Delatores afirmam que herdeiro da OAS sabia sobre propinas em obra

Ex-funcionários da empreiteira dizem que Cesar Mata Pires Filho decidiu sobre contratos fictícios

Wálter Nunes
São Paulo

Pelo menos três ex-funcionários do departamento de propina da OAS que assinaram acordo de delação premiada na Lava Jato afirmaram em depoimento à Polícia Federal que Cesar Mata Pires Filho, herdeiro da companhia, sabia dos pagamentos de “vantagens indevidas” referentes à obra da Torre Pituba, sede da Petrobras na Bahia.

Cesar Mata Pires Filho e mais 21 pessoas, foram alvo de mandado de prisão, na última sexta (23), assinado pela juíza federal Gabriela Hardt, substituta de Sergio Moro na Lava Jato. Eles são acusados de participar de um esquema de fraudes e desvios de verbas do empreendimento. O empresário estava fora do país e se apresentou à polícia, em Curitiba, na madrugada de segunda-feira. 

Nesta quinta (29) a juíza estipulou fiança de R$ 28,9 milhões para que o empreiteiro deixe a carceragem da Polícia Federal. Segundo a magistrada, o valor corresponde “às vantagens que teriam sido distribuídas indevidamente pela OAS nas obras do conjunto Pituba”. 

A Torre Pituba é um empreendimento feito com dinheiro da Petros, fundo de pensão dos funcionários da Petrobras, e realizado em conjunto pela OAS e Odebrecht. O projeto previa que o prédio construído fosse alugado para a Petrobras por 30 anos.

Durante a investigação, os policiais federais ouviram os delatores do departamento de propina da OAS, conhecido formalmente como controladoria, que detalharam como funcionou o esquema para o pagamento de suborno para diretores da Petros, agentes públicos e políticos. 

José Maria Linhares Neto, Ramilton Machado Júnior e Roberto Souza Cunha disseram que o empreiteiro não só tinha conhecimento sobre o esquema como participou de reuniões em que se falou sobre subornos milionários.

Torre Pituba, prédio onde fica a sede da Petrobras na Bahia
Torre Pituba, prédio onde fica a sede da Petrobras na Bahia - Reprodução

Linhares Neto, que foi responsável pelo controle da distribuição do caixa dois da OAS, prestou depoimento em 19 de junho e contou aos investigadores que a empreiteira se valia dos serviços de um doleiro para levantar os recursos para a propina. Ao falar sobre a autorização para esses pagamentos disse que “Leo Pinheiro e também Cesar Mata Pires Filho tinham ciência de que havia pagamentos de vantagem indevida na obra referida dado o volume de recursos que foram pagos”.

Segundo a PF, os contratos do empreendimento foram direcionados e superfaturados para que houvesse pagamento de ao menos R$ 68,3 milhões em propina.

Ramilton Machado Junior, também executivo do departamento de propinas da OAS, relatou que em 2014 participou de uma reunião com Mata Pires Filho para resolver um impasse diante de um contrato fictício que seria feito para escoar propina para o PT. 

Leo Pinheiro, então presidente da empresa, teria ordenado que fosse feito um contrato de fachada de R$ 1,6 milhão com uma empresa de Renato Duque, ex-diretor da Petrobras. Ramilton analisou o porte da empresa de Duque e constatou que ela não executava nenhum contrato significativo naquele momento. Isso junto ao fato de o dono da empresa ser um ex-dirigente da Petrobras significava alto risco de exposição para a OAS, segundo o executivo. 

Diante do impasse foi convocada uma reunião entre Ramilton, Leo Pinheiro e Cesar Mata Pires Filho. Nela Pinheiro explicou que era necessário fazer o acerto com a empresa de Renato Duque, que já estava “chateado dizendo que depois que saiu da Petrobras ele parecia leproso”. Leo Pinheiro disse ao executivo que o dinheiro pago à empresa de Duque deveria ser descontado do acerto feito com o Partido dos trabalhadores referente à Torre Pituba. 

Leo Pinheiro e Renato Duque foram presos no final de 2014 e continuam na carceragem da PF. Ambos tentam acordo de delação premiada.

Outra situação semelhante é relatada por Roberto Souza Cunha, também funcionário da controladoria, que falou aos policiais sobre um impasse quanto a um contrato fictício que seria assinado com a empresa Mendes Pinto Empreendimentos.

Ele e Ramilton consideraram arriscado o negócio, pois o objeto do contrato seria muito frágil: estudo sobre a recuperação de uma área explorada por uma mineradora. A decisão de contratar a Mendes Pinto veio do herdeiro da OAS, segundo o depoente. “Elmar Varjão [diretor da OAS Nordeste] foi até Cesar Filho, que determinou que o contrato deveria ser feito”, disse.

Para fechar o acordo de delação, oito ex-funcionários do setor de propinas da OAS romperam com a cúpula da empresa, que tentava fechar uma colaboração premiada em conjunto, nos moldes da que foi feita pela Odebrecht. Hoje os herdeiros da companhia, Cesar Filho e Antonio Carlos Mata Pires, além do ex-presidente Leo Pinheiro, continuam tentando um acordo com o Ministério Público Federal. O executivo Elmar Varjão, responsável pelos negócios da empreiteira no Norte e Nordeste, também havia iniciado tratativas para um acordo, antes de ser preso na última sexta. 

Informações fornecidas pelos delatores da OAS já basearam também em investigações sobre desvios e pagamentos de propina na construção do Rodoanel Mario Covas, obra viária de São Paulo. 

A Folha tentou contato com a defesa de Mata Pires Filho, mas não houve resposta.

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