Proposta reduz poder da oposição na Câmara

Cotados a presidir a Casa, Rodrigo Maia e João Campos, em aceno a Bolsonaro, querem diminuir ferramentas de obstrução

Angela Boldrini
Brasília

Em aceno ao presidente eleito Jair Bolsonaro (PSL), os principais cotados atualmente na disputa pela presidência da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ) e João Campos (PRB-GO) querem mudar as regras da Casa para facilitar a tramitação da agenda do novo governo.

Os dois disputam os votos da base bolsonarista para chegar ao comando da Câmara em fevereiro.

O chamado "kit obstrução" é um conjunto de ferramentas regimentais utilizada por opositores de algum projeto que estejam em minoria para tentar adiar ou dificultar a votação dos projetos.

 
Rodrigo Maia (DEM-RJ), que tenta se manter na presidência da Câmara dos Deputados e está de olho na bancada bolsonarista
Rodrigo Maia (DEM-RJ), que tenta se manter na presidência da Câmara dos Deputados e está de olho na bancada bolsonarista - Pedro Ladeira - 14.nov.2018/Folhapress

Siglas como PT e PSOL já planejam estratégias para adiar ao máximo a agenda legislativa do governo Bolsonaro a partir de 2019. Ela incluirá propostas como a flexibilização do porte de armas e a reforma da Previdência.

Assim, a possibilidade de retirar do regimento interno da Casa as ferramentas de obstrução é vista como um aceno dos pré-candidatos à base bolsonarista, que crescerá na nova legislatura que se inicia em fevereiro.

Na quarta (28), durante "cursinho" para os novos deputados, Maia criticou o regimento atual.

"Já deveríamos ter feito uma revisão [do regimento]. Ele foi criado para um sistema do início da redemocratização, quando nos tínhamos basicamente dois partidos", disse. "Hoje tem 20, 25, 23, dependendo do bloco."

Campos elencou para seus correligionários a "atualização" do regimento como uma de suas propostas. "Atualizar e adequar o Regimento Interno à nova realidade de representação partidária na Casa para garantir efetividade ao processo legislativo", escreveu o candidato em nota para oficializar sua pré-candidatura enviada ao grupo de WhatsApp da bancada do PRB.

"Temos que fazer ajustes no regimento para dar efetividade ao processo legislativo, senão vamos demorar dez horas só para votar uma medida provisória", afirmou à Folha. "Agora, para saber exatamente os pontos [a serem mexidos] eu quero sentar com a consultoria da Casa", disse.

Questionado pela Folha na quinta-feira (29) sobre quais seriam os trechos a serem mudados, o presidente da Câmara não respondeu.

No entanto, em seu discurso Maia citou um ponto que, segundo técnicos da Câmara é consensual na base do futuro governo: o fim do tempo determinado de sessão.

Hoje, após cinco horas é encerrada a sessão deliberativa da Casa, o que protela as votações. Isso porque, após a abertura de uma nova reunião, é possível primeiro que parlamentares da oposição peçam nova contagem de quorum e apresentem novos requerimentos para adiamento ou retirada de pauta sobre a matéria em discussão.

Além disso, os líderes ganham direito à fala novamente. Num cenário de pulverização, em que partidos muitas vezes possuem apenas um deputado na Casa, essa parte pode tomar metade do tempo da nova sessão.

No próximo ano, porém, a disputa pelos microfones da Casa deve ser acentuada.

O regimento, que está em vigor desde 1989 e já sofreu emendas desde então, pode ser alterado por meio de um projeto de resolução aprovado em plenário em dois turnos.

Para Mozart Vianna, que trabalhou no Legislativo por 40 anos, 24 deles como secretário-geral da Mesa, uma mudança do regimento pode ser positiva para impedir "excessos" de obstrução.

"Mas há o direito da minoria, para que a maioria não possa passar por cima", diz ele, que critica, no entanto, a possibilidade de se apresentar seguidos requerimentos de adiamento de sessão. "Às vezes entram em obstrução em uma matéria que não é polêmica para que a pauta não chegue na polêmica, e aí não se vota nada", afirmou.

A oposição, porém, já critica a possibilidade de retirada de ferramentas de obstrução do regimento.

Segundo o líder do PSOL, Ivan Valente (SP), a mudança regimental atende um desejo imediatista da base de Bolsonaro.

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