Descrição de chapéu Lava Jato

Ex-presidente Michel Temer é preso pela Lava Jato

Citado como líder de organização criminosa, emedebista é o segundo presidente da República detido após investigação de corrupção

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Brasília e Rio de Janeiro

O ex-presidente da República Michel Temer (MDB) foi preso preventivamente na manhã desta quinta-feira (21) em São Paulo após pedido do juiz Marcelo Bretas, da força-tarefa da Lava Jato no Rio de Janeiro.

A prisão ocorre 79 dias depois de o emedebista deixar a Presidência. Temer, 78, é o segundo presidente a ser preso após investigação na esfera penal —​o primeiro foi Luiz Inácio Lula da Silva.

Vice de Dilma Rousseff (PT), Temer assumiu a Presidência em 2016 após o impeachment da petista e deixou o governo em dezembro como o presidente mais impopular desde o fim do regime militar.

 

Durante a República, outros presidentes foram presos apenas por crimes políticos, em meio a crises e golpes. O caso que mais se aproxima do de Lula e Temer, que tiveram tramitação na esfera judicial, aconteceu há quase 97 ​anos —​trata-se da prisão de Hermes da Fonseca, que chefiou o Executivo federal entre 1910 e 1914. Mas o caso do marechal foi essencialmente político.

Ao detalhar a operação desta quinta-feira, o Ministério Público Federal afirmou que chega a R$ 1,8 bilhão o montante de propinas solicitadas, pagas ou desviadas pelo grupo de Temer, que age há 40 anos, segundo a Procuradoria.

O ex-presidente foi levado à Superintendência da Polícia Federal no Rio, onde foi recebido sob gritos de "ladrão" na noite desta quinta. Mais cedo, Temer disse a um jornalista que sua prisão se tratava de uma "barbaridade". A detenção do emedebista foi antecipada pela TV Globo.

Bretas decidiu enviar Temer ao prédio da PF no Rio para garantir o mesmo tratamento dado a Lula, que cumpre pena na Superintendência da Polícia Federal em Curitiba desde abril de 2018, condenado por corrupção passiva e lavagem de dinheiro.

O juiz Bretas, em seu pedido, justificou que a prisão preventiva (por prazo indeterminado) de Temer se deu para evitar a destruição de provas e garantir a ordem pública.

Além de Temer, a Lava Jato pediu à Justiça Federal a prisão preventiva de mais sete pessoas, entre elas o ex-ministro Moreira Franco e o coronel João Baptista Lima Filho, amigo do ex-presidente. Outros dois investigados tiveram prisão temporária solicitada.

A investigação, que apura os crimes de corrupção, peculato e lavagem de dinheiro, é um desdobramento das operações Radioatividade, Pripyat e Irmandade, que investigaram desvios na estatal Eletronuclear para a construção da usina de Angra 3.

A prisão de Temer está relacionada com a delação de José Antunes Sobrinho, sócio da empreiteira Engevix. De acordo com ele, Moreira Franco ajudou a viabilizar repasses ilícitos para o MDB na campanha de 2014. Segundo o Ministério Público Federal, a Engevix pagou R$ 1 milhão em propina no fim daquele ano a uma empresa controlada pelo coronel Lima.

A posição hierárquica de vice-presidente e depois presidente permite concluir "que Michel Temer é o líder da organização criminosa a que me referi", escreveu o juiz Bretas no pedido de prisão.

Ao ficar sem mandato, Temer perdeu a prerrogativa de foro perante o STF (Supremo Tribunal Federal), e denúncias contra ele foram mandadas para a Justiça Federal.

Recentemente, o ministro do STF Luis Roberto Barroso deferiu pedido da Procuradoria-Geral da República para que se abram cinco novas investigações sobre Temer, que tramitarão na primeira instância.

A PGR já havia denunciado Temer em dezembro, sob acusação de corrupção passiva e lavagem de dinheiro. A denúncia decorreu de investigação de 2017, na esteira da delação da JBS, sobre supostas irregularidades na edição do Decreto dos Portos, assinado por Temer em maio daquele ano.

Das 5 novas apurações abertas, 3 têm a Argeplan Arquitetura e Engenharia como peça central. A PGR sustenta que a empresa, que aparece na denúncia dos portos como intermediária de propina e que tem como um de seus sócios o coronel João Baptista Lima Filho, pertence de fato a Temer.

Um dos pedidos de abertura de inquérito envolve um contrato de R$ 162 milhões obtido pela Argeplan para executar obras em Angra 3. A concorrência foi vencida pela empresa do coronel Lima em 2012, quando Temer era vice-presidente do governo Dilma.

Ao lado da Argeplan, a empreiteira Engevix também foi subcontratada para a obra.

A procuradora-geral da República, Raquel Dodge, requereu que a apuração desse caso seja feita perante a 7ª Vara Criminal da Justiça Federal no Rio, sob responsabilidade de Bretas, onde outros processos sobre a Eletronuclear já tramitaram.

Carros da Polícia Federal em frente à casa de Michel Temer, no Alto de Pinheiros, zona oeste de São Paulo
Carros da Polícia Federal em frente à casa de Michel Temer, no Alto de Pinheiros, zona oeste de São Paulo - José Marques/Folhapress

Em entrevista coletiva na tarde desta quinta, o procurador José Augusto Vagos afirmou que os alvos da operação forjaram documentos e destruíram provas para dificultar as investigações.

O Ministério Público defende a tese de que os pagamentos de propina ainda são realizados. Segundo o MPF, o destino completo do R$ 1,8 bilhão pago ou prometido em propina à organização criminosa ainda não foi esclarecido.

A defesa de Temer entrou com um pedido de habeas corpus no Tribunal Regional Federal da 2ª Região, no Rio. O advogado Eduardo Carnelós afirmou que "resta evidente a total falta de fundamento para a prisão decretada, a qual serve apenas à exibição do ex-presidente como troféu".

A prisão de Temer ocorre uma semana após a Lava Jato sofrer três derrotas: a suspensão da fundação que seria criada com dinheiro da Petrobras, a decisão do STF de que crimes comuns quando associados a crimes eleitorais podem ser julgados pela Justiça Eleitoral, e o inquérito para investigar ameaças contra ministros do Supremo.

Na manhã desta quinta-feira, em meio à prisão de Temer, o ministro do STF Gilmar Mendes se reuniu com o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), em Brasília. Maia é casado com a enteada de Moreira Franco.

O que pesa contra Temer

Das 5 novas apurações abertas, 3 têm a Argeplan Arquitetura e Engenharia como peça central. A PGR sustenta que a empresa, que aparece na denúncia dos portos como intermediária de propina e que tem como um de seus sócios o coronel João Baptista Lima Filho, pertence de fato a Temer.

Um dos pedidos de abertura de inquérito envolve um contrato milionário da Eletronuclear para a construção da usina de Angra 3 que foi paralisado devido a suspeitas levantadas pela Lava Jato.

O contrato, de R$ 162 milhões, foi firmado pela multinacional AF Consult, que subcontratou a AF Consult do Brasil, que por sua vez tem a Argeplan em seu quadro societário.

Ao lado da Argeplan, a empreiteira Engevix também foi subcontratada para a obra. Em 2016, um dos donos da Engevix, José Antunes Sobrinho, tentou, sem sucesso, fechar um acordo de delação com o Ministério Público relatando que o coronel Lima cobrou dele R$ 1 milhão para a campanha de Temer em 2014.

Dodge requereu que a apuração desse caso seja feita perante a 7ª Vara Criminal da Justiça Federal no Rio, sob responsabilidade do juiz Marcelo Bretas, onde outros processos sobre a Eletronuclear já tramitaram.

A Argeplan também é suspeita de superfaturar e deixar de prestar serviços para os quais foi contratada pelo Tribunal de Justiça de São Paulo, por meio do consórcio Argeplan/Concremat.

A terceira nova apuração envolve contrato celebrado entre a empresa e a Fibria Celulose, que opera no porto de Santos, com valores em torno de R$ 15,5 milhões. Dodge solicitou que se investigue também, no mesmo procedimento, transações financeiras entre a Construbase Engenharia e a PDA, a outra empresa do coronel Lima.

A Construbase repassou à PDA, de setembro de 2010 a agosto de 2015, R$ 17,7 milhões, por meio de 58 transferências. A empresa do coronel, segundo a Procuradoria, "consta por diversas vezes em relatórios do Coaf [Conselho de Controle de Atividades Financeiras], como responsável por movimentações atípicas".

Na quarta frente de apuração aberta, Dodge apontou suspeitas de que uma das filhas do presidente, Maristela Temer, tenha praticado o crime de lavagem de dinheiro por meio de uma reforma em sua casa, em São Paulo.

Dodge considerou que a suspeita de que a obra tenha sido paga com dinheiro de propina "não guarda intrínseca relação" com o suposto crime de corrupção denunciado no âmbito do inquérito dos portos, e requereu uma investigação específica a ser feita perante a Justiça Federal em São Paulo.

A quinta nova investigação aberta é sobre um suposto contrato fictício assinado a pretexto de prestação de serviços no terminal Pérola, no porto de Santos. A empresa faz parte do grupo Rodrimar.


Novas investigações sobre Temer na primeira instância 

Eletronuclear
O quê: Coronel João Baptista Lima Filho é suspeito de pedir, com anuência de Temer, R$ 1,1 milhão a José Antunes Sobrinho, sócio da Engevix, no contexto de um contrato para a construção da usina de Angra 3
Onde tramita: Justiça Federal no Rio

Reforma
O quê: Maristela, filha do presidente Michel Temer, e outros são suspeitos de lavagem de dinheiro por meio de reforma na casa dela, em São Paulo. Materiais foram pagos em dinheiro vivo por mulher de coronel amigo de Temer
Onde tramita: Justiça Federal em SP

Tribunal paulista
quê: Suspeita de superfaturamento e de serviços não executados pelo consórcio Argeplan/Concremat, contratado por cerca de R$ 100 milhões para realizar obras no Tribunal de Justiça de São Paulo. Para PGR, Argeplan pertence de fato a Temer
Onde tramita: Justiça Federal em SP

Terminal Pérola
quê: Suspeita de contrato fictício, de R$ 375 mil, para prestação de serviço no porto de Santos
Onde tramita: Justiça Federal em Santos (SP)

Construbase e PDA
quê: PDA, uma das empresas do coronel Lima que consta de relatórios de movimentação financeira atípica feitos pelo Coaf, recebeu da Construbase, em 58 transações, R$ 17,7 milhões de 2010 a 2015. Outro contrato suspeito, de R$ 15,5 milhões, é entre Argeplan e Fibria Celulose, que atua no porto de Santos
Onde tramita: Justiça Federal em SP

Investigações que desceram para a primeira instância

Portos
quê: Temer foi denunciado sob acusação de beneficiar empresas do setor portuário em troca de propina
Onde tramita: Passou a tramitar na Justiça Federal do DF em janeiro

Jantar no Jaburu
quê: PF e PGR concluíram que Temer e ministros de seu governo negociaram com a Odebrecht, em um jantarem 2014, R$ 10 milhões em doações ilícitas para o MDB
Onde tramita: Passou para a Justiça Eleitoral em SP

Quadrilhão do MDB
quê: Temer foi denunciado sob acusação de liderar organização criminosa que levou propina de até R$ 587 milhões em troca de favorecer empresas em contratos com Petrobras, Furnas e Caixa
Onde tramita: Justiça Federal no DF

Mala da JBS
quê: Temer é acusado de ser o destinatário final de uma mala com propina de R$ 500 mil e de promessa de R$ 38 milhões em vantagem indevida pela JBS
Onde tramita: Justiça Federal no DF

Quem é Michel Temer

Nascimento
Nasceu em 1940, em Tietê (SP). Formou-se em direito pela USP e foi professor da PUC

Justiça
Em 1981, filiou-se ao PMDB (hoje MDB) e, dois anos depois, assumiu a Procuradoria-Geral do Estado de SP. Foi duas vezes secretário de Segurança Pública de SP

Câmara
Eleito suplente, assumiu como deputado em 1987 e exerceu seis mandatos na Câmara. Foi presidente da Casa três vezes, a última delas entre 2009 e 2010

Vice
Foi eleito vice de Dilma Rousseff (PT) nas eleições de 2010 e 2014

Impeachment
Com o afastamento de Dilma, assumiu a Presidência interinamente em maio de 2016. Tomou posse oficialmente em agosto, após a aprovação do impeachment no Senado

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