PGR inclui emails de Marcelo Odebrecht em inquérito que apura atuação de Renan a favor de empreiteira

Para Raquel Dodge, novos dados reforçam que grupo buscou auxílio de senador e que haveria atuação concentrada entre ele e Jucá

Daniel Carvalho
Brasília

A procuradora-geral da República, Raquel Dodge, incluiu emails do empresário Marcelo Odebrecht no inquérito que investiga o senador Renan Calheiros (MDB-AL) e o filho dele, o governador de Alagoas, Renan Filho (MDB), por corrupção e lavagem de dinheiro.

Ela também pediu a prorrogação por 60 dias para a conclusão do inquérito, aberto no ano passado para apurar pagamentos indevidos a Renan Calheiros para financiar a campanha de Renan Filho em 2014 em troca da aprovação da medida provisória 677/2015, de interesse do Grupo Odebrecht.

Renan Calheiros (MDB-AL), alvo de inquérito que apura suposta atuação do senador a favor de empreiteira
Renan Calheiros (MDB-AL), alvo de inquérito que apura suposta atuação do senador a favor de empreiteira - Pedro Ladeira - 26.set.2017/Folhapress

Por esta medida provisória, que tornou-se lei, a Braskem, empresa do grupo, obteve renovação de contratos de concessão de energia até 2037, o que beneficiou plantas de fábricas instaladas em estados nordestinos.

De acordo com Cláudio Melo Filho, ex-diretor de relações institucionais da Odebrecht, o senador intermediou doações eleitorais ao então candidato ao governo de Alagoas. A propina foi paga, segundo o delator, pelo presidente da Braskem, Carlos Fadigas, como doação oficial no valor total de R$ 320 mil —R$ 200 mil diretamente ao candidato e outros R$ 120 mil por meio do diretório estadual do MDB.

A PGR (Procuradoria-Geral da República) relata ainda o pagamento de R$ 1,2 milhão, via doação oficial ao MDB, que repassou R$ 829 mil a Renan Filho.

Cláudio Melo Filho detalha que, a pedido de Milton Pradines, ex-diretor de relações institucionais da Braskem em Alagoas, e Carlos Fadigas, então presidente da Braskem, participou de uma reunião com Renan, em 2014, na residência oficial do presidente do Senado, para tratar da elaboração de uma medida provisória que solucionasse a questão do fornecimento de energia para os estados do Nordeste, problema que poderia paralisar as plantas da empresa na região.

Na petição, Dodge afirma que "eventuais ilícitos" podem ter ocorrido envolvendo medidas provisórias anteriores que acabaram tendo trechos que tratavam da prorrogação dos contratos vetados.

"Como se percebe, a edição da MP 677 foi o ato derradeiro de intensa articulação do Grupo Odebrecht e outras indústrias de grande consumo de energia no Nordeste. Portanto, eventuais ilícitos envolvendo o senador Renan Calheiros podem ter ocorrido já no âmbito da apresentação de emendas e aprovação da MP 656/14 (que foi vetada nesse ponto)", escreveu Dodge.

Em um HD com dados de seu computador apreendido, Marcelo Odebrecht encontrou 480 mil emails, 230 mil anexos e 70 mil documentos.

Há emails desde 2012 que, para a PGR, demonstram "a estreita relação do senador Renan Calheiros com o tema de interesse do Grupo Odebrecht envolvendo os contratos de energia com a Chesf".

Um exemplo citado pela procuradora é mensagem enviada por Cláudio Melo Filho a Marcelo Odebrecht e Carlos Fadigas em 11 de dezembro de 2012:

"Marcelo, ontem me reuni com Sen Renan, que incluiu uma emenda de relator e permitiu que Chesf fosse beneficiada até 2015. Vamos tentar ainda incluir possibilidade de renovação nas mesmas bases. Contudo já foi uma vitória!! Abs", diz Melo Filho no email.

"JW e Renan hoje têm força suficiente para, se quiserem, conseguirem resolver o tema da energia Chesf!", diz Marcelo Odebrecht em 27 de outubro de 2014. JW seria Jaques Wagner, governador da Bahia à época.

Em outra troca de mensagens entre os três, desta vez em 11 de março de 2015, eles discutem a tentativa de derrubar um veto presidencial. Acabaram derrotados.

"Foi por bem pouco. De qualquer forma, mandamos uma mensagem para o governo", afirma Fadigas no texto.

Outro senador mencionado na petição é Romero Jucá (MDB-RR).

"Cláudio Melo Filho fez expressa menção em sua colaboração de que, durante a votação deste veto, embora não tenha ocorrido a derrubada por apenas dois votos, restou evidente o empenho do senador Renan Calheiros, que presidia a sessão. Ademais, segundo o colaborador Cláudio Melo, haveria uma atuação concentrada entre Renan Calheiros e Romero jucá nesse assunto", afirma a PGR listando oito emendas a medidas provisórias apresentadas por Jucá para prorrogar os contratos de fornecimento de energia diretamente pela Chesf às indústrias até 2042.

"Os novos dados que estão sendo juntados com esta manifestação reforçam que o Grupo Odebrecht buscou o auxílio do senador Renan Calheiros no tema referente aos contratos de energia das eletrointensivas. Estes novos elementos também reforçam os indícios de que a atuação do senador se deu durante todo o processo, passando pela MP 656 e a tentativa de derrubada do veto presidencial", conclui Dodge. 

Outro lado

A assessoria de imprensa de Renan Calheiros encaminhou nota em que o senador afirma que "email nenhum vai me puxar para baixaria no processo legislativo".

"A chance de eu ter me contaminando com essa roubalheira é zero. Pelo contrário. Criei o óbice temático para tirar das medidas provisórias todos os 'jabutis', sob o testemunho dos senadores. Fiz a minha parte. Nove investigações já foram arquivadas pelo STF. As demais também serão por absoluta falta de provas", afirmou o ex-presidente do Senado, cotado para disputar o cargo mais uma vez, em 2019.

Em nota, Jucá disse que "é lamentável  que esteja sendo anexado como prova de inquérito um e-mail entre duas pessoas de uma mesma empresa que fala sobre um suposto favorecimento financeiro de uma emenda que foi vetada".

O MDB, partido de Renan e Jucá, também divulgou nota sobre a inclusão dos emails no inquérito.

"Essa é mais uma tentativa de criminalizar a política com base em informações incompletas e equivocadas, sobre uma emenda que nem aprovada foi. Essas investidas absurdas contra o trabalho e o cotidiano do Legislativo dificultam a retomada da economia e jogam contra o Brasil."

Por meio de sua assessoria de comunicação, o senador eleito Jaques Wagner criticou a insinuação da sua participação e afirmou que os fatos comprovam que ele não teve nenhuma interferência neste processo.

"Trata-se de mais uma notícia requentada, insinuando que meras citações —neste caso uma insinuação— seriam indícios de envolvimento em algo ilícito, algo que o senador eleito refuta. Assim como registramos mais uma vez a inconformidade com este método de primeiro publicar uma notícia e somente depois ouvir o que dizem os citados. Jornalismo se faz com seriedade e sempre ouvindo todos os lados", diz a nota.

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