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Blocos pesam mais do que partidos em Congresso argentino

O velho partido socialista vem perdendo espaço para uma nova coalizão

Sylvia Colombo
Buenos Aires

O Congresso argentino guarda algumas diferenças com relação ao brasileiro quando o tema é a fidelidade partidária.

Existem partidos muito tradicionais, como o Justicialista (o partido oficial do peronismo, porém não o único), a União Cívica Radical (UCR), o Socialista, e diversos menores.

Porém, a cada gestão, o que predomina é que parlamentares se reúnam em alianças, coalizões, e as votações de projetos costumam seguir essa lógica de blocos. Na maior parte das vezes, os blocos votam em consonância; noutras, pode haver divisões e dissidências.

Inclusive na hora de serem apresentados formalmente ou pela imprensa, os congressistas são identificados por qual coalizão ou bloco integram naquela gestão, e não tanto por seu partido de origem, porque este pode se dividir a cada legislatura.

Quando se vota em blocos, geralmente se segue a orientação do líder de cada coalizão. Há casos, porém, mais divisivos, como foi a votação pela Lei do Aborto, que liberaria o recurso até a 14ª semana de gestação.

Deputados argentinos após aprovação de legalização do aborto, em junho deste ano
Deputados argentinos após aprovação de legalização do aborto, em junho deste ano - Osvaldo Fanton/AFP

Houve rachas em vários blocos, e apenas o kirchnerista (com a exceção de uma deputada) votou unido pela aprovação do projeto, que acabou saindo derrotado.

Já na votação do novo Orçamento para 2019, houve muito ruído —e até brigas verbais— entre os blocos, mas a votação foi mais coerente com a recomendação das lideranças de cada um. O Orçamento foi aprovado como o governo desejava.

Atualmente, o Congresso está dividido, em linhas gerais, em três grandes blocos. Existe o bloco governista, formado pela coalizão Cambiemos —que reúne o PRO (Proposta Republicana, partido fundado pelo presidente Mauricio Macri) e seus aliados, entre eles a tradicional UCR.

Há o bloco do peronismo moderado --formado por parlamentares do partido Justicialista que são de centro ou de direita e seus aliados. E também o bloco kirchnerista —liderado pela ex-presidente Cristina Kirchner e que reúne vertentes mais à esquerda do partido Justicialista e outros agrupamentos de centro-esquerda e esquerda.

O velho partido socialista vem perdendo espaço para uma nova coalizão, a Frente de Izquierda, que contém integrantes deste partido e outros, vindos de organizações de militância juvenil. Sua representação, entretanto, ainda é pequena.

Durante essa primeira gestão Macri, a aliança Cambiemos contou com o apoio do bloco dos peronistas moderados tanto no Congresso quanto com relação aos governadores das províncias —a maioria deles dessa vertente.

Na eleição de 2019, essa configuração deve mudar, uma vez que o bloco desse peronismo moderado se fortaleceu muito e pretende se descolar tanto do governo como do kirchnerismo, apresentando um candidato próprio à Presidência para concorrer, por ora, contra o candidato da aliança Cambiemos, que deve ser Macri, e contra o candidato kirchnerista, que deve ser a própria Cristina Kirchner.

Apesar de o atual governo não ser peronista e a cada tanto surgirem novas agrupações antiperonistas, em termos de Parlamento, ainda vigora em parte uma frase do próprio Perón, em uma entrevista concedida em 1972 a um jornalista estrangeiro, que lhe perguntou sobre a distribuição político-partidária da Argentina.

O general respondeu: "Existem os radicais (da União Cívica Radical), os socialistas, os conservadores e outros partidos menores". Ao que o repórter, algo surpreendido, indagou: "Mas, e os peronistas?". Perón então sorriu e disse: "Peronistas somos todos".

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