Descrição de chapéu Governo Bolsonaro

Fé na recuperação econômica move apoiadores de Bolsonaro

Empresários que sofreram nos últimos anos dizem já sentir melhora na economia; 65% estão otimistas, diz Datafolha

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Brasília

Ressaca da crise e fé no "mito". Os dois sentimentos formaram um retrato do Brasil entre as milhares de pessoas que foram à posse de Jair Bolsonaro (PSL) em Brasília.

Machucados pela recente recessão, seus apoiadores trouxeram experiências que quase destruíram seus negócios e dizimaram empregos. Mas também alguma expectativa de melhora: muitos já veem um novo ciclo econômico ganhando terreno na esteira da vitória de Bolsonaro.

De Campinas (SP), o empresário Valterlei Minini, 55, veio com 16 pessoas em oito motos, após 11 horas de estrada. Com faturamento de R$ 50 milhões por ano na área de equipamentos elétricos, sua empresa cortou até a secretária na recessão, que durou 11 trimestres até o final de 2016.

"Só não foi pior porque exportamos. Mas ainda temos 30% da capacidade sem uso por falta de pedidos", diz Minini. Segundo a FGV, a ociosidade média na indústria hoje é de cerca de 25%, ante os 17% dos cinco anos anteriores à crise.

Ex-eleitor de Lula em 2002 e agora apoiador do "discurso liberal" de Bolsonaro, Minini emprega 140 pessoas e quer contratar mais 15 agora para fabricar no Brasil peças para redes elétricas aéreas, que hoje importa. "Só a expectativa de privatizações na área já aqueceu o setor", diz.

Segundo o Datafolha, um recorde de 65% dos brasileiros acham que a situação econômica do país vai melhorar nos próximos meses —em agosto só 23% acreditavam nisso.

São pontos considerados favoráveis na economia a inflação abaixo da meta em 2018 e na previsão para 2019, a taxa básica de juro (Selic) estável em 6,5% e a grande capacidade ociosa nas empresas, que permite uma retomada sem pressão sobre os preços.

Empresário na área de transportes em Santa Catarina com faturamento mensal de R$ 900 mil, Ubiratã Suppis, 42, dirigiu 1.550 km com outros dois empresários para ver a posse. Ele afirma que uma de suas três empresas teve receita recorde em novembro por conta do reaquecimento dos negócios.

Durante a recessão, Suppis demitiu quase 400 funcionários formais e ficou com apenas 80 no pior momento. Agora, opera com 340 e quer chegar a 550 até final do ano. "Foi terrível dispensar tanta gente boa", diz.

No final de 2014, pouco antes de Suppis iniciar as demissões, a taxa de desemprego no país cedeu a 4,8%, a menor da série do IBGE. Hoje, está em 11,7% —e a lenta recuperação faz com que 75% dos novos postos ainda sejam ou informais ou dos chamados "conta própria", de empresas sem CNPJ.

Suppis conta que, para ampliar o atendimento ao seu principal cliente, a rede Havan de Luciano Hang, um dos maiores apoiadores de Bolsonaro, está duplicando a área de um de seus galpões de armazenagem em Barra Velha, para 5.000 m².

"Votei em Lula em 2006 e, em muitos aspectos, ele foi excelente. Mas a corrupção virou plano de governo do PT", diz. Sobre as suspeitas envolvendo Fabrício Queiroz, ex-motorista de Flávio Bolsonaro, filho do presidente, o empresário afirma que o novo inquilino do Alvorada terá de "fechar essas torneiras".

Também vindo de longe, de Fortaleza (CE) e com a família para a posse, o empresário Fernando Lima, 56, conta que dos 180 empregados formais que chegou a ter antes da crise na fabricação de carrocerias de caminhões, sobraram 70. "Mas, com janeiro já todo contratado, a expectativa para o ano é bastante boa", diz.

Com faturamento ao redor de R$ 500 mil ao mês, Lima considera a agenda liberal e desestatizante do ministro Paulo Guedes (Economia) a "ideal" para o momento. Ele diz que os salários e a Previdência do setor público são "um escândalo" diante do que o resto do país tem passado.

"E tome concurso público em governos que não sabem 'fechar o caixa', coisa que fazemos todos os dias para ver se há dinheiro suficiente", diz. "Agora, o que precisamos é ver se Bolsonaro vai mesmo equilibrar o setor público com a reforma da Previdência e menos funcionalismo, para não voltarmos para trás."

Segundo especialistas, o maior desafio da nova gestão é esse. Cálculos do governo Michel Temer indicam que, em dois anos, 98% da despesa primária da União (sem contar juros da dívida) poderá estar comprometida sobretudo com a Previdência e pessoal —sobrando 2% para custear toda a máquina, dos investimentos em estradas ao café dos ministérios.

Só no plano federal, o déficit da Previdência cresce cerca de R$ 60 bilhões ao ano, o equivalente ao dobro dos investimentos federais em 2018. Já os salários do Executivo aumentaram, nas últimas duas décadas, 49% acima da inflação —ante 14% de alta no setor privado, segundo a consultoria IDados a partir de estatísticas do Ministério do Trabalho.

Na recessão recente, a diferença entre os rendimentos dos setores público e privado ampliou-se ainda mais, diante da falta de oportunidades nas empresas e das demissões.

O engenheiro Jadson Cavalcanti, 28, diz ter sentido na pele as consequências desse processo ao ficar desempregado depois de formado, em 2015.

Foram meses até conseguir trabalho formal em uma pequena empresa, com remuneração pouco superior a R$ 3.000 brutos.

"Fiquei com uma mágoa muito grande do PT ao ver toda a minha geração entrando na faculdade e se esforçando para, depois de formada, não encontrar oportunidades no mercado. Com Bolsonaro, pelo menos a equipe econômica parece ser o que há de melhor", diz.

De Campina Grande (PB), Cavalcanti, assim como o cearense Fernando Lima, diz que o Nordeste sofreu muito na atual crise, tanto em termos econômicos como em relação à segurança, área em que Bolsonaro concentrou boa parte de seu discurso.

Nos últimos três anos, o total de pessoas consideradas pobres no país (com renda domiciliar per capita abaixo de R$ 233) aumentou 33%, a maioria no Nordeste, segundo a FGV Social. Já entre os dez estados mais violentos do Brasil, seis estão na região.

Foi o medo da violência que também estimulou Amarildo Cabral, 51, defensor público com salário mensal de R$ 25 mil em Mato Grosso do Sul a votar em Bolsonaro. Ele diz manter em sua casa em Campo Grande duas armas de fogo para proteger sua família de bandidos.

"Para mim, o presidente agora é isso: defesa da família, da propriedade e dos bons costumes", afirmava Cabral exibindo uma camiseta que mostrava Jair Bolsonaro armado com uma bazuca nas costas e uma submetralhadora na mão —atirando.

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