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Potenciais laranjas receberam R$ 15 mi de verba pública de 14 partidos

Assim como no caso do PSL, candidatas de outras siglas tiveram recursos vultosos e votações pífias

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Salvador e São Paulo

​Candidata a deputada estadual pelo Acre, Sônia de Fátima Silva Alves (DEM) é um fenômeno às avessas. Ela recebeu R$ 279,6 mil para fazer campanha, contratou 72 fornecedores e saiu das urnas com apenas seis votos.

Assim como Sônia, outros candidatos com votações pífias receberam ao menos R$ 15 milhões em dinheiro público dos fundos partidário e eleitoral.

A Folha cruzou dados da Justiça Eleitoral e descobriu 53 candidatos que receberam mais de R$ 100 mil para financiar suas campanhas, mas saíram das urnas com menos de mil votos. Os candidatos pertencem a 14 diferentes partidos, mas com predomínio do Pros, PRB, PR, PSD e MDB.

Lista com nomes de candidatos aptos para eleição no colégio Santo Américo, zona sul de São Paulo. Levantamento da Folha descobriu 53 candidatos que receberam mais de R$ 100 mil para financiar suas campanhas, mas saíram das urnas com menos de mil votos
Lista com nomes de candidatos aptos para eleição no colégio Santo Américo, zona sul de São Paulo. Levantamento da Folha descobriu 53 candidatos que receberam mais de R$ 100 mil para financiar suas campanhas, mas saíram das urnas com menos de mil votos - Bruno Santos - 7.out.2018/Folhapress

Dos 53 candidatos, 49 eram mulheres —o que reforça a suspeita de que as postulantes a cargos eletivos sejam apenas laranjas, como os casos revelados pela Folha nos últimos dias envolvendo o PSL, partido do presidente Jair Bolsonaro.

Isso porque a lei eleitoral obriga que pelo menos 30% dos recursos dos fundos partidário e eleitoral sejam investidos em candidaturas femininas, levando a manobras para atingir a cota, com a criação de postulantes de fachada.

Os casos são semelhantes ao de Maria de Lourdes Paixão, secretária administrativa do PSL de Pernambuco e que recebeu R$ 400 mil para a campanha, mas teve apenas 273 votos, conforme mostrado pela Folha.

A revelação pelo jornal deste caso e de outras candidatas laranjas do PSL também em Minas Gerais provocou uma crise no governo Bolsonaro, com bate-boca e desgaste do ministro Gustavo Bebianno, que presidiu a sigla no ano passado.

A Polícia Federal abriu investigação sobre as suspeitas, e Bolsonaro passou a esperar um pedido de demissão de Bebianno.

O Pros teve 13 candidatas com menos de mil votos que receberam mais de R$ 100 mil. Em quatro destas candidaturas, os recursos vieram do diretório nacional do PT, partido ao qual o Pros aliou-se nacionalmente.

Foi o caso da candidata a deputada Marcele Rebello (Pros-RJ), assessora do deputado federal Felipe Bornier (Pros), atual secretário de Esportes do governo Wilson Witzel (PSC).

Ela recebeu R$ 287,5 mil do diretório nacional do PT e terminou a eleição com 88 votos. Do total recebido, R$ 62,7 mil foram repassados para a Cotton Brasil Publicidade, empresa que presta serviço ao mandato de Felipe Bornier na Câmara.

Em movimento semelhante, a candidata Amanda Novaes (Pros-RJ) recebeu R$ 287,5 mil do PT. Em suas redes sociais, contudo, não fez campanha para si mesma: pediu votos apenas para o deputado Felipe Bornier.

Saiu das urnas com 200 votos. Também receberam recursos do diretório petista Valdilene Diniz (Pros-PE), com repasse de R$ 200 mil e 37 votos, e Tatiane da Mateira (Pros-MS), com R$ 150 mil e 96 votos.

Outras nove candidatas do Pros receberam vultosos recursos do próprio partido que não se refletiram nas urnas. É o caso de Débora Ribeiro (Pros-CE), candidata a deputada estadual e cunhada do deputado federal Vaidon Oliveira (Pros-CE), que recebeu R$ 274 mil para a campanha.

Com o dinheiro, ela contratou 122 pessoas, que receberam entre R$ 300 e R$ 10 mil durante a campanha. Teve apenas 47 votos. Nenhum deles veio de Sobral (CE), cidade onde mora a maioria dos funcionários que Débora supostamente contratou. Em compensação, seu cunhado Vaidon Oliveira teve 3.020 votos na cidade.

Um dos contratados da campanha de Débora foi Jorgelandio Mesquita, dono de uma pizzaria em Sobral. À Folha ele diz que não prestou serviço para nenhuma campanha, mas recebeu o dinheiro de um serviço feito por seu pai, que é motorista.

“Ele fez transporte de eleitores no dia da votação”, afirmou Mesquita, que diz nunca ter ouvido falar na candidatura de Débora Ribeiro.

Situação semelhante aconteceu no Piauí, onde a candidata deputada estadual Tamires Vasconcelos (PR) recebeu R$ 370 mil do fundo eleitoral, gastou 99% dos recursos e saiu das urnas com 44 votos —cada voto custou em média R$ 9.000.

Ela é atendente do Detran na cidade de Regeneração (PI) e revendedora de vasilhas plásticas Tupperware. Não fez campanha em suas redes sociais: enquanto os demais candidatos pediam votos, ela anunciava promoções de jarras e garrafas plásticas em suas redes. Teve apenas cinco votos na própria cidade.

Em contrapartida, o presidente estadual do partido, Fábio Xavier (PR), foi o deputado estadual mais votado em Regeneração, com 2.300 votos.

Em outros estados, candidatas repassaram parte dos milhares de reais que receberam para fornecedores que costumam prestar serviços para deputados que disputavam a reeleição.

Candidata a deputada federal Tida do Brejinho (PSD-AL) recebeu R$ 450 mil e teve 233 votos. Seu segundo maior fornecedor, com repasse de R$ 100 mil, foi Claudemir Lins França, advogado do deputado federal Marx Beltrão (PSD), reeleito com 139 mil votos.

Em outros casos, o dinheiro é diretamente repassado para o candidato mais forte. Sônia de Fátima Silva Alves (DEM), do Acre, repassou 16% do que arrecadou para a campanha do deputado federal Alan Rick (DEM). Ela foi, em 2018, a dona do voto mais caro do Brasil: recebeu R$ 279,6 mil e foi escolhida nas urnas por seis pessoas, ou seja, cada voto custou cerca de R$ 46 mil para os cofres públicos.

Além do repasse a Alan Rick, a candidata contratou 72 fornecedores, a maioria deles pessoas físicas, com repasses que chegam a R$ 10 mil para cada.

Também foram registrados casos de prestadoras de serviços cuja expertise não têm relação com os serviços prestados na campanha.

Adriana Moura (Pros-AM), que recebeu R$ 117 mil do partido e teve 77 votos, contratou a firma de Fátima Santiago de Melo Oliveira, tesoureira do Solidariedade no estado. A empresa, registrada na Receita Federal como de manutenção de computadores, foi contratada para fornecimento de alimentação.

Folha procurou os diretórios nacionais do Pros e PT, que não responderam aos questionamentos sobre os repasses. Os deputados federais Alan Rick (DEM-AC) e Vaidon Oliveira (Pros-CE) também foram procurados, mas não se posicionaram.

O PSD de Alagoas informou que a distribuição dos recursos seguiu critérios legais. Segundo o partido, Tida do Brejinho foi a única mulher candidata a deputada federal e recebeu o equivalente a 30% dos recursos destinados pelo PSD a candidatos no estado.

O presidente do Pros no Rio, Felipe Bornier, não foi localizado pela reportagem nesta quinta-feira (14).

Em nota divulgada nesta sexta-feira (15), o PRB informou que, de acordo com resolução interna do partido, os candidatos é quem são responsáveis pela aplicação correta dos recursos públicos de campanha.

O partido afirmou ainda que acredita na participação da mulher na vida pública, mas defendeu que as decisões que obrigam partidos a aplicar 30% dos recursos em candidaturas femininas devem ser rediscutidas. "Essa obrigatoriedade é um grande desafio porque culturalmente os homens participam mais da vida pública e das disputas eleitorais", disse a nota.

 
Erramos: o texto foi alterado

A candidata a deputada estadual Marisa Rosas (PRB-MA) foi incorretamente identificada como a deputada federal Maria Rosas (PRB-SP) na infografia que acompanha a reportagem "Potenciais laranjas levaram R$ 15 mi de recursos públicos de 14 partidos". O nome e a foto da deputada foram substituídos. 
O quadro também informou incorretamente que Rejane Garopaba (PRB-SC) foi candidata a deputada estadual. Ela concorreu ao cargo federal.  

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