Intelectuais, artistas e ativistas de diferentes áreas fizeram nesta quinta-feira (13), dia que marca os 50 anos da edição do AI-5 (Ato Institucional nº 5), um ato para lançar um manifesto em defesa da democracia.
O AI-5, decretado pelo governo do marechal Costa e Silva, foi o mais radical do regime militar. Teve como resultado intensificação da repressão, com mortes e desaparecimentos, cassações e suspensão de direitos políticos.
O evento, na Faculdade de Direito da USP, foi organizado pelo centro acadêmico da instituição e pelo grupo Juntos pela Democracia, que reuniu mais de 7.200 assinaturas virtuais em um documento pela defesa dos pilares democráticos.
O encontro começou com um minuto de silêncio em homenagem a Eunice Paiva, viúva do deputado federal Rubens Paiva, morta nesta quinta (13); à vereadora Marielle Franco; aos dois sem-terra assassinados na Paraíba no fim de semana; aos mortos e desaparecidos na ditadura militar; e aos negros e negras assassinados nas periferias do país.
Nos discursos, se repetiram falas críticas ao que foi chamado de “cultura do extermínio” no Brasil e a gestos do presidente eleito, Jair Bolsonaro (PSL), como suas homenagens ao coronel Carlos Brilhante Ustra (1932-2015), símbolo da repressão na ditadura.
Para o advogado José Carlos Dias, “o AI-5 não pode se repetir”.
“Nós temos que estar atentos às ameaças que pairam sobre nossa pátria. O risco que nós sofremos hoje é o de termos a ditadura pelo voto”, afirmou ele, que foi membro da Comissão Nacional da Verdade.
“O governo que está para assumir [de Jair Bolsonaro] colocará em jogo não só as conquistas da democracia, mas a Constituição de 1988”, disse no microfone João Paulo Rodrigues, da coordenação nacional do MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra), conclamando os presentes a lutar também pela liberdade do ex-presidente Lula (PT).
“É um projeto político, desse ‘coiso’ eleito [Bolsonaro], de tirar direitos”, disse a psicanalista Maria Rita Kehl, que também integrou a Comissão Nacional da Verdade.
Cartazes espalhados pelas paredes do salão nobre da faculdade do largo São Francisco destacavam trechos da Constituição, como a premissa de uma sociedade pluralista e sem preconceitos e a proibição da censura política, ideológica e artística.
“Os negros nunca experimentaram o fim do AI-5. Nem as mulheres que sofrem violência diariamente”, afirmou o pastor Ariovaldo Ramos, da Frente de Evangélicos pelo Estado de Direito, que é negro.
“O essencial é a manutenção dos valores democráticos”, disse no ato o ex-ministro Celso Amorim, um dos signatários do documento. “A gente tem que manter a esperança. E é importante que as forças democráticas estejam juntas.”
A artista Daniela Thomas, outra participante, afirmou que é preciso que todos estejam “atentos aos sinais de retrocesso”.
“Os governantes que vão entrar precisam saber que existe uma resistência dentro da sociedade, e que não é ligada a partidos políticos”, falou a diretora.
Entre os que compareceram ao local estavam também a professora Ana Estela Haddad, mulher do ex-prefeito Fernando Haddad (PT), o vereador Eduardo Suplicy (PT), o deputado federal Ivan Valente (PSOL) e o escritor Fernando Morais.
Entre os que assinaram o manifesto estão ainda: o músico Chico Buarque, o professor emérito da USP Fábio Konder Comparato, os ex-ministros Rubens Ricupero e José Gregori e a historiadora Lilia Schwarcz.
Para o movimento, o AI-5 "marcou o estabelecimento de um regime de terror de Estado".
O texto pede a manutenção dos princípios da Constituição Federal de 1988, a República e o Estado democrático de Direito.
"A garantia das liberdades, dos direitos humanos individuais e sociais, do livre exercício da cidadania nos une, para além de eventuais diferenças e nuances ideológicas ou político-partidárias", diz o manifesto.
É ressaltado também o "compromisso com a pluralidade e a diversidade cultural, de crenças e de comportamento da sociedade brasileira".
Os subscreventes conclamam ainda "os democratas a se unirem para manter as liberdades duramente conquistadas ao longo das últimas três décadas".
Segundo os organizadores, ministros de todos os governos democráticos, de José Sarney (1985-1990) a Dilma Rousseff (2011-2016), estão entre os que aderiram à iniciativa. Na lista há ainda líderes religiosos, cientistas, juristas, professores, jornalistas e profissionais de outras áreas.
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