Descrição de chapéu Lava Jato

Lava Jato não deve ser um livro interminável, diz novo presidente da OAB

Para Felipe Santa Cruz, há um clima de insegurança jurídica no país com 'investigações sem fim'

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Rio de Janeiro

O novo presidente do Conselho Federal da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil), Felipe Santa Cruz, 46, afirmou que a ininterrupta expectativa por novas fases da Operação Lava Jato gera uma paralisia nos setores público e privado.

Para ele, há um clima de insegurança jurídica no país com “investigações sem fim”. Questionado sobre um possível avanço das apurações sobre o Poder Judiciário, Santa Cruz afirmou que “operações não devem ter finalidade”.

Felipe Santa Cruz, novo presidente nacional da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil)
Felipe Santa Cruz, novo presidente nacional da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) - Livia Sá

“O Judiciário, assim como qualquer outro poder, deve responder pelos seus erros. Não devemos fazer da Lava Jato um livro em fascículos interminável. Para nós é preocupante a paralisia do poder público, um apagão das canetas diante da insegurança jurídica. O país está parado como se estivesse num grande processo de acompanhamento de investigações sem fim”, disse, em entrevista à Folha.

Filho de um desaparecido político na ditadura militar, o presidente da OAB declarou não ter animosidade pessoal com Jair Bolsonaro. O presidente afirmou no passado que Fernando Santa Cruz, militante da Ação Popular, desapareceu bêbado no Carnaval.

“Não tenho nenhum desgaste pessoal com o presidente. Mas não me quedarei em silêncio toda vez que se fizer apologia à tortura e se tentar torcer a história a ponto de se idealizar um regime ditatorial”, afirmou.

 

Quais são seus principais objetivos à frente da OAB? Vamos defender as prerrogativas dos advogados. Nosso projeto maior é aprovar no Congresso uma lei que criminaliza a autoridade que as viola. A OAB também tem de ser a voz da defesa do cidadão, das minorias. A população muitas vezes quer soluções fáceis, e muitas vezes elas não existem na democracia.

Como desempenhar esse papel sob o atual governo Jair Bolsonaro? É natural que um governo com um viés conservador chegue com uma pauta de enfrentamentos. Nosso papel nesse momento é pontuar o que é conquista civilizatória e afirmar o direito das minorias, a defesa do meio ambiente, do manto protetivo do trabalhador, como a Justiça do Trabalho.

É um discurso de uma OAB opositora? O campo da OAB é o Direito, não participa da arena política.

O sr. vê ameaça a alguns desses pontos neste primeiro mês de governo? Não gosto dos momentos em que o estado confunde a religiosidade com sua atuação. Me preocupa algumas declarações do ministro da Educação. Sou pela autonomia universitária. Não me parece acertado dizer que a universidade pertence a uma elite. É uma visão pré-República.

O sr. é filho de um desaparecido político e temos como presidente um defensor da ditadura militar. Como lida com essa questão? Não tenho nenhum desgaste pessoal com o presidente, não o conheço pessoalmente. Mas não me quedarei inerte ou em silêncio toda vez que se fizer apologia à tortura e se tentar torcer a história a ponto de se idealizar um regime ditatorial.

Preocupa o número de militares no governo? Não, é um reencontro do país com a sua normalidade. Não temos porque confundir a participação dos militares com militarismo ou governo de exceção.

Qual sua avaliação sobre o pacote legislativo do ministro Sérgio Moro? Entendo que o governo foi eleito com uma pauta forte de segurança pública. Me preocupa é radicalizar o modelo que já está dando errado. Temos uma situação carcerária dramática. Essa população carcerária é mão de obra abundante para as quadrilhas.

Também me preocupa que se crie com a legítima defesa do agente policial uma ordem para aumentar a letalidade de uma polícia que já é a que mais mata no mundo.

Vejo com bons olhos o cuidado maior com o crime de porte de armas, a busca de se regularizar a questão do caixa dois.

A proposta de execução provisória da pena veio como projeto de lei. Qual sua avaliação? Seria necessária uma PEC, porque a Constituição e a vontade do constituinte é clara dizendo que a prisão é só após o trânsito em julgado.

O fato do entendimento em vigor do STF permitir a prisão em segunda instância não muda isso? O Supremo pode mudar sua interpretação em abril.

Qual sua avaliação sobre a entrada de Moro no governo Bolsonaro? É um profissional que demonstrou ser capaz e habilitado para ser ministro da Justiça. Entendo apenas que é um equívoco histórico. Quando ele entra na arena do Executivo, ainda que com as melhores intenções, é óbvio que autoriza leituras mais duras sobre todo o processo que gerou uma profunda criminalização da classe política.

O Judiciário foi o único Poder ainda não atingido pela Lava Jato. Por quê? O Judiciário, assim como qualquer outro Poder, deve responder pelos seus erros. Os crimes, quando e se praticados, devem ser levados à Justiça. Não devemos fazer da Lava Jato um livro em fascículos interminável. Para nós é preocupante a paralisia do poder público, um apagão das canetas diante da insegurança jurídica. Mais grave ainda a paralisia da iniciativa privada.

O país está parado como se estivesse num grande processo de acompanhamento de investigações sem fim. O país precisa voltar a produzir, ter rotina, e as empresas a gerar riqueza.

Sua chapa para o Conselho Federal foi criticada por ser composta apenas por homens. Sou filho de feminista, casado com outra. Nós temos um provimento para a próxima eleição que dá 50% dos nossos cargos para as mulheres e 30% de nossa diretoria. Estamos avançando rapidamente.

E por que a chapa não incluiu mulheres? Porque nós não tínhamos nenhum quadro político [mulher] com maioria nas regiões. O provimento estava em debate e só foi fechado no ano da eleição, e só aplica à próxima eleição.

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