Lula pressionou OAS para ajudar ex-assessora da Presidência, afirma delator

Ex-presidente de empreiteira cita cobrança de petista para que empresa de marido de Rosemary Noronha fosse contratada

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São Paulo

​O ex-presidente da OAS Léo Pinheiro disse em seu acordo de delação premiada que foi pressionado pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva para que a construtora baiana contratasse a empresa do marido de Rosemary Noronha, que foi assessora especial do petista e trabalhou com ele durante décadas.

Rosemary Noronha é próxima de Lula desde o fim dos anos 1980. Ela cuidava da conta bancária do petista quando ele era sindicalista e foi chamada por ele para assessorá-lo no PT e no governo federal. Em 2012, ela foi alvo da Operação Porto Seguro, que investigou um esquema de venda de pareceres de órgãos públicos a empresas privadas. Na ocasião, Rosemary era chefe de gabinete da Presidência da República em São Paulo.

De óculos escuros, Rosemary Noronha, ex-assessora do presidente Lula
Rosemary Noronha, ex-assessora do presidente Lula - Jorge Araújo - 3.jun.09/Folhapress

Léo Pinheiro afirmou em sua delação que, em 2012, o executivo Ricardo Flores, então presidente da Previ (fundo de pensão do Banco do Brasil), lhe pediu para que a OAS contratasse a New Talent Construtora, empresa de João Vasconcelos, marido de Rosemary Noronha, para obras da Invepar, empresa controlada pela construtora baiana. A Previ era sócia da OAS na Invepar.

O ex-presidente da OAS disse que repassou a orientação para Carlos Henrique Lemos, então superintendente da empreiteira em São Paulo. A New Talent Construtora foi contratada para as obras de duplicação da rodovia Raposo Tavares, feitas pela Cart (Concessionária Autoestrada Raposo Tavares). A Cart pertence à Invepar, que reúne os investimentos da OAS na área de transportes. Os serviços realmente foram prestados pela New Talent Construtora.

Em 2014, segundo Léo Pinheiro, o presidente do Instituto Lula, Paulo Okamoto, disse a ele que a New Talent havia tido prejuízo no contrato com a OAS e por isso pediu que a construtora desse uma nova oportunidade para a empresa do marido de Rosemary Noronha.

Léo Pinheiro disse, em depoimento, que novamente conversou com o diretor Carlos Henrique Lemos para que a New Talent fosse mais uma vez contratada pela OAS. Mas a contratação demorou.

O ex-presidente da OAS disse que em outubro de 2014, num encontro com Lula e Okamoto no Instituto Lula, ele foi pressionado pelo ex-presidente da República, que teria se mostrado profundamente irritado com a demora na contratação e disse para que esquecessem o pleito.

Carlos Henrique Lemos foi cobrado novamente por Léo Pinheiro, segundo a delação, sobre a nova contratação da New Talent. Em 5 de novembro de 2014, o então presidente da OAS reuniu-se com Rosemary Noronha e João Vasconcelos para garantir que as pendências seriam resolvidas.

Antes do ano chegar ao fim, a New Talent assinou contratos com a companhia baiana para realizar obras num empreendimento de revitalização da favela do Real Parque, na zona sul da capital paulista. A Folha apurou que a New Talent recebeu da OAS mais de R$ 1,8 milhão pelos contratos.

Léo Pinheiro foi preso pela primeira vez em 14 de novembro de 2014, pela Operação Lava Jato. Em abril de 2015, a Segunda Turma do STF (Supremo Tribunal Federal) concedeu a ele prisão domiciliar. O ex-juiz Sergio Moro, no entanto, voltou determinar sua prisão em setembro de 2016, acusando-o de obstrução de Justiça.

Em dezembro de 2018, Léo Pinheiro assinou acordo de delação premiada com a Procuradoria-Geral da República. O acordo espera a homologação do ministro Edson Fachin, responsável pelos processos da Lava Jato no STF (Supremo Tribunal Federal).

O ex-presidente Lula está preso desde abril de 2018 em Curitiba, após ser condenado em segunda instância pelo caso do tríplex de Guarujá (SP).

Na semana passada, em sua primeira na prisão, concedida à Folha e ao El País, o ex-presidente falou sobre Léo Pinheiro, que também o delatou no caso do tríplex

"O Léo [Pinheiro] passou três anos dizendo uma coisa [que o ex-presidente não estava envolvido em irregularidades]. Depois mudou o discurso. Meu advogado perguntou por que ele tinha mudado e ele disse que era orientação do advogado dele. Ele falou que o Lula sabia [da reforma no apartamento paga pela construtora]. Agora, o que está provado? A OAS gastou R$ 6 milhões para pagar funcionários dela para uniformizar o discurso dos funcionários na delação. Como eu posso levar a sério isso?", afirmou.

OUTRO LADO

A defesa de Lula afirmou que não conhece o teor do depoimento e que o petista "não praticou qualquer ato ilícito antes, durante ou após ter deixado o cargo de presidente".

"Depoimentos prestados por delatores não têm qualquer valor probatório segundo a lei e, na prática, têm servido apenas como instrumento de perseguição contra pessoas pré-estabelecidas", disse.

A nota afirma que o depoimento "foi vazado logo após a entrevista por ele concedida" à Folha e ao El País, na última sexta (26), e que não poderia fazer qualquer comentário.

A Folha já vinha obtendo informações sobre este tema da delação antes desta data. 

A defesa de Paulo Okamoto disse que as informações da delação "são aleivosias e invenções que não merecem manifestação".

O advogado Celso Vilardi, que defende Rosemary Noronha, diz que sua cliente não vai se manifestar sobre a delação de Léo Pinheiro.

Ricardo Flores, ex-vice-presidente de Crédito do Banco do Brasil, disse que “desconhece por completo a informação (contida na delação) e ela não procede”.

O advogado José Roberto Leal, que defende Carlos Henrique Lemos, ex-executivo da OAS, coloca em dúvida a delação de Leo Pinheiro. “Eu não confio no que disse esse cidadão. Eu tenho informação de que ele chegou a mudar o depoimento dele. Qual é o correto? O primeiro ou o segundo. Ele é inconfiável”, disse.

​A OAS diz, em nota, que " sua nova gestão tem contribuído com as autoridades competentes e com a Justiça, prestando todos os esclarecimentos que se façam necessários". 

Diz, porém, que "não compete mais" à empresa "acompanhamento de casos que envolvem depoimentos de ex-executivos". "O objetivo da nova gestão é concluir os acordos de leniência e seguir com os negócios de forma ética, transparente e íntegra."

A defesa de Leo Pinheiro não quis comentar o caso.

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