Descrição de chapéu Governo Bolsonaro

Moro é aplaudido de pé por empresários em SP e volta a minimizar teor de mensagens

'Tem que pedir para o hacker', ironiza ex-juiz ao falar sobre autenticidade de conversas vazadas

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São Paulo

O ministro Sergio Moro (Justiça) minimizou nesta sexta-feira (5) as reportagens que apresentam trocas de mensagens entre o ex-juiz e os procuradores da Operação Lava Jato e disse que “tem ficado repetitivo” se justificar sobre elas.

O comentário foi feito no mesmo dia em que a revista Veja divulgou novas conversas, cujo conteúdo foi obtido pelo site The Intercept Brasil. A Folha também tem publicado trechos dessas mensagens.

“Eu não tenho mais as mensagens. As mensagens são do aparelho [com o aplicativo] Telegram que eu não uso o aplicativo desde 2017. Informações públicas da empresa são que, após seis meses de inatividade, as mensagens são excluídas”, afirmou Moro no Expert 2019, evento da XP Investimentos.

Questionado se não podia solicitar ao aplicativo que recuperasse esse conteúdo e pôr em prova sua autenticidade, o ministro da Justiça disse que “não é que nem ir na esquina”, já que o Telegram não tem representação no Brasil.

“Meu celular foi hackeado e o hacker se apropriou do aplicativo Telegram no meu lugar, até gerando situações jocosas, com ele interagindo com pessoas fingindo que sou eu. Tem que pedir para o hacker, então”, ironizou, em meio a risos da plateia.

O público, em sua maioria investidores e empresários, recebeu o ministro de pé, sob aplausos, em uma casa de eventos na zona sul de São Paulo. As palmas se repetiram diversas vezes durante a apresentação, que durou cerca de uma hora.

Moro repetiu que “embora respeite a liberdade de imprensa” repudia “que essas mensagens sejam divulgadas com extremo sensacionalismo, fora do contexto, com deturpação do conteúdo, além da possibilidade de adulteração”.

Também falou sobre outros assuntos. Questionado pela jornalista Natuza Nery, que apresentou a participação do ministro no evento, se teve algum senão ao assumir posto no governo Jair Bolsonaro após deixar a Justiça Federal,  Moro disse que “é um desafio diferente” com “alguns momentos de dissabores”.

“Particularmente gostaria que algumas coisas acontecessem com uma velocidade mais rápida.”

Ele citou, por exemplo, o processo legislativo, a mudança de indicadores de violência e a possibilidade de investimentos em segurança e efetivo policial.

À vontade, fez brincadeiras durante a sua apresentação. No momento em que se discutia sobre mudanças na forma de financiamento de campanhas eleitorais, afirmou que à época em que se permitia doações de empresas, as empreiteiras doaram "para Deus e o diabo". Depois se corrigiu.

"Vou ser politicamente correto: quando eu disse Deus e o diabo foi apenas uma metáfora. Na verdade, na política é muito difícil encontrar anjos, até", afirmou o ministro e pausou a fala para um longo riso da plateia.

"Sendo politicamente correto também, mandando recado pro Congresso, isso foi apenas uma piada", acrescentou. "Porque nós vivemos uma era de sensibilidades extremadas."

Ao comentar o caso, o presidente Bolsonaro afirmou nesta sexta que pretende ir com Moro à final da Copa América, neste domingo (7) no Maracanã. “Pretendo domingo não só assistir à final do Brasil com o Peru. Bem como, se for possível e a segurança me permitir, iremos ao gramado. O povo vai dizer se nós estamos certos ou não."

Nos últimos dias, a PF mudou o delegado que investiga eventual ação de hackers no celular de Moro, mas o nome não é revelado pela instituição.

NOVAS MENSAGENS

Em troca de mensagens pelo Telegram divulgadas nesta sexta pela Veja, em 28 de abril de 2016, segundo a revista, os procuradores conversaram sobre um alerta de Moro à força-tarefa. 

Deltan diz à procuradora Laura Tessler que o então juiz o havia chamado a atenção sobre a ausência de uma informação na denúncia contra o lobista Zwi Skornicki, réu da operação e representante da Keppel Fels, estaleiro com contratos suspeitos com a Petrobras.

“Laura no caso do Zwi, Moro disse que tem um depósito em favor do [Eduardo] Musa [da Petrobras] e se for por lapso que não foi incluído ele disse que vai receber amanhã e da tempo. Só é bom avisar ele”, diz.

“Ih, vou ver”, responde a procuradora, segundo a revista.

No dia seguinte a esse diálogo, de acordo com Veja, a Procuradoria em Curitiba incluiu um comprovante de depósito de US$ 80 mil feito por Skornicki a Musa, o então juiz Moro aceitou a denúncia e, na decisão, mencionou o documento que havia pedido. 

Segundo a legislação, é papel do juiz se manter imparcial diante da acusação e da defesa. Juízes que estão de alguma forma comprometidos com uma das partes devem se considerar suspeitos e, portanto, impedidos de julgar a ação. Quando isso acontece, o caso é enviado para outro magistrado.

O artigo 254 do Código de Processo Penal (CPP) afirma que “o juiz dar-se-á por suspeito, e, se não o fizer, poderá ser recusado por qualquer das partes” se "tiver aconselhado qualquer das partes".

Segundo o artigo 564, sentenças proferidas por juízes suspeitos podem ser anuladas.

Na manhã desta sexta-feira, em nota à imprensa, Moro repetiu não reconhecer a autenticidade das mensagens e disse que elas podem ter sido adulteradas total ou parcialmente.

"Não tem o ministro como confirmar ou responder pelo conteúdo de suposta mensagem entre terceiros." 

"De todo modo, caso a Veja tivesse ouvido o ministro ou checado os fatos saberia que a acusação relativa ao depósito de US$ 80 mil, de 7 de novembro de 2011, e que foi incluído no aditamento da denúncia em questão, não foi reconhecido como crime na sentença proferida pelo então juiz em 2 de fevereiro de 2017, sendo ambos absolvidos deste fato."

"A absolvição revela por si só a falsidade da afirmação da existência de conluio entre juiz e procuradores ou de quebra de parcialidade, indicando ainda o caráter fraudulento da suposta mensagem", completa a nota do ministro.

A sentença mostra que Zwi de fato foi absolvido da acusação de fazer transferência internacional para  Eduardo Musa porque não foi encontrado vínculo do repasse com a Petrobras ou a Sete Brasil.

Porém, na época da sentença, um ano após a prisão, o réu já tinha se tornado delator e saído da cadeia devido a acordo de colaboração.

A condenação por esse crime naquele momento teria pouco efeito prático na situação do operador.

No evento em São Paulo, o ministro afirmou que, se tivesse pedido a inclusão de prova e depois absolvido Zwi, "não é nem questão de parcialidade, é questão de esquizofrenia". Nesse momento, também teve que pausar a fala para risos dos presentes.

PARA ENTENDER AS CONVERSAS

O que são Desde 9.jun, o site The Intercept Brasil vem divulgando um pacote de conversas envolvendo procuradores da República em Curitiba e Sergio Moro, na época juiz responsável pelos processos da Lava Jato

Período Os diálogos aconteceram desde 2014 pelo aplicativo Telegram

Fonte O site informou que obteve o material de uma fonte anônima, que procurou a reportagem há cerca de um mês. O vazamento, segundo o Intercept, não está ligado ao ataque ao celular de Moro, em 4.jun

Análise A Folha teve acesso ao material e não detectou nenhum indício de que ele possa ter sido adulterado. Os repórteres, por exemplo, encontraram diversas mensagens que eles próprios trocaram com a força-tarefa nos últimos anos

Conteúdo As mensagens indicam troca de colaboração entre Moro e a força-tarefa da Lava Jato. Segundo a lei, o juiz não pode auxiliar ou aconselhar nenhuma das partes do processo

Defesa Moro afirma ser alvo de um ataque hacker que mira as instituições e que tem como objetivo anular condenações por corrupção. O ex-juiz diz ainda não ter como garantir a veracidade das mensagens (mas também não as nega), refuta a possibilidade de ter feito conluio com o Ministério Público e chama a divulgação das mensagens de sensacionalista

Consequências O vazamento pode levar à anulação de condenações proferidas por Moro, caso haja entendimento que ele era suspeito (comprometido com uma das partes). Isso inclui o julgamento do ex-presidente LulA

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