General eleito para Câmara sugere que Bolsonaro adote tom conciliador

Militar mais graduado na futura bancada bolsonarista, Roberto Peternelli defende pacificação

Ricardo Balthazar
São Paulo

Eleito deputado federal por São Paulo a bordo da caravana de Jair Bolsonaro (PSL), o general da reserva Roberto Peternelli diz que está chegando a hora de o capitão reformado deixar de lado a retórica agressiva adotada na campanha  eleitoral e moderar o tom de seus discursos.

Ele acha que Bolsonaro precisa "pensar no país como um todo", e não só nos que o apoiam, e adotar um "tom conciliador" para pacificar o país se for eleito no domingo (28). Novato na política, Peternelli é o mais graduado dos militares que conquistaram cadeiras na Câmara dos Deputados com a onda conservadora liderada por Bolsonaro.

O general diz que o Supremo Tribunal Federal tem "papel fundamental" no país e minimizou os ataques que o candidato do PSL e seu filho, o deputado Eduardo Bolsonaro (SP), fizeram à corte durante a corrida presidencial.

No domingo (21), em mensagem a seguidores que foram às ruas em São Paulo manifestar apoio à sua candidatura, Bolsonaro disse que seus adversários serão presos e banidos se chegar ao Palácio do Planalto.

O general da reserva Roberto Peternelli, eleito deputado federal pelo PSL de Jair Bolsonaro - Danilo Verpa - 24.out.2018/Folhapress

 

Por que tantos militares entraram na política?
Sempre estimulei meus colegas a participar. Para a sociedade, é importante ter todos os segmentos [representados no Congresso]. Tivemos presença maior do que em eleições anteriores, mas um número pequeno num universo de milhares de candidatos, e somente seis deputados eleitos.

Qual a motivação?
O crescimento da candidatura de Jair Bolsonaro. O contexto da busca pela moral e pela ética estimulou alguns a participar. Muitos já atuavam em suas cidades, nos clubes, na maçonaria, em outras áreas.

Qual será a prioridade no Congresso? 
Nosso foco é o bem comum. Vamos acompanhar as propostas que Bolsonaro apresentar. Algumas medidas que anunciou não dependem do Congresso, como a redução do número de ministérios.

Há preocupação com a reforma da Previdência? 
Estamos estudando. É importante ter visão do todo. Vamos ouvir o futuro comandante do Exército, e ver o que o próprio presidente irá propor. Seremos apenas 6 dos 513 deputados federais. Com  certeza prevalecerá o interesse comum.

A ocupação de postos chave no ministério não dará mais força para os militares? 
O próximo governo pode ter uma presença um pouco maior, mas o próprio Bolsonaro já informou que o critério para escolhas será técnico. Não vejo um governo caracterizado por presença massiva de militares. A participação de algumas pessoas que trabalham com algumas áreas e podem contribuir é natural.

O que diferencia os militares que estão chegando à política agora e os que mandaram no país durante a ditadura? 
Alguns princípios são os mesmos desde a academia. Os preceitos da ética, da moral, o cuidado com a coisa pública, com a verdade, a busca pelo que é melhor para a estrutura.

O que aprenderam com os erros do período autoritário? 
O pensamento nosso, democrático, no país, no que é bom e adequado. Não estudei detalhadamente. Meu foco é naquilo que podemos produzir para o Brasil, senão ficamos sempre no mesmo  foco histórico. Mas observo que os presidentes militares saíram sem nenhum contexto moral. Essa honestidade é uma referência que precisamos ter.

O que pensa do general da reserva Girão Monteiro, que foi eleito deputado pelo PSL no Rio Grande do Norte e recentemente defendeu o  impeachment e a prisão de ministros do STF? 
Não conversei com ele. O Supremo é o guardião da nossa Constituição e tem função muito importante. Reforma do Judiciário é um assunto que o próprio Judiciário deve estruturar. O Judiciário tem cumprido muito bem o seu papel, suas atribuições.

Mas o general defendeu a prisão de ministros do STF.
Não me aprofundei para saber qual é o respaldo legal que permitiu a ele abordar tal assunto. No meu entender, o Supremo tem papel fundamental.

O sr. desconfia da segurança das urnas eletrônicas, como Bolsonaro? 
Temos que dar credibilidade ao processo eleitoral e às instituições. A própria ministra [Rosa Weber] que preside o Tribunal Superior Eleitoral tem afiançado o sistema. Alguns  especialistas demonstram que determinada urna pode ser eventualmente fraudada. Mas, num universo global, creio no processo eleitoral que temos.

Bolsonaro também atacou os ministros do STF durante a campanha, e seu filho falou em fechar o tribunal. 
A própria declaração do filho, não creio que tenha tido na intenção básica qualquer pensamento mais forte de fechar.

Então, qual era a intenção? 
Foi uma resposta a uma pergunta [sobre uma hipótese] que eventualmente poderia ocorrer. Ele mesmo já se desculpou. Não foi uma resposta adequada. Ele mesmo reconheceu esse fato e temos que preservar todas as  instituições, em especial os Poderes.

Bolsonaro disse que alguns ministros envergonham o país, falou em aumentar o número de integrantes do STF para formar maioria e depois recuou. 
Não vejo, sem motivo efetivo, nada que permita [tomar medidas] fora do contexto legal. O militar, por  natureza, é uma pessoa que age dentro dos preceitos legais. Penso dessa forma. Sou a favor do processo democrático.

O general Hamilton Mourão, vice de Bolsonaro, disse admitir a possibilidade de o presidente dar um autogolpe, com apoio militar.
Não me aprofundei, não conheço essa declaração, mas volto a reiterar...

Ele falou na televisão, e saiu em todos os jornais. 
Tenho me dedicado muito à campanha. Qualquer que seja o foco, acredito que só possa ter respaldo de qualquer ação dentro de um princípio de legalidade, nada fora desse contexto.

Mourão e Bolsonaro tratam como herói o coronel Carlos Alberto Brilhante Ustra, que chefiou um dos principais centros de tortura da ditadura quando a repressão política estava no auge. Concorda? 
O foco que eu gosto sempre é de pensar no Brasil do  futuro, senão a gente não caminha.  Naquele momento, quem buscou a luta armada não foi o Estado brasileiro. Quando você tem um conflito e ele sai das ideias para a parte armada, o Estado tem que evitar que aquilo ocorra. Acredito que [militares  como Ustra] estavam cumprindo atribuições que lhe foram passadas.

Como acha que a tensão institucional existente hoje evoluirá no próximo governo? 
Temos uma crise econômica, uma crise moral, uma crise ética. É hora de buscar em paz e harmonia superar os problemas que temos. Se tem atrito, é hora de não ter  mais atritos. Entre os próprios ministros do Supremo. Hora de buscar o bem comum dos brasileiros, sem atrito entre os Poderes.

Como deve ser interpretado o discurso de Bolsonaro no domingo (21), quando ameaçou os adversários com prisão e banimento? 
O momento é de união. Aqueles que têm que ser presos, se fizeram alguma coisa equivocada, não interessa de que  lado estejam, a Justiça continuará cumprindo naturalmente o seu papel. O momento é de união, de paz. Temos que buscar harmonia e bom senso, voltar a ter orgulho de estar no Brasil, da conduta de todos os brasileiros.

As palavras e o tom do discurso dele contribuem para a pacificação? 
Quando se considera um debate, muitas vezes acaba tendo um atrito entre os candidatos, além da discussão das ideias. Mas acredito que Bolsonaro, se for confirmada a sua  eleição, não pode pensar num segmento, tem que pensar no país como um todo.

Mas ele não estava debatendo com ninguém ao fazer esse discurso. 
O tom da pessoa, do presidente, tem que ser um tom conciliador. Se não buscarmos os aspectos comuns, a convergência, não debatermos as ideias, ouvirmos todos os lados,  não vamos dar ao Brasil a resposta que merece.

MAIORIA DOS MILITARES QUE SE CANDIDATARAM FRACASSOU NAS URNAS

A maioria dos integrantes das Forças Armadas que decidiram entrar na política neste ano fracassou nas urnas. De 117 militares cujas candidaturas foram acompanhadas por oficiais da reserva durante a campanha, somente 11 conseguiram se eleger. 

A lista não inclui o deputado federal eleito Hélio Barbosa Lopes (PSL-RJ), amigo de Jair Bolsonaro que se tornou o mais votado no Rio de Janeiro. Conhecido como Hélio Negão, ele  é subtenente do Exército, mas estava fora do radar do pessoal da reserva.

Com ele, são seis os militares com cadeiras asseguradas na Câmara dos Deputados. Eles tomarão posse em fevereiro. Outros cinco se elegeram para vagas nas Assembleias Legislativas dos estados.

Os seis que chegaram à Câmara são todos do partido de Bolsonaro e membros do Exército. Peternelli, 64, foi para a reserva há quatro anos como general de divisão, com três estrelas. Ele se elegeu para a Câmara com 74 mil votos.

Ele foi contemporâneo de Bolsonaro na Academia Militar das Agulhas Negras (Aman), e foi o capitão reformado quem o encorajou a entrar na política quando se aposentou, recomendando que se filiasse ao PSC, sigla em que o presidenciável estava antes do PSL.

Os dois também estudaram na Aman com o outro general da reserva que fará parte da bancada bolsonarista na Câmara, Girão Monteiro (RN), que há duas semanas defendeu a destituição e a prisão de ministros do STF que soltarem investigados por corrupção.

Segundo o Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap), a partir do ano que vem a Câmara terá 60 deputados identificados com forças de segurança, incluindo os integrantes das Forças Armadas e policiais militares e civis. 

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