Ex-procurador anticorrupção, Taques deixa governo de MT sob acusação

Tucano, que não se elegeu, teve nome associado a esquemas de grampos e de caixa dois eleitoral

José Marques
Cuiabá

Afetado na campanha eleitoral pela revelação de que o Supremo Tribunal Federal havia homologado duas delações que o citavam, o governador mato-grossense Pedro Taques (PSDB) ordenou o levantamento de tudo o que pudesse desmontar as menções apresentadas contra ele pelos colaboradores.

A demanda fez funcionários revirarem a noite organizando documentos.

Já reunidos, esses papéis são considerados uma espécie de dossiê de defesa prévia de Taques em seus últimos dias no Palácio Paiaguás, sede do governo do estado.

O governador de Mato Grosso, Pedro Taques, em entrevista à Folha, sentado diante de uma mesa. Ele usa óculos e camisa com listras verticais finas
O governador de Mato Grosso, Pedro Taques, em entrevista à Folha - Edson Rodrigues/Folhapress

O tucano tentou a reeleição, mas amargou um terceiro lugar numa disputa em que Mauro Mendes (DEM) venceu no primeiro turno.

Durante seu mandato, presenciou a prisão de aliados —como o ex-Casa Civil Paulo Taques, seu primo, e o ex-secretário da Educação Permínio Pinto— e a transformação de outros em desafetos —como o promotor Mauro Zaque, ex-secretário de Segurança Pública, e até um deputado do PSDB, Baiano Filho.

Na campanha, mais rompimentos: a juíza Selma Arruda, candidata ao Senado pelo PSL, anunciou que deixou de apoiá-lo ao saber das homologações. Ela foi eleita.

Agora, com os documentos, o governador tenta se preservar em um estado cujas operações policiais têm mirado políticos e agentes públicos. Alguns dos principais alvos foram o ex-governador Silval Barbosa (2010-2014), o ex-presidente da Assembleia Legislativa José Riva e Paulo Taques.

Outro objetivo de Pedro Taques é resguardar a imagem política que construiu, de combatente intolerante da corrupção: ex-procurador da República, pediu a prisão de Jader Barbalho (MDB-PA) em 2002.

Ao longo do mandato como governador, ele já vinha se antecipando juridicamente aos escândalos que poderiam afetá-lo. 

Depois que Mauro Zaque deixou a Secretaria de Segurança Pública, no fim de 2015, acusou o Taques de ter conhecimento de um esquema de grampeamento de adversários e pediu investigação à Procuradoria-Geral da República. 

Quando o caso foi a público, o próprio Taques, em ofício, também solicitou que a PGR o investigasse. Atualmente, o caso é apurado no âmbito do STJ (Superior Tribunal de Justiça).

Zaque diz, no entanto, que Taques só pediu para ser investigado quando caso não pôde ser mais abafado.

À Folha, afirma que deixou a Secretaria de Justiça no fim de 2015 à espera de medidas contra os autores dos grampos e, um ano depois, "o governador não havia tomado providências a esse respeito". 

Outro caso em que Taques se adiantou foi a prisão do empresário Alan Malouf, que diz ter sido operador financeiro da campanha do governador em 2014. Um dia antes de Malouf ser preso, o tucano registrou um depoimento em cartório afirmando que o empresário diria que o retaliaria.

Malouf também é o principal motivo para Taques ter passado os últimos meses juntando material de defesa.

Ao ser preso, em meio a uma operação que desvendou um esquema de corrupção na Secretaria de Educação, o empresário abriu a boca: disse em delação que fazia parte de um grupo que geria o caixa dois de campanha de Taques.

Segundo ele, foram captados R$ 10 milhões para o então candidato dessa forma. Ele ainda citou supostos benefícios concedidos a empresários pela gestão do tucano.

O governador ataca esses pontos: afirma que não há provas concretas apresentadas por Malouf e diz que contrariou seus interesses.

Em seu dossiê, aponta que o estado está em disputa judicial contra a família do empresário para não pagar R$ 40 milhões em um terreno em Barra das Garças (a 500 km de Cuiabá). Também diz que empresas de Malouf e sua família perderam ou foram desclassificadas em licitações e, ainda, que não beneficiou outras firmas citadas pelo delator, como a cervejaria Petrópolis.

Por fim, afirma que sua própria gestão investigou e anulou contratos irregulares na pasta de Educação, evitando prejuízo mais ao estado.

Um dos pontos sensíveis da delação diz respeito à continuidade dos serviços de empréstimos consignados com o estado. Esse episódio, assim como o dos grampos e outros, envolvem Paulo Taques, o primo do governador.

Malouf diz que o grupo de empresários que arrecadou caixa dois para a campanha esperava que Pedro Taques rompesse a parceria com a empresa que prestava o serviço ao governo anterior e os contratasse —no entanto, Paulo Taques teria frustrado essa possibilidade ao receber "caixa três" da firma.

O contrato antigo, no entanto, foi rompido pelos primos Taques após um ano e meio de imbróglios legais.

Questionado se acha que o primo errou em algum dos casos que o envolvem em seu governo, o governador Pedro Taques usa esse caso como exemplo do que considera acusação infundada. 

"Eu não tenho elementos para dizer isso. Na época falaram que ele recebia dinheiro do consignado e está aí a demonstração...", disse à Folha.

Procurado, Paulo Taques afirma que Alan Malouf criou várias mentiras, não conseguirá prová-las e será processado por isso. Ele diz que tem convicção de que "houve um jogo de poder e, como não conseguiram atingir o governador, tentaram fazer isso por meio de seu primo, que tem o mesmo sobrenome".

O ex-Casa Civil não se manifesta sobre o caso dos grampos porque diz que uma determinação do STJ o impede de fazer isso.

Procurado, o advogado de Alan Malouf, Huendel Rolim, diz que alegações do governador "corroboram o que já foi dito por Alan Malouf em seus depoimentos" e que "causa espécie que o Governador tenha utilizado da máquina pública para patrocinar interesses pessoais de sua defesa, na produção de tais relatórios".

"Destaca-se, portanto, até em esclarecimento a toda sociedade, que a Colaboração Malouf é complexa, e será submetida ao crivo do contraditório judicial, mas, desde já, é de bom alvitre consignar, que nenhuma das alegações referentes ao caixa 2 são refutadas, sendo essas mais graves."

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