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Haddad acenar ao mercado seria 'o pior erro', diz Boulos

Para o ex-candidato, o mercado financeiro está com Bolsonaro

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São Paulo

Um aceno ao mercado seria “o pior erro” que Fernando Haddad “poderia cometer nesta campanha”, diz Guilherme Boulos (PSOL).

Com chances reais de ter um Palácio do Planalto sob guarda de Jair Bolsonaro (PSL), que por pouco não liquidou a fatura eleitoral no primeiro turno, o líder do Movimento dos Trabalhadores Sem Teto foi de adversário a um dos coordenadores da campanha do PT. 

Haddad e Guilherme Boulos anunciam aliança pela democracia
Haddad e Guilherme Boulos anunciam aliança pela democracia - Ricardo Stuckert/Divulgação

O PSOL oficializou o já esperado apoio a Haddad na terça (9), para um segundo turno que será marcado por um embate “entre civilização e barbárie”, Boulos diz à Folha no comitê de sua campanha, que já começa a ser desativado, na zona oeste de São Paulo. 

Repete o que virou um mantra no QG petista: Bolsonaro precisa ser enquadrado como um atentado aos valores democráticos, mas não só. “Tocar na alma” do eleitor que votou em Bolsonaro é o grande desafio que Haddad tem pela frente. E sublinhar a perda de direitos sociais é uma das vias expressas para chegar a ele.

“Ele votou pela reforma trabalhista, para congelar investimentos em saúde e educação [teto de gastos], contra a PEC das domésticas... Sem contar as declarações do seu vice, general Mourão, sobre o 13º.”

O PT e também Ciro Gomes (PDT), outro nome competitivo da esquerda, que terminou o pleito com 12,5% dos votos válidos, erraram ao não por Bolsonaro sob tiroteio desde o primeiro momento, diz o ex-candidato.

Tamanha era sua rejeição que “houve a opção de não bater porque o tinham como adversário preferencial, e isso foi um erro”.

Em agosto, Boulos disse à Folha que Haddad, o professor acadêmico que ainda não havia formalmente ocupado o lugar de Lula na chapa, precisava se conectar mais com o povo: faltaria “a certos setores de esquerda a humildade de pisar no barro, escutar mais e doutrinar menos”, afirmou, em clara referência ao hoje candidato. “Fica a dica.”

Haddad já usufrui de boa parte do espólio lulista e tem que avançar sobre outros polos se quiser desidratar Bolsonaro, com 58% dos votos válidos, 16 pontos a mais do que o petista, segundo o Datafolha.

Mas não é se enturmando com o setor financeiro que ele vai longe, afirma Boulos. É um equívoco “achar que a ampliação necessária que tem que ser feita é pró-mercado. O mercado já tomou lado. Olha a movimentação da Bolsa. Boa parte dos grandes expoentes do mercado financeiro já estavam com Bolsonaro no primeiro turno, abandonaram o navio do [Geraldo] Alckmin”.

O PT resiste a serenar os ânimos do mercado apontando desde já nomes para uma eventual equipe econômica de Haddad. O petista, contudo, escalou auxiliares para fazer pontes na área, zelando por um tom moderado.

Para o coordenador do MTST, o capitão reformado “soube surfar muito bem na etiqueta de antissistema”, e a esquerda em geral “falhou em não desmitificar” esse ponto. 

Boulos conta que encontrou com um rapaz de 25 anos numa pastelaria no bairro da periferia paulistana onde mora, o Campo Limpo. O jovem lhe disse que gostou do estilo dele de “pôr o dedo na ferida”, mas fechou a cara quando soube que agora apoiaria Haddad.

Votou em Bolsonaro porque se sentia inseguro nas ruas e gostava do discurso armamentista. Boulos contra-argumentou na linha “armas geram mais violência”, o interlocutor disse ok. Mas e sua promessa de combater privilégios, de ser contra o sistema?

Boulos apontou então que o candidato do PSL está no Congresso desde 1991, passou por nove partidos (“inclusive nove anos no PP de Paulo Maluf”) e aderiu a benefícios como o auxílio-moradia, apesar de se por como um gladiador solitário contra privilégios. Diz que o eleitor curtiu.

O candidato do PSOL terminou a corrida em décimo lugar, com 617 mil votos, bem abaixo das médias anteriores da legenda —Luciana Genro foi a opção de 1,6 milhão eleitores em 2010, e Plínio de Arruda Sampaio, quatro anos antes, na primeira eleição do PSOL, a de 886 mil. Os dois ficaram em quarto lugar.

Para o ex-presidenciável, o desempenho se deve à “eleição do voto útil”, na qual muitos eleitores podiam até simpatizar com sua candidatura, mas optaram por Haddad ou Ciro por acreditarem que eles tinham chances reais de ir para o segundo turno.

Mas já é uma vitória e tanto, diz, ter jogado luz, em rede nacional, a temas caros ao PSOL, como causas LGBTQ e luta por moradia. “Saio fim a sensação de dever cumprido.”

Cabo Daciolo (Patriota), que ocupou um papel folclórico com seus gritos de “Glória a Deus!” e suas teorias da conspiração envolvendo maçons e a sociedade secreta Illuminati, venceu não só Boulos, como também Marina Silva, Alvaro Dias e Henrique Meirelles.

Para o líder do MTST, Daciolo é “meio como o fenômeno Enéas Carneiro, Tiririca”, alguém que “incorporou o voto de protesto” numa “eleição marcada por medo, ódio”.

Se for o “governo do ódio” o eleito, o PSOL será oposição, ponto. Caso Haddad chegue lá, Boulos afirma que a legenda a qual se filiou em março precisaria se reunir para discutir que posição assumir. 

Desde 2004, quando foi criado como dissidência do PT, a sigla está nas trincheiras oposicionistas do Congresso.

Mas o momento do país é outro, depois de “golpes” como o impeachment de Dilma, a prisão de Lula e a aprovação da reforma trabalhista, diz Boulos. “Me perguntaram se PSOL tinha mudado. Não, quem mudou foi o Brasil.”

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