Descrição de chapéu Governo Bolsonaro

Bolsonaro condiciona entrevista à publicação de reportagens sobre palestras de jornalistas

Presidente voltou a criticar nesta segunda-feira (26) o Grupo Globo e o comentarista Merval Pereira

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Brasília

O presidente Jair Bolsonaro (PSL) criticou o Grupo Globo nesta segunda-feira (26) e passou a condicionar a concessão de entrevistas à publicação de reportagens sobre palestras dadas por profissionais da empresa.

Ao deixar o Palácio da Alvorada, Bolsonaro disse aos jornalistas que o esperavam que não daria entrevistas porque um pedido feito por ele no sábado (24) não havia sido atendido.

O presidente Bolsonaro fala com jornalistas na entrada do Palácio da Alvorada, em Brasília
O presidente Bolsonaro fala com jornalistas na entrada do Palácio da Alvorada, em Brasília - Antonio Cruz - 22.ago.19/Agência Brasil

No fim de semana, o presidente solicitou aos repórteres que lessem publicação feita por ele nas redes sociais em que criticou o pagamento feito pelo Senac-RJ ao jornalista Merval Pereira, colunista de O Globo e comentarista da Globonews. Bolsonaro declarou que só daria entrevista depois que os veículos publicassem a história.

"Acabei de postar uma matéria sobre o Merval Pereira. Palestra de R$ 375 mil. Tá legal? Tá Ok? 375 pau [sic] uma palestra no Senac. Tá Ok? Faça a matéria. Se vocês não fizerem nenhuma matéria sobre isso nos jornais eu não dou mais entrevista para vocês. Tá legal? Tá combinado? Tem mais nome aí. Só levantei um nomezinho hoje", disse no sábado.

Bolsonaro voltou a falar sobre o assunto na manhã desta segunda-feira (26): "Ninguém publicou nada sobre o Merval Pereira. Eu falei que não ia dar entrevista e não vou dar entrevista. Eu vou falar com vocês, tá ok?, disse.

Ele saiu do Alvorada com um exemplar do jornal O Globo nas mãos e pediu que seus auxiliares transmitissem sua fala ao vivo por meio das redes sociais, enquanto apoiadores o aplaudiam.

"Não sei por que quando é um colega de vocês não sai nada. Então, olha só, Merval Pereira recebeu —ele falou que foi parte disso— mas olha aqui o contrato. R$ 375 mil para palestras. R$ 25 mil cada palestra", afirmou.

Ele citou ainda o nome de outros jornalistas e comentaristas do grupo de comunicação. "Além do Merval Pereira tem Cristiana Lobo, R$ 330 mil, comentarista da Globo. Samy Dana, comentarista do programa conta-corrente da GloboNews. Olha só, presta atenção no contrato. Uma palestra, presta atenção. R$ 284.450,88, tá ok? Giuliana Morrone, R$ 270 mil, como apresentadora do Bom Dia Brasil em Brasília. Mais, Pedro de Moraes Rubim de Aciolly da Costa Doria, R$ 225 mil, colunista dos jornais O Globo e da rádio CBN", afirmou.

"Eu não sei por que, por coincidência, é o pessoal que mais desce o pau em mim. Não encontra nada de bom na minha pessoa. Eu só sou um péssimo. E quando eles estavam ganhando dinheiro aqui não criticavam com a devida justiça os governos anteriores. Ou seja, colunistas importantes que fazem opinião pública recebem dinheiro público para desinformar", disse.

Mais tarde, após uma reunião no Ministério da Economia, Bolsonaro voltou a afirmar que só daria declaração se a imprensa noticiasse o caso das palestras.

O presidente Bolsonaro voltou a dizer que pretende mexer na legislação do BV (Bônus por Volume), comissão paga a agências de publicidade por direcionar anunciantes. "Eu sei que muita gente não sabe o que é BV, não vou explicar aqui que demora muito tempo. A Globo fatura em torno de R$ 9 bilhões por ano em cima disso. Eu não vou tirar de vocês, eu vou distribuir com os demais órgãos de imprensa. Porque não é justo levar em conta uma mentirosa conta que 70% da audiência é da Globo. Não é da Globo. Está em torno de 30%. É injusto o que estão fazendo com o BV", disse.

Os valores das palestras listados por Bolsonaro constam em reportagem de outubro de 2017 publicada pelo site The Intercept Brasil.

O texto tem como base um relatório de auditoria do Senac-RJ, elaborado entre janeiro e fevereiro daquele ano sobre a gestão de Orlando Diniz no órgão.

Segundo a reportagem, o Senac-RJ teria gasto R$ 2,9 milhões com pagamentos feitos a jornalistas em 2016. De acordo com o Intercept, Merval teria sido o que mais recebeu pelas palestras.

Em sua coluna do último domingo (25), o comentarista do Grupo Globo respondeu às críticas do presidente e chamou a afirmação dele de "fake news".

"Em março de 2016, eu e diversos outros jornalistas e economistas fomos contratados para participar do Mapa Estratégico do Comércio, da Fecomércio do Rio. O projeto previa 15 palestras em diversas cidades do Estado do Rio, analisando as perspectivas políticas e econômicas naquele ano de eleições municipais. Os R$ 375 mil de que fala o presidente, portanto, não se referem a uma palestra, mas às 15 previstas para os anos de 2016 e 2017", escreveu.

Merval disse não ter recebido todo o valor programado pois o ciclo foi interrompido. Segundo ele, foram concedidas 13 palestras. "Cada palestra teve a respectiva nota fiscal, incluindo os impostos devidos, e foi declarada no meu Imposto de Renda", afirmou.

O Senac compõe o Sistema S, alvo de diversas críticas de Bolsonaro e de seu ministro da Economia, Paulo Guedes.

Hoje com 11 entidades nacionais, como o Sesi (Serviço Social da Indústria), o Senai (Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial), o Senac (Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial) e o Sebrae (Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas), o sistema foi criado nos anos 1940, sob Getúlio Vargas, para a capacitação de mão de obra a ser empregada na indústria e no comércio. A maior parte de suas receitas (67%) provém de contribuições de empresas sobre a folha de pagamento e que são repassadas às entidades pela Receita Federal. Neste ano, os recursos foram de R$ 17,7 bilhões, um crescimento de 4% em relação ao ano anterior.

Procurado, o Senac-RJ afirmou que os critérios de contratação foram baseados na "capacidade de avaliação do cenário econômico nos anos de 2016 e 2017". "Por serem profissionais com o reconhecido 'Notório Saber', não é necessária licitação. A remuneração dos palestrantes variava entre R$ 15 e R$ 35 mil. Os encontros do Mapa Estratégico do Comércio passaram por diversas regiões do estado, discutindo propostas para o crescimento sustentável do setor, capacitação de mão de obra e melhoria da qualidade de vida da população, em painéis com formadores de opinião", disse a entidade.

A TV Globo informou que não vai se manifestar sobre as declarações.

Procurados, os jornalistas Pedro Doria, Cristiana Lobo e Giuliana Morrone não quiseram comentar o assunto. Já Samy Dana, que não trabalha mais para a Globonews, republicou em rede social um texto de janeiro afirmando que foi o Senac que entrou em contato com ele pelas 14 palestras. “Não fui bater na porta de ninguém”, diz. Ele ressalta que tem mestrado, doutorado, PhD, além de 19 anos de experiência em docência e consultoria.

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