Descrição de chapéu Previdência

Sob ameaça de expulsão, dissidentes enfrentam partidos por Previdência

Deputados como Tabata Amaral (PDT) e Felipe Rigoni (PSB) votaram contra orientação das siglas

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São Paulo e Brasília

A votação da reforma da Previdência na Câmara dos Deputados, nesta quarta-feira (10), opôs parlamentares e direções partidárias, abrindo caminho para expulsões de dissidentes. Ao menos três siglas que fecharam questão sobre o tema (PDT, PSB e PSDB) terão que lidar com insurgências internas.

No vocabulário de Brasília, o fechamento de questão é quando as legendas determinam que seus representantes no Congresso sigam o que foi acordado pelos órgãos deliberativos dos partidos. PDT e PSB, por exemplo, decidiram votar contra a reforma.

Tabata Amaral (PDT-SP), contudo, deu sim ao projeto apresentado pelo governo Jair Bolsonaro (PSL), mesmo sob um alerta feito pelo presidente da legenda, Carlos Lupi: se incorresse em infidelidade partidária, a deputada poderia até ser expulsa, como reza o estatuto da sigla.

“O sim que eu digo à reforma não é um sim ao governo. E também não é um não a decisões partidárias”, discursou a pedetista em vídeo nas redes sociais na tarde de quarta.

A deputada Tabata Amaral (PDT-SP) no plenário da Câmara dos Deputados durante sessão sobre a reforma da Previdência - Pedro Ladeira/Folhapress

"Ser de esquerda não pode significar que vamos ser contra um projeto que de fato pode tornar o Brasil mais inclusivo e desenvolvido", declarou Tabata.

Dos 27 deputados do PDT no plenário, 8 foram a favor da reforma. Antes da votação, Lupi afirmou à Folha que não anteciparia qual punição os desobedientes teriam, mas disse tratar-se de um caso grave.

Processo semelhante se desenrolou no PSB, que também fechou questão contra o texto, mas viu surgir um grupo de rebeldes. Dos 32 deputados presentes, 11 deram apoio ao projeto. Principal porta-voz da ala, Felipe Rigoni (ES) disse que correria o risco de ser defenestrado. Por convicção.

“Eu estudei o texto. Ele tem muitos defeitos, mas, no geral, é muito melhor do que pior”, afirma Rigoni. “Eu já falava da reforma da Previdência na campanha. É um compromisso com os meus princípios, e com as evidências”, acrescenta, dizendo que respeita o PSB e quer continuar na sigla, mas não mudaria de opinião.

“Quando o diretório nacional decidiu, foi apenas um voto contra, entre mais de cem membros. E fechamento de questão tem consequência”, lembra o presidente nacional da legenda, Carlos Siqueira.

A consequência está bem clara no código do PSB: descumprir “as resoluções emanadas dos órgãos” da legenda pode resultar em advertência, censura pública, suspensão e expulsão. A palavra final é dada após um processo conduzido pelo conselho de ética.

Tanto Tabata quanto Rigoni são originados do Acredito, um movimento de renovação política criado em 2017 e que sempre se colocou a favor de uma reforma previdenciária. Embora tenha ressalvas ao texto atual, o grupo considera importante avançar no tema.

Caso sejam alvos de processos de expulsão em seus respectivos partidos, os dois têm na manga uma carta que poderá ser usada em sua defesa.

Quando o Acredito fez parcerias para filiar seus quadros, as legendas assinaram documento no qual se comprometiam a respeitar “as autonomias política e de funcionamento” da organização, bem como “a identidade do movimento e de seus representantes”.

Os hoje parlamentares poderiam argumentar que estão exercendo sua independência e que o apoio às mudanças previdenciárias sempre foi bandeira deles.

No caso do PSDB, partido do relator da reforma, deputado Samuel Moreira (SP), a discordância ocorreu com sinais trocados. Enquanto os tucanos decidiram dar aval à proposta para a Previdência, a deputada Tereza Nelma (AL) votou contra. Foi a única a agir assim.

Nesta quarta, o partido informou que ela avisou o presidente nacional da legenda, Bruno Araújo, sobre a intenção. A resposta foi imediata: o PSDB não vai hesitar em aplicar as sanções previstas no estatuto.

“Há todas as gradações de punição. A única que eu não defendo e que trabalharei contra é a expulsão”, diz Araújo à Folha, sugerindo uma penalidade mais leve.

Apesar das declarações do dirigente, líderes tucanos que acompanham o tema dizem reservadamente que estão sendo avaliadas punições que podem comprometer as pretensões políticas da deputada. Uma das opções: negar legenda para eleições nos próximos anos.

Há ainda casos de partidos que, apesar de terem formalizado uma posição sobre a Previdência, não estão prevendo castigos para quem desrespeitar a decisão. É o caso do PSD. A bancada na Câmara fechou questão em favor da reforma, mas dirigentes afirmam que não haverá penalidade para os 2 (de um total de 36) que não seguiram a orientação.

O próprio PSL de Bolsonaro chegou a enfrentar risco de rebelião. Deputados ligados a agentes de segurança pública vinham pressionando por regras mais brandas para a categoria e, para isso, ameaçavam votar contra a proposta.

Após um acordo, o motim acabou debelado —e os 52 deputados da sigla confirmaram a aprovação do projeto.

Nesta quarta, Delegado Waldir (GO), líder do PSL na Câmara, fez um apelo em plenário às siglas de oposição: “Por favor, não punam os deputados que votarem com o Brasil”. Ele disse ainda que os partidos de centro estarão de portas abertas caso os dissidentes precisem de abrigo.

A obediência ao fechamento de questão faz parte da lógica de fidelidade partidária, que prevê que um político, se eleito por uma legenda, deve se adequar às regras dela.

Para o cientista político Carlos Melo, as divergências em torno da Previdência demonstram mais uma falha das direções das siglas do que uma insubordinação dos filiados.

“Na época da eleição, a reforma já estava no debate. Será que os partidos não discutiram com os candidatos? Não se preocuparam com isso na hora de recrutá-los?”, indaga ele, professor do Insper.

O docente afirma ainda que o fechamento de questão pode ser um instrumento democrático, desde que haja debate concreto, sem imposições de caciques.

O mecanismo “não é necessariamente antidemocrático, mas ganha essa característica se não foi precedido de processo de reflexão e participação. Se tudo foi feito às claras, é legítimo, porque partido tem regra mesmo, tem norma”.

Colaborou Thais Arbex, de Brasília

Entenda as regras da fidelidade partidária

Um partido pode punir ou expulsar um parlamentar que não votar de acordo com o que foi definido pela legenda?
Sim, se o parlamentar votar contra as diretrizes partidárias estabelecidas no estatuto da legenda

O que acontece com o parlamentar que...

For expulso?
Não perde o mandato e pode se filiar a outro partido

Sair do partido?
Perde o mandato o parlamentar que decidir deixar o partido por conta própria, sem que a justificativa se enquadre nos critérios definidos pela Justiça Eleitoral como justa causa (incorporação ou fusão do partido, criação de novo partido, mudança substancial ou desvio do programa partidário e discriminação pessoal). Essa regra não vale para senadores

Partidos com deputados que contrariaram orientação da legenda na votação da Previdência

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