Descrição de chapéu Governo Bolsonaro

Não existe governo ingovernável, diz ACM Neto em reação a Bolsonaro

Prefeito de Salvador faz piada sobre texto compartilhado pelo presidente um dia antes

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Londres

Em palestra neste sábado (18) em Londres, o prefeito de Salvador e presidente nacional do DEM, ACM Neto, disse que "não existe governo ingovernável".

A declaração foi uma reação ao gesto do presidente Jair Bolsonaro (PSL), um dia antes, ao ter compartilhado um texto sobre as dificuldades de seu mandato dizendo que o Brasil “é ingovernável” sem os “conchavos” que ele se recusa a fazer.

A mensagem, distribuída pelo presidente em grupos de WhatsApp dos quais faz parte e atribuída por ele a um autor desconhecido, diz que o mandatário estaria impedido de atuar por não concordar com os interesses das corporações.

"Não existe governo ingovernável", disse ACM Neto. "O povo quer ver compromisso, seriedade e trabalho".

ACM Neto afirmou que seu partido tem "compromisso com avanço das agendas de reformas econômicas e de redução da desigualdade". O DEM comanda a Câmara, o Senado e diferentes pastas do governo.

Segundo o presidente do partido, o objetivo é aprovar medidas para reduzir a desigualdade, "sem viés ideológico, sem radicalismos e sem desperdiçar energia com o que não precisa."

Antonio Carlos Magalhães Neto (ACM Neto), presidente do DEM
Antonio Carlos Magalhães Neto (ACM Neto), presidente do DEM - Pedro Ladeira/Folhapress

Bolsonaro está encurralado por uma relação desgastada com o Congresso, suspeitas que atingem um de seus filhos e manifestações populares contra seu governo. 

O compartilhamento do texto elevou a tensão dentro do governo, entre aliados e representantes de outros Poderes, com interpretações divergentes sobre as intenções do presidente ao endossar a mensagem —publicada no sábado (11) em rede social por um filiado ao Novo-RJ e replicada em outros grupos. ​

No mesmo evento em Londres, o governador do Maranhão, Flavio Dino (PC do B), criticou  o texto compartilhado pelo presidente Jair Bolsonaro. “Quem impede o atual governo de governar é ele próprio, sua incompetência”, disse Dino, na Brazil Forum UK 2019, conferência promovida por estudantes brasileiros da London School of Economics e Universidade Oxford, em Londres.

Segundo Dino, o texto compartilhado por Bolsonaro pede ruptura institucional, ao dizer que corporações não deixam o governo governar. “Nós não vivemos tempos de normalidade democrática no Brasil”, disse, ao lado do senador Major Olímpio, do PSL de SP. “Só digo uma coisa: fora da Constituição de 88 não há solução”. 

Já Major Olímpio afirmou que a interpretação de que o texto compartilhado seria uma apologia a ruptura da ordem democrática é "a interpretação de quem quer apagar incêndio com gasolina". "Esse pessoal quer ver se fica ingovernável mesmo", disse. 

O senador do PSL criticou ACM Neto por esse ter dito "não existe governo ingovernável". "Quando interessa, o DEM é um dos mais fiéis aliados, inclusive cedeu três quadros para serem ministros. Agora, quer que caduque a MP 870 [da reforma administrativa], porque acaba com ministérios", disse. "Quando é conveniente, o DEM está com a gente".

Já o governador do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite (PSDB), fez coro com ACM Neto e Flávio Dino ao criticar o texto compartilhado. "A governabilidade depende da capacidade de governar. O país é governável, mas isso depende da compreensão do governo de que a legitimidade dele é igual à legitimidade dos representantes do parlamento que também foram eleitos", disse.

Na sexta-feira, ao comentar o texto por meio de seu porta-voz, Bolsonaro afirmou que, "infelizmente, os desafios são inúmeros e a mudança na forma de governar não agrada àqueles grupos que no passado se beneficiavam das relações pouco republicanas. Quero contar com a sociedade para juntos revertermos essa situação e colocarmos o País de volta ao trilho do futuro promissor". 

Parte dos auxiliares do presidente no Palácio do Planalto diz que ele se deixa levar por teorias da conspiração espalhadas pelo grupo que segue o escritor Olavo de Carvalho e por influência de seus filhos —o vereador Carlos Bolsonaro (PSC-RJ) já havia exposto conceitos do tipo em rede social.

A mensagem chegou a motivar boatos acerca de eventual renúncia do presidente —alguns aliados viram nela um arcabouço narrativo para uma saída do cargo por culpa de resistências à suposta agenda antiestablishment de Bolsonaro.

Seria, para eles, uma espécie de “cenário Jânio Quadros” no mundo político, segundo o qual Bolsonaro poderia emular o presidente que renunciou em 1961 após oito meses de inação, colocando a culpa em supostas “forças terríveis”.

No Alto Comando do Exército, instância máxima do poder militar brasileiro, circulou um relato segundo o qual Bolsonaro disse a ministros palacianos que poderia renunciar se as dificuldades continuassem.

Segundo um general ouvido, a mensagem desta sexta seria uma sinalização pública do presidente a aliados, mas ele disse não acreditar que por ora isso seja mais do que um “chamado às armas” para os apoiadores numa das piores semanas do governo.

Outro oficial, que conhece Bolsonaro há muitos anos, disse que o presidente está se sentindo exausto pelo volume de crises que se acumula a seu redor, e que via a mensagem como um apelo àqueles que o elegeram.

Um auxiliar direto do presidente, porém, negou tal versão, considerando uma “plantação de militares” interessados em enfraquecer o presidente e seu núcleo duro.

Segundo ele, Bolsonaro só expressou o que sempre disse desde a campanha: que não governaria baseado nos preceitos que levaram a casos de corrupção em outras gestões.

Integrantes do Judiciário e do Legislativo dizem que o presidente recorreu à estratégia do ataque ao Congresso e ao STF (Supremo Tribunal Federal) para tentar “sair das cordas” naquele que é considerado o pior momento de seu governo.

Também viram no gesto dele uma tentativa de “jogar para a plateia” e se eximir da responsabilidade de governar, transferindo para os demais Poderes a causa dos problemas enfrentados pelo país.

A distribuição do texto por Bolsonaro foi revelada pelo jornal O Estado de S. Paulo e confirmada depois pela Folha. Ao compartilhá-lo, o presidente escreveu que ele era “no mínimo interessante” para os que se preocupam em antecipar os fatos, apontando como “leitura obrigatória”.

Colaborou Igor Gielow, de São Paulo

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