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Governo Bolsonaro

Ao decidir sobre caso Queiroz, Fux viu obscuridade em entendimento claro do STF

Em maio do ano passado, tribunal reduziu o alcance do foro para suspeitas relacionadas ao cargo

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Brasília

Poucas vezes o STF (Supremo Tribunal Federal), que gasta um latim danado no dia a dia, decidiu com tanta clareza sobre um tema. Em maio do ano passado, o plenário, por unanimidade, reduziu o alcance do foro por prerrogativa de função.

Tomada numa questão de ordem apresentada na Ação Penal 937, a decisão estabeleceu, nas palavras do ministro Luiz Fux: "que o Supremo seja reservado somente para os ilícitos praticados no cargo [de deputado federal e senador] e em razão dele".

O ministro Luiz Fux, do STF, que suspendeu a investigação criminal sobre movimentação financeira atípica envolvendo o gabinete de Flávio Bolsonaro
O ministro Luiz Fux, do STF, que suspendeu a investigação criminal sobre movimentação financeira atípica envolvendo o gabinete de Flávio Bolsonaro - Pedro Ladeira - 28.nov.2018/Folhapress

Acabaria ali o que os ministros chamaram então de elevador processual, a prática de fazer subir para o STF o julgamento de delitos praticados por quem não tinha mandato federal até então. Ou seja, a instância julgadora seria a do momento do crime.

Fux viu obscuridade onde não existia. E apertou os botões do elevador em favor do senador Flávio Bolsonaro, que questionou a investigação conhecida como caso Queiroz.

Ex-funcionário do hoje senador eleito quando este era deputado estadual no Rio de Janeiro, Queiroz, segundo o Coaf, foi beneficiário de movimentações financeiras suspeitas na Assembleia Legislativa. Flávio entrou então na mira dos investigadores.

Na decisão, Fux reproduziu um argumento da defesa: o de que o pedido da Promotoria sobre movimentações financeiras do senador eleito ao Coaf é ilegal, pois não foi feito por via judicial.

Na petição, os advogados do filho do presidente citam um trecho do HC 349.945, do STJ (Superior Tribunal de Justiça), como embasamento para a tese de que as informações obtidas pelo Ministério Público são imprestáveis. Pinçam do acórdão apenas 23 palavras.

Garimpar trechos de decisões judiciais para amoldá-las à tese é um esporte da advocacia nacional. Os precedentes, como são chamadas sentenças emblemáticas, são como queijo parmesão na culinária local: usa-se em tudo, usa-se muito e tem gosto duvidoso.

Cabe ao juiz, ao ministro, saber se tem um "spaghetti alle vongole" à sua frente ou uma lasanha. Se for o caso, ignorar o precedente judicial que ali foi colocado apenas para enganar o paladar. Fux, no caso, engoliu o parmesão.

"Da análise dos autos, constata-se que a autoridade Reclamada [o Ministério Público] teria solicitado informações ao Coaf, acerca de dados bancários de natureza sigilosa, titularizados pelo Reclamante [o senador], abrangendo período posterior à confirmação de sua eleição para o cargo de Senador da República, sem submissão a controle jurisdicional".

Mesmo que em caráter liminar, que pode ser revista pelo relator ministro Marco Aurélio na volta do recesso judiciário, a decisão deixa no ar uma sensação de bad trip. Ao pedir a "ilegalidade das provas e de todas as diligências de investigação determinadas a partir dela", a defesa faz lembrar de um clássico: a Castelo de Areia (um protótipo da Lava Jato, que foi desmontada por manobras jurídicas).

Um ponto da defesa é que a Promotoria pediu um relatório específico de Bolsonaro em 14 de dezembro, quando este já estava eleito. De acordo com TSE (Tribunal Superio Eleitoral) a diplomação é o ato que atesta quem são, efetivamente, os eleitos.

Flávio Bolsonaro só foi diplomado no dia 18. Portanto, a investigação não alcançou seu mandato. Fux fez o papel de ascensorista do STF.

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