Tabata dá nó na lógica da polarização, diz movimento que lançou deputada

Grupo Acredito defende os integrantes filiados ao PDT e ao PSB que correm risco de expulsão após voto pró-Previdência

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São Paulo

A crise em que se meteram os deputados federais Tabata Amaral (PDT-SP) e Felipe Rigoni (PSB-ES), dois dos parlamentares que contrariaram seus partidos e votaram a favor da reforma da Previdência, tem um componente fora do Congresso.

Ameaçados de expulsão, ambos fazem parte de um mesmo movimento, o Acredito, fundado em 2017 com a bandeira da renovação política. A ligação externa dos dissidentes adicionou ao debate ingredientes como combate à polarização política e interferência de grupos independentes em mandatos e siglas.

"A lógica da polarização não está acostumada ao que aconteceu, porque depende de dois extremos para funcionar", diz à Folha Samuel Emílio, 23, coordenador nacional do Acredito. "Isso causa um 'nó' no sistema, porque esses deputados optaram por não serem radicais, não abraçarem um lado ideológico de modo fanático."

Os deputados Tabata Amaral (PDT-SP) e Felipe Rigoni (PSB-ES) em evento do RenovaBR em São Paulo, em maio
Os deputados Tabata Amaral (PDT-SP) e Felipe Rigoni (PSB-ES) em evento do RenovaBR em São Paulo, em maio - Roberto Casimiro - 10.mai.2019/Fotoarena

Tanto PDT quanto PSB tinham fechado questão (ou seja, obrigado a votação) contra a mudança no sistema de aposentadorias, mas, na quarta-feira (10), quando o plenário apreciou o projeto, surpresa: 8 pedetistas (de um total de 27) e 11 pessebistas (entre 32) marcaram sim à proposta.

Outras siglas também tinham orientado o voto de uma determinada forma e registraram defecções, mas os casos de PDT e PSB ganharam projeção pelo alto índice de rebeldes e porque o fechamento de questão implica punição para quem descumprir.

As duas legendas preveem instaurar na semana que vem processos contra os infiéis que podem resultar em penas que variam de advertência até expulsão. Os parlamentares deverão ter direito de defesa.

Se, no fim, a decisão for a de mandar os deputados embora por infidelidade partidária, eles mantêm o mandato e podem ir para outra sigla.

A rejeição à polarização é, ao lado do combate à desigualdade no país, um dos pilares do Acredito, que diz privilegiar a tomada de posições baseada em evidências.

"Para usar o termo do momento, a nossa ideia como movimento não é fechar questão, mas incluir o máximo de pontos de vista para ver em quais pontos a gente concorda o suficiente para avançar", diz Samuel, que é formado em engenharia e não tem experiência na política institucional.

Eleita para seu primeiro mandato após fazer campanha ao lado do presidenciável Ciro Gomes, Tabata desagradou à esquerda por votar a favor da Previdência e naufragou em críticas. Inclusive de Ciro, para quem ela "cometeu um erro indesculpável".

Nesta sexta-feira (12), ele voltou a falar, durante evento em Belo Horizonte, que ficou magoado. Afirmou que Tabata não está no partido correto e que "ela, pessoalmente, deveria ter a dignidade de sair".

A deputada justificou a posição argumentando que o sim à reforma não era "um sim ao governo" Jair Bolsonaro (PSL). Também defendeu emendas que, na opinião dela, tornariam a proposta mais justa e menos prejudicial aos pobres.

Argumento semelhante foi usado por Rigoni para peitar seu partido. "Eu estudei o texto. Ele tem muitos defeitos, mas, no geral, é muito melhor do que pior", afirmou ele, lembrando que já em sua campanha pregava o debate sobre o sistema de aposentadorias.

O Acredito também tinha a Previdência entre os temas prioritários, de forma que, para Samuel, é injusto acusar os dois integrantes de terem errado na escolha do partido.

"Tanto eles [Tabata e Rigoni] sabiam os partidos em que estavam entrando quanto os partidos sabiam quem estavam recebendo", afirma.

Ele avalia ser pouco provável que as siglas concretizem as expulsões, já que "perdem muito se abrir mão de pessoas qualificadas, técnicas".

Para reforçar a pressão, o movimento resgatou as cartas que os partidos assinaram quando toparam filiar participantes do Acredito.

No papel, as siglas prometeram resguardar "as autonomias política e de funcionamento" da organização, bem como "a identidade do movimento e de seus representantes".

Se o argumento poderá ser acolhido, é preciso esperar o desenrolar dos processos nas comissões de ética de cada legenda, o que levará até 45 dias.

Caciques de PDT e PSB, contudo, relativizam o peso do documento e afirmam que, uma vez filiados, os membros passam a estar sujeitos às regras previstas no estatuto e nas leis.

Nas reuniões para debater o imbróglio, líderes do Acredito têm reafirmado respeito aos partidos e nutrem a esperança de que os acordos prevaleçam. Do contrário, na visão deles, as legendas mostrarão que não estavam tão abertas assim à renovação, por recuarem no primeiro impasse.

Os participantes rechaçam rótulos como esquerda e direita e defendem que até a oposição pura e simples ao governo é uma forma de polarização que deve ser evitada, porque interdita o debate saudável.

É uma postura parecida com a de Tabata, que, com um discurso híbrido, rechaça etiquetas —e recebe ataques de vários lados. Para uns, ela é "no muro". Para outros, não é "suficientemente de esquerda".

Procurada, a deputada não concedeu entrevista —ela falou pouco nos últimos dias, e só por meio de redes sociais.

Tabata e Rigoni espelham em seus mandatos ideais do Acredito, que deu suporte a eles na eleição —mas não só, já que ambos já tinham envolvimento com outras organizações e foram também apadrinhados pelo RenovaBR.

As relações suscitaram nesta semana indagações sobre o nível de intromissão de organizações na vida dos partidos.

Afinal, na atividade parlamentar, políticos como Tabata e Rigoni servem mais às legendas ou aos grupos dos quais fazem parte? E quando há posições antagônicas, como na Previdência?

Os dois dizem respeitar os partidos e as instâncias internas. Questionados depois de seus votos, falaram que estudaram muito o tema e viram que o projeto não era o ideal, mas poderiam propor ajustes.

O Acredito criou um gabinete compartilhado no Congresso com assessores que atendem ao mesmo tempo os três membros do grupo eleitos —o terceiro é o senador Alessandro Vieira (Cidadania-SE). A estrutura ajudou a alimentar os parlamentares com informações sobre a Previdência.

O RenovaBR, que também esteve por trás da eleição dos três, não tem pautas específicas. Diz que é suprapartidário e não influencia os mandatos

Renova e Acredito são mantidos com doações de pessoas físicas. O primeiro não se classifica como movimento de renovação política, mas como formador de novos líderes.

O segundo tem características mais orgânicas: uma base de 7.000 voluntários cadastrados em 20 estados e mobilização em torno de causas.

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