Nomear pessoas de direita é um ato de justiça com eleitor, diz governador de SC

Comandante Moisés exonerou dois nomes do segundo escalão por manifestações contra Bolsonaro

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Florianópolis

Um dos três governadores eleitos pelo PSL, o governador de Santa Catarina, Carlos Moisés da Silva, disse em entrevista à Folha que nomear pessoas de direita e alinhadas à sua plataforma de governo “é uma questão de justiça” com o eleitor. 

“É uma entrega que eu tenho que fazer também, de alinhamento ideológico”, afirmou, dizendo, porém, não ser a favor de extremismos. “O primeiro critério é o técnico.”

Carlos Moisés da Silva, conhecido como Comandante Moisés, governador de Santa Catarina eleito pelo PSL
Carlos Moisés da Silva, conhecido como Comandante Moisés, governador de Santa Catarina eleito pelo PSL - Theo Marques/Folhapress

O coronel da reserva dos Bombeiros exonerou dois nomes de seu segundo escalão nos últimos dias, que haviam sido nomeados por critérios técnicos, mas fizeram postagens e manifestações contrárias ao atual presidente Jair Bolsonaro (PSL) durante as eleições. 

Ele defende a decisão. 

Eleito em sua primeira disputa, com 71% dos votos, o governador pretende cortar cerca de 900 cargos comissionados, além de isenções fiscais, e diz que a condição de novato o favorece na hora de governar. 

“Só tem governabilidade aquele que não tem amarra”, declarou. 
 

 

O sr. foi eleito numa campanha meteórica, com uma votação recorde de 71%. Mas tem enfrentado um início de governo um tanto turbulento, com crise partidária e exonerações. Como avalia esses primeiros dias?

Na verdade, eu não sinto essa turbulência; ela não nos alcança. O que tem acontecido no governo é exatamente o que a gente programou. Desde a transição, fizemos uma imersão aqui no estado.

E, dentro da proposta de campanha, que era o enxugamento da máquina pública, tudo aconteceu exatamente como havíamos programado. Eu mantive essa linha, independentemente do que o partido, as pessoas ou a imprensa pensavam. [Foi] um fechamento, para que eu pudesse tomar as decisões de forma isenta. Fizemos um primeiro escalão absolutamente técnico. 

Até hoje, eu não consigo ver a turbulência. O que a gente ouve é o barulhinho na imprensa, as pessoas entendendo de um jeito ou de outro, falando do partido. A rede social possibilita essa turbulência. Às vezes as pessoas acham que estão fazendo muito barulho, mas isso nem chega até mim. 

O sr. diz que o barulhinho não o alcança, mas pelo menos duas nomeações suas acabaram questionadas pela militância e por deputados, por posicionamentos político-partidários contrários a Bolsonaro, e os nomes foram exonerados. 

Foi uma decisão minha, na verdade. Absolutamente minha. Não houve interferência de deputados; as redes sociais não me pautaram. A definição foi: se tiver que conciliar política com a técnica, que seja então alinhado com os pensamentos de direita, com o nosso partido, que é do Bolsonaro.

Quando isso escapou do nosso crivo, postagens favoráveis a partidos de esquerda, filiações, alinhamentos político-partidários, a gente corrigiu. “Ah, mas é um sujeito bacana, técnico e tal.” Mas nos omitiu essa condição. 

Isso é até um ato de justiça. 71% da população diz: eu não vou votar na esquerda. No mínimo, se não tiver filiação partidária, que tenha os ideais alinhados com o que a gente acredita.

O sr. pediu, em seu discurso de posse, que “se deixassem as disputas políticas e divergências partidárias de lado”. Não é incoerente com a exoneração dessas pessoas?

Absolutamente não. Governo é governo. Vão trabalhar aqueles que a população quis. Na Assembleia, é diferente; o pluripartidarismo é natural. Quando você é eleito com 71% dos votos, com um partido de direita, é natural que você alinhe todas as secretarias com essas ideias. A gente vai ter no governo pessoas que pensem à direita. 

O critério continuará sendo técnico, nesse caso?

Sim, o primeiro critério é o técnico. Eu penso que essa é uma resposta às pessoas. É uma entrega que eu tenho que fazer também, de alinhamento ideológico. Mas nada de extremismos, nem de um lado, nem de outro. 

O desgaste é natural. Eu costumo dizer que tenho 71% de gordura para queimar. E eu estou disposto a queimar toda essa gordura para entregar meus objetivos. 

Eu não tenho posições de extrema-direita, como no caso do [veto ao uso do] nome social [de transexuais e travestis em serviços do governo, tema de projeto de lei que foi vetado nesta semana por Moisés]. A gente vetou porque havia um indicativo técnico. O veto não foi ideológico, foi técnico. 

Outros estados já têm leis semelhantes.

Aí tem que ver o que cada estado fez. Aqui, esbarraria na competência legislativa. Talvez tenham feito lá algo que não era inconstitucional. Por exemplo, eu posso fazer um decreto aqui, amanhã, para que adotem o nome social, de todos. E sou capaz, inclusive, de fazê-lo. 

É algo que o sr. avalia fazer?

Pode ser. Eu vou discutir. 

O PSL de Santa Catarina teve um excelente desempenho nas eleições, mas começou o ano em crise [três dos quatro deputados federais eleitos pediram a destituição da executiva estadual]. Faltou coesão ao partido?

Eu avalio que é uma crise interna, que poderia ter sido resolvida internamente. Faltou um pouco mais de conversa, de diálogo. Alguns [filiados] têm mais experiência política, outros são absolutamente novatos.

Eu sou um novato. Mas acho que isso tudo é crescimento. Nesta semana, eles devem conversar. E da mesma forma como a gente afastou o PSL das discussões sobre o primeiro escalão do governo, a gente afasta essas discussões do governo. Você não pode trazer discussões político-partidárias para o governo. 

Ser novato na política ajuda ou atrapalha?

Ajuda. Porque eu quero fazer diferente do que foi feito até hoje. Teremos um déficit público de R$ 2,5 bilhões até o fim do ano. A solução é gastar menos. A gente vai reduzir a máquina em 922 cargos, com uma economia de R$ 89 milhões por ano. 

Ser novo ajuda, porque você não tem amarras, compromissos. A forma como eu cheguei ao governo me diferencia. Eu nunca me aliei a ninguém, não fiz nenhum acerto político nem trocas. 

Foi procurado para isso?

Eu, particularmente, não. O partido discutiu muito se coligava ou não. Mas a maioria decidiu que não. Ninguém acreditava, mas chegamos [ao governo].

E essa chegada me deixa muito tranquilo para cortar. Bata onde quer que bata, doa onde quer que doa. Não tem ninguém me cobrando, não existe acerto. Eu me sinto com muita governabilidade hoje. Além de reduzir a máquina, pretendemos reduzir as isenções fiscais em R$ 750 milhões. 

O sr. teme desagradar interesses com isso?

Desagradar, nós desagradaremos. É aquele 71% que vamos queimar, para fazer o que se prometeu. Por isso que há governabilidade. É uma maneira diferente de pensar na política: só tem governabilidade aquele que não tem amarra. Tem condição de decidir e não vai ser cobrado. 

Claro que, na questão das isenções fiscais, vai ser uma decisão colegiada. Nos próximos dias, vou criar uma comissão, que vai avaliar os casos e dar mais transparência. Isso nunca foi feito. Vai ser feito agora.

Por isso que eu digo que a gente tem muito mais condição de fazer, de decidir, do que quem tem muita experiência e muito laço político. 

Boa parte dessas decisões depende da aprovação da Assembleia. Como um governador eleito em chapa única, qual sua expectativa sobre o relacionamento com os deputados?

Eu acredito que a Assembleia não vai rejeitar um projeto que diminui a despesa pública, por exemplo. Os deputados representam o anseio da sociedade. 

Qual sua avaliação do governo Bolsonaro até aqui?

O presidente tem feito o que prometeu, da mesma forma como estamos caminhando aqui. Escolheu um governo técnico, boa parte da área militar, inclusive. São colegas. 

Ser militar é uma boa credencial?

É natural; aconteceu conosco também. Temos seis secretários militares. Mas foi um critério técnico. Se é o meu meio, onde eu vivia, eu consigo me lembrar de quem eram os técnicos naquele meio.

É natural que venha do nosso círculo de relacionamento. Não é assim, “militarizar o governo”. São pessoas republicanas, que você conhece, em quem você confia, e que têm capacidade técnica para trabalhar. 

Ele inclusive ouviu os setores sobre os nomes indicados. 

O que achou do decreto que altera a posse de armas?

Era uma promessa do presidente, ainda durante a campanha. Eu costumo comparar o Canadá aos Estados Unidos: onde tem arma, não tem crime. Eu fui aos dois países, passei alguns meses em ambos. Se você pesquisar, ao contrário do que todos dizem, a violência contra pessoas é bem menor nos EUA do que no Canadá. Eu penso que [a posse de armas] dá um sinal para quem vai ser violento de que existem alguns freios. 

Se eu estiver sozinho, numa casa de praia, com minha família, e não puder fazer nada... Eu prefiro estar na condição de fazer alguma resistência, do que entregar a minha família. Isso é o que tem acontecido: as pessoas não têm arma, não oferecem resistência. 

Alguns afirmam que o Estado está terceirizando responsabilidades, ao delegar ao cidadão a tarefa de se defender. 

Não acredito. Existem situações que o Estado jamais vai conseguir impedir ou estar presente. Você usa o cinto de segurança porque o Estado não vai estar ali para segurar o seu peito. São algumas atitudes para que a delinquência não aconteça livremente. 

Qual sua opinião sobre o Escola sem Partido?

Eu já fui professor universitário. Minha mulher foi professora de crianças por 26 anos. O pleito é o seguinte: isenção. Você entrega o conteúdo, mas ideologicamente não pode trabalhar. Você pode selecionar o conteúdo a ser aplicado por faixas etárias, por grau de entendimento. Alguns limites têm que ser colocados. O professor não deveria vender algo [uma ideologia] em sala de aula.

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