Nova regra de auxílio-moradia para juízes tem brecha para cortes superiores

Tribunais em Brasília terão normas próprias sobre moradia; segundo CNJ, benefício só será pago a 1% dos magistrados

O presidente do CNJ (Conselho Nacional de Justiça) e do STF, Dias Toffoli, durante última sessão plenária do CNJ deste ano
O presidente do CNJ (Conselho Nacional de Justiça) e do STF, Dias Toffoli, durante última sessão plenária do CNJ deste ano - Fabio Rodrigues Pozzebom - 18.dez.2018/Agência Brasil
 
Reynaldo Turollo Jr.
Brasília

Com uma brecha que permite aos tribunais superiores ressuscitarem o pagamento indiscriminado do auxílio-moradia a ministros, o CNJ (Conselho Nacional de Justiça) aprovou nesta terça-feira (18), na última sessão do ano, uma resolução com as novas regras para o pagamento do benefício aos juízes.

Segundo o órgão, o benefício será bem mais restrito e deverá ser pago a cerca de 1% dos 18 mil magistrados (cerca de 180).

Os ministros dos tribunais superiores, localizados em Brasília, ficaram fora do alcance das novas normas. Pela resolução, os 87 magistrados da cúpula do Judiciário terão regulamentação própria feita por suas respectivas cortes (STF, STJ, TSE, TST e STM). Até então, ministros seguiam as mesmas normas dos demais juízes.

Se o auxílio não for regulamento por esses tribunais, ele não será pago. De acordo com integrantes da cúpula do Judiciário, apesar da brecha aberta pela resolução, a edição de uma norma mais permissiva, contrária ao espírito do texto do CNJ, provocaria reações negativas até mesmo entre os ministros.

De acordo com a resolução aprovada para os juízes de instâncias inferiores, o reembolso das despesas com moradia não poderá ultrapassar o teto de R$ 4.377. Esse valor será atualizado anualmente.

O novo auxílio-moradia é previsto apenas para juízes que sejam transferidos de comarca por interesse do serviço público, conforme as regras elaboradas pelo presidente do CNJ, ministro Dias Toffoli, e sua equipe. Uma comarca pode abranger um conjunto de municípios vizinhos.

Após a deliberação do CNJ, o CNMP (Conselho Nacional do Ministério Público) aprovou resolução com o mesmo teor, regulamentando o recebimento do auxílio-moradia por membros do Ministério Público em todos os seus ramos.

Para todos, juízes, procuradores e promotores, as regras começam a vigorar em janeiro.

A resolução aprovada no CNJ estabelece cinco critérios para pagamento: 1) não pode existir imóvel funcional na cidade, 2) o cônjuge não pode ocupar imóvel funcional ou já ganhar o auxílio-moradia, 3) o juiz não pode ser ou ter sido, nos últimos 12 meses, dono de imóvel na comarca onde vai atuar, 4) a atuação deve ser fora da comarca original e 5) o juiz deve apresentar comprovante de despesa com aluguel ou hotel.

Um sexto critério, que constava da minuta da resolução, foi excluído do texto final e, depois, incluído novamente, conforme anunciou Toffoli ao final da sessão do CNJ. Ele disse ter havido um erro. Esse critério prevê que o serviço no novo local precisa ter “natureza temporária”.

O valor de R$ 4.377 vinha sendo pago indiscriminadamente a todos os juízes e membros do Ministério Público que o requeressem desde setembro de 2014, por força de decisões liminares (provisórias) do ministro do STF Luiz Fux.

Naquele ano, Fux atendeu aos pedidos de um grupo de juízes federais, da AMB (Associação dos Magistrados Brasileiros) e da Anamatra (Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho), que sustentaram que o auxílio é garantido pela Lei Orgânica da Magistratura.

O benefício acabou sendo estendido a outras carreiras, como membros de Ministério Público, defensorias públicas e tribunais de contas.

No último dia 26 de novembro, o próprio ministro Fux revogou as liminares e suspendeu o pagamento do auxílio.

A revogação feita por Fux veio no mesmo dia em que o presidente da República, Michel Temer, sancionou um reajuste de 16,38% para a magistratura. Em agosto, Toffoli e Temer haviam acordado que o benefício seria extinto se o reajuste salarial entrasse em vigor.

Na sua decisão, Fux afirmou que suspenderia os pagamentos por questões econômicas, mas que considerava o auxílio-moradia um benefício legal e constitucional. O ministro, então, determinou que o CNJ e o CNMP (Conselho Nacional do Ministério Público) criassem novas regras para garantir o pagamento nas situações que julgassem adequadas.

A norma enumera, por fim, algumas situações em que o juiz perderá o direito ao auxílio-moradia, como quando recusar o uso de um imóvel funcional que lhe tenha sido disponibilizado ou quando retornar definitivamente ao órgão de origem.

Presidentes de associações da magistratura acompanharam a aprovação das novas regras no CNJ. O presidente da AMB, Jayme de Oliveira, afirmou que o auxílio-moradia, tal como foi recriado, deverá ser pago a uma parcela muito pequena dos magistrados.

Em fevereiro deste ano, a Folha publicou que 26 ministros dos tribunais superiores, mesmo tendo imóvel próprio no Distrito Federal, recebiam dos cofres públicos auxílio-moradia para viver em Brasília.

A pesquisa então feita em cartórios da capital federal e nas folhas salariais dos tribunais mostrou que o privilégio estava concentrado em três dos cinco tribunais que formam a cúpula da Justiça: STJ (Superior Tribunal de Justiça), TST (Tribunal Superior do Trabalho) e STM (Superior Tribunal Militar).

Os 26 ministros que na época recebiam o benefício mesmo com imóvel próprio representam pouco mais de um terço da composição dessas três cortes.

Na ocasião, a resolução do CNJ que estabelecia as regras de concessão do auxílio não vedava a magistrados, que possuíssem imóvel na cidade onde exercem a função pública, o recebimento do benefício.

No STJ, 17 dos 33 ministros ganhavam na ocasião o benefício. Desses, pelo menos 12 tinham casa própria. O acúmulo de benefício com moradia própria no STM envolvia 3 dos 4 ministros que ganhavam o auxílio.

Com a liminar de Fux do último dia 26, o pagamento do auxílio para ministros dos tribunais superiores também foi suspenso.

 
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