Bolsonaro. Em seguida, afirmou que o presidente eleito tem muito apoio entre minorias, a LGBTQ entre elas. 

“Minha pátria vai além da minha viadagem. Sou mais homem que muito homem”, discursou um ativista com bandeira de arco-íris na mão. Na multidão, homens fantasiados como Donald Trump e Homem Aranha aplaudiam. 

Marcello Reis, do Revoltados Online, foi outro com a palavra. A quem acusa de fascismo simpatizantes de Bolsonaro, disse: “Fascista é o cu da sua mãe”. Um Pai Nosso foi puxado minutos depois. 

O apresentador Otávio Mesquita também teve sua vez no microfone. Contou que foi um apoiador de primeira hora do capitão reformado, ao contrário de muito “artista petista”. Pediu paz. “Vamos provar que somos educados. Se vocês encontrarem algum petista, não o maltratem, eles também são seres humanos."

A imprensa que acompanhava a celebração foi hostilizada pelos primeiros bolsonaristas a chegar na Paulista. Sob fogo constante do presidente eleito, a Folha foi o veículo mais atacado por eles, que chegaram a tentar expulsar esta repórter e uma outra, por a associarem erradamente com o jornal. “Vai escrever matéria na Venezuela”, “Folha lixo” e “vai pra Cuba que o pariu” estavam entre os gritos de guerras direcionados à jornalista. 

Um único eleitor do capitão reformado, entre dezenas reunidos na esquina, defendeu o jornal, após se identificar como liberal. “Sou Bolsonaro, mas liberdade de imprensa acima de tudo.” 

A Rede Globo também não era bem vista (“chupa, Globo!”), enquanto a Record tinha predileção confessa —a organização pedia que a plateia se preparasse para entrar ao vivo na emissora do bispo Edir Macedo, que endossou Bolsonaro a dias do primeiro turno

Não eram todos a dar cheque em branco para o futuro presidente da República.

O diretor comercial André Ribeiro, 48, contou que só votou 17 porque PT, definitivamente, não lhe cai bem. 

"Não sou apaixonado por Bolsonaro. Se ele for mal, irei protestar. Quem tem bandido de estimação é petista”, disse aos goles de um “viño de la tierra de Castilla”,  tinto espanhol —exceção vermelha que aprecia.

 

A taça de vidro trazida de casa ele guardava na garupa acoplada à sua bicicleta, onde descansava a golden retriever Claire, de lacinho rosa e bandeira brasileira amarrada no corpo. 

A auxiliar administrativa Ariane Domingues, 24, foi direto da missa para a Paulista, ela e mais quatro amigas (que preferem não dar o nome).

Consenso no grupo: “O Brasil tá muito cheio de mimimi” e “todo esse vitimismo” não leva a lugar algum.

Perto dali, uma ambulante vendia a R$ 25 uma camisa rosa em que uma clássica imagem feminista (uma mulher fazendo muque e o lema "we  can do it!") ganhou repaginação. No braço dela, os dizeres “ele sim”.

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