Descrição de chapéu Lava Jato

Saiba quem Palocci delatou à Polícia Federal em 23 etapas de depoimentos

Ex-ministro relata em capítulos pagamentos de propina pelas maiores empresas do país a diversos políticos

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São Paulo

O ex-ministro Antonio Palocci foi preso em setembro de 2016 em um braço da Operação Lava Jato batizado como Omertà, um termo napolitano que define o código de honra das organizações mafiosas do sul da Itália.

A Lava Jato comparava, assim, os petistas aos mafiosos, que cobravam de seus comparsas silêncio após uma eventual captura. Mais tarde, com a revelação de troca de mensagens de Telegram entre procuradores, obtidas pelo site The Intercept Brasil, a relação ficou explícita.

A expressão aparece num dos diálogos em que procuradores comentam o que eles consideravam fragilidade da delação do ex-ministro. Eles apontam que até o então juiz Sergio Moro usava a palavra omertà para se referir ao silêncio dos petistas.

"Russo [apelido de Moro na força-tarefa] comentou que embora seja difícil provar ele é o único que quebrou a omertà petista", disse o procurador Paulo Roberto Galvão a seus colegas num grupo de mensagens do aplicativo em 25 de setembro daquele ano.

Moro tinha dúvidas sobre as provas apresentadas por Palocci, segundo os diálogos, mas resolveu dar publicidade a trechos da delação na véspera da eleição presidencial de 2018.

O ex-ministro Antonio Palocci, ao ser preso pela Operação Lava Jato
O ex-ministro Antonio Palocci, ao ser preso pela Operação Lava Jato - Rodolfo Buhrer /Reuters

Palocci não conseguiu fechar um acordo delação premiada com a Procuradoria, que justificou falta de provas. Mas a colaboração foi aceita pela Polícia Federal e homologada no Tribunal Regional Federal da 4ª Região.

O ex-ministro saiu da prisão em novembro de 2018. Ficou estipulado que ele pagaria uma multa de R$ 37 milhões à Lava Jato.

O acordo do ex-ministro estava sob segredo de Justiça, mas o resumo do que ele disse aos investigadores veio a público após o ministro Edson Fachin, do STF (Supremo Tribunal Federal), decretar a redistribuição das investigações do que foi revelado por Palocci. Há no documento um pequeno resumo das histórias contadas por ele.

Palocci relata em 23 capítulos pagamentos de propina e negócios ilícitos com as maiores empreiteiras do país, bancos, empresa de seguros, rede de supermercados, mineradora, empresas do setor alimentício.Os beneficiários da propina, segundo o ex-ministro, foram partidos políticos, sobretudo o PT, que expulsou Palocci quando ele negociou delação.

Entenda abaixo os principais pontos relatados por Palocci aos policiais federais da Lava Jato.

PT (capítulo 1) - Palocci dá um panorama geral da organização criminosa que seria integrada pela cúpula do PT (Partido dos Trabalhadores) para cobrar propina de empresas em troca de facilidades com o poder público.

Belo Monte (capítulo 2) - Diz que houve sustentação política para favorecer o consórcio empresarial formado para as obras da Usina Hidrelétrica de Belo Monte. Houve, segundo ele, pagamento de vantagens indevidas a integrantes do PT, do PMDB e ao ex-ministro da Fazenda Delfim Netto.

Galeão (capítulo 3) - Afirma que a Odebrecht pagou propina em troca da concessão das obras do aeroporto do Galeão.

Governo líbio (capítulo 4) - Palocci diz que houve pagamento de cerca de R$ 3,5 milhões, por parte do governo da Líbia (Muammar Kadafi), à campanha presidencial de Lula, em 2002.

Ambev (capítulo 5) - O ex-ministro diz que ele, Lula e Dilma receberam da empresa Ambev pagamento de vantagem indevida em troca de “obstar a majoração tributária (PIS/Cofins) sobre bebidas alcoólicas”.

Camargo Corrêa (capítulo 6) - Cita pagamento indevido de R$ 50 milhões do grupo Camargo Corrêa às campanhas do PT, em 2010, com objetivo de obter auxílio do governo na anulação da Operação Castelo de Areia junto ao STJ. A operação foi anulada pelo tribunal por ter sido iniciada por um denunciante que permaneceu anônimo durante o processo.

Interesses do Grupo Casino (capítulo 7) - O ex-ministro diz que, em defesa do interesse do grupo Casino, o Banco Safra repassou vantagem indevida ao PT para evitar a concessão de empréstimo do BNDES ao processo de fusão do Grupo Pão de Açúcar e Carrefour. Segundo Palocci, o banco deu R$ 2 milhões à campanha à Prefeitura de São Paulo de Fernando Haddad, em 2012, além de R$ 10 milhões à campanha de Dilma Rousseff, em 2014, somados a "diversos repasses ao Instituto Lula".

Conta-corrente da propina (capítulo 8) - Palocci confirma o que havia sido dito na delação da Odebrecht, que havia uma conta-corrente de propina entre a empreiteira e o próprio colaborador.

Safra e Votorantim (capítulo 9) - Cita repasse de vantagem indevida de modo dissimulado, via contas eleitorais do PT, nos pleitos de 2010 e 2014, pelos Grupos Safra e Votorantim e empresa Aracruz para viabilizar a venda da participação de Joseph Safra na empresa Aracruz ao grupo Votorantim

BTG (capítulo 10) - Palocci fala em repasses indevidos pelo Banco BTG Pactual para campanhas presidenciais petistas. Cita R$ 4 milhões sob roupagem de doação eleitoral à campanha de 2006 de Lula, pela suposta atuação do governo na resolução de procedimento disciplinar contra André Esteves, R$ 2 milhões em 2010 à campanha de Dilma Rousseff, em troca da atuação da base governista em prol do banco, e R$ 9,5 milhões em 2014, em troca de informação financeira privilegiada. Relata a criação de um fundo de investimento para gerir os recursos repassados ao PT e repasses indevidos de valores ao grupo liderado pelo deputado federal Eduardo Cunha para que políticos atuassem em favor da compra, pelo BTG Pacutal, da empresa Amil.

Refis da crise (capítulo 11) - Palocci fala que houve repasses ilegais às campanhas do PT, em 2010, em troca da promulgação da MP 470, o chamado Refis da crise. Segundo o ex-ministro, foram repassados R$ 50 milhões pela Odebrecht, R$ 14 milhões, via caixa dois, por Benjamin Steinbruch, e pagamento de contas partidárias por Rubens Ometto.

Caixa dois na campanha de 2010 (capítulo 12) - Palocci indica doações extraoficiais para campanhas petistas de 2010. Por exemplo, R$ 2 milhões pela Camargo Corrêa para Fernando Pimentel, R$ 800 mil pela OAS para Gleisi Hoffmann, R$ 500 mil pela Odebrecht para João Paulo Lima e Silva, R$ 1,5 milhão via caixa dois pela Odebrecht a Tião Viana e R$ 3,2 milhões a Lindbergh Farias.

Parmalat - (capítulo 13) - Fala sobre a liberação de crédito pelo Banco do Brasil ao Grupo Parmalat, no ano de 2008, em troca do pagamento de R$ 100 mil ao próprio Palocci, via contrato fictício celebrado com sua empresa de consultoria Projeto.

Itaú-Unibanco (capítulo 14) - Palocci diz que houve repasse de R$ 4 milhões à campanha de Dilma Rousseff em troca de atuação da base do partido no Congresso em favor do Itaú-Unibanco.

Repasses do Bradesco ao PT (capítulo 15) - Palocci diz que o Bradesco fez repasses ao PT em contrapartida ao apoio do governo na defesa dos interesses do banco, em especial no âmbito do Conselho de Administração da Vale do Rio Doce. Citou que, em 2002, o Bradesco doou R$ 500 mil e a Vale, R$ 160 mil. Em 2006, R$ 3,5 milhões e R$ 7,6 milhões, respectivamente. Em 2010, R$ 9,1 milhões e R$ 10 milhões. Em 2014, R$ 14 milhões e R$ 8 milhões. Palocci diz também que houve repasse, em 2010, à campanha de Dilma Rousseff em troca de informações privilegiadas ao Bradesco, obtidas pelo próprio ex-ministro junto ao Banco Central.

Repasses de Joesley ao PT (capítulo 16) - O delator aponta pagamento de vantagem indevida de Joesley Batista ao PT para garantir sua escolha como parceira da Brasil Seguros. Valores, segundo ele, foram repassados no exterior em conta aberta por Joesley Batista para alocar recursos partidários.

Empresários fazem repasses ao PT por financiamento do BNDES (capítulo 17) - Trata da atuação de Luciano Coutinho, então presidente do BNDES, na solicitação de pagamentos indevidos por parte de empresários com financiamento junto ao banco. O delator fala sobre aportes às campanhas eleitorais do PT em 2010 e 2014.

Fusão Sadia-Perdigão (capítulo 18) - Repasse de R$ 3,6 milhões ao PT, em 2010, por meio de doação oficial, em troca de atuação do governo no processo de fusão da Sadia-Perdigão junto ao Cade.

MP dos Portos (capítulo 19) - Trata da atuação do governo na aprovação na MP 592/2012 (MP dos Portos), convertida na lei 12.815/2013.

Construção de submarinos (capítulo 20) - Diz que a Odebrecht fez repasses de R$ 50 milhões ao PT em prol de projeto de construção de submarinos Prosub.

Negócios da Odebrecht em Angola (capítulo 21) - Cita pagamento de R$ 64 milhões pela Odebrecht ao PT em contrapartida pelo auxílio político concedido ao grupo baiano pela linha de crédito junto ao BNDES para atuação da empresa nos empreendimentos existentes em Angola.

Qualicorp paga ao Instituto Lula (capítulo 22) - O ex-ministro aponta repasses pela Qualicorp ao PT, ao Instituto Lula e à empresa Touchdown, de um dos filhos de Lula, em troca de benefícios concedidos pelo governo no âmbito da ANS.

RBS paga propina a conselheiros do Carf (capítulo 23) - Narra pagamento de vantagens a conselheiros do Carf para obstar processo administrativo fiscal em desfavor da RBS.

OUTRO LADO

PT e Gleisi Hoffmann, presidente do partido - O partido diz que "nada que Antonio Palocci diga sobre o PT e seus dirigentes tem qualquer resquício de credibilidade desde que ele negociou com a Polícia Federal, no âmbito da Lava Jato, um pacote de mentiras para escapar da cadeia e usufruir de dezenas de milhões em valores que haviam sido bloqueados".

Em nota, afirma ainda que a delação dele à PF "foi desmoralizada" até pela força-tarefa de Curitiba, conforme mensagens reveladas pelo The Intercept Brasil, e que o então juiz Sergio Moro também desqualificava alegações de Palocci.

Lula - O ex-presidente Lula diz que "as declarações de Antonio Palocci não têm provas nem credibilidade, são mentiras contadas para a obtenção de benefícios judiciais e financeiros".

"Seu vazamento ilegal serve mais uma vez para fins políticos, como Moro fez nas eleições de 2018. Há histórias implausíveis, e nem os procuradores que negociaram com ele a delação consideram seus relatos críveis, como mostram mensagens reveladas pelo Intercept", afirma.

Dilma Rousseff - A ex-presidente Dilma Rousseff disse que "Antonio Palocci mente mais uma vez". "E, como das outras vezes, sequer apresenta provas ou indícios. É um mentiroso contumaz", afirma.

Delfim Netto - O advogado Ricardo Tosto, que defende Delfim Netto, disse que seu cliente nunca recebeu qualquer valor sem a devida prestação de serviço e esse assunto já foi explicado à Polícia Federal. 

Tião Viana - O ex-senador não foi encontrado pela reportagem para comentar.

Pelo Twitter, ele disse que seu nome foi covardemente colocado "numa mentira decomposta e putrefeita e já apurada pelo STJ, onde fui absolvido por unanimidade e o produto devidamente arquivado".

Fernando Pimentel - A defesa do ex-governador de Minas Gerais Fernando Pimentel, diz que "a história é tão estória que nem o Ministério Público de Curitiba acreditou".

MDB - O partido disse que não vai comentar as acusações.

Odebrecht - A Odebrecht diz que "tem colaborado de forma permanente e eficaz com as autoridades, em busca do pleno esclarecimento de fatos narrados por ex-executivos da empresa".

"São fatos do passado. Hoje, a Odebrecht usa as mais recomendadas normas de conformidade em seus processos internos e segue comprometida com uma atuação ética, íntegra e transparente”, afirma.

RBS - O grupo diz que não vai comentar o caso.

BTG - O banco diz que "repudia a tentativa de vinculação de doações eleitorais feitas inteiramente de acordo com a legislação em vigor, durante os ciclos eleitorais, a qualquer benefício indevido". 

"O BTG Pactual salienta ainda, ao contrário do descrito, que não fez qualquer doação eleitoral no ano de 2006, que jamais gerenciou recursos de qualquer partido político e que tampouco negociou a aquisição da empresa mencionada", afirma.

"Todos os fatos acima são de fácil comprovação pelas autoridades competentes, que contam com a total cooperação do BTG Pactual e seus executivos", completa.

Joesley Batista - O empresário diz que não vai se manifestar.

Ambev - A Ambev afirma que "as alegações relatadas são falsas e incoerentes".

"Falsas porque nunca fizemos pagamentos de qualquer natureza para obtenção de vantagens indevidas. E incoerentes porque, desde 2015, o setor de bebidas sofreu um grande aumento da carga tributária referente a PIS/Cofins, da ordem de 60%, contradizendo tudo o que foi alegado", afirma.

Camargo Corrêa - A empreiteira diz que não vai comentar.

Itaú-Unibanco - O Itaú-Unibanco diz que repudia "a tentativa de vincular doações eleitorais feitas de forma legal a supostas condutas para atender a interesses particulares".

O banco afirma que "não teve acesso à delação, mas que a declaração mencionada é mentirosa".

"Nas eleições de 2006, 2010 e 2014, o banco doou montantes iguais aos candidatos que lideravam as pesquisas de opinião, conforme consta nos registros do TSE, o que deixa claro que não houve privilégio a qualquer um dos partidos. O Itaú Unibanco lamenta que seu nome tenha sido usado indevidamente por um réu confesso que tenta obter vantagens em acordos com a Justiça", diz.

Grupo Pão de Açúcar ​O grupo afirmou que não vai comentar.

Bradesco - O Bradesco diz que as empresas do grupo "realizaram doações eleitorais aos partidos, todas elas públicas e devidamente registradas, conforme consta no site do Tribunal Superior Eleitoral".

"Por isso mesmo, repudiamos quaisquer ilações descabidas formuladas em relação ao fato", diz.

Sadia-Perdigão (Grupo BRF) - O grupo diz que "todas as doações eleitorais que foram realizadas pela BRF em 2010 são públicas e foram devidamente registradas no site do Tribunal Superior Eleitoral, de acordo com a legislação vigente na época".

"A companhia é a principal interessada e colaborará sempre que requisitado pelas autoridades para que quaisquer fatos sejam esclarecidos em toda a sua profundidade e extensão", afirma.

Rubens Ometto - Ele diz que não vai comentar.

Casino - A empresa informou que não vai comentar.

Safra - O banco informou que não vai comentar.

OAS - A OAS diz que "atualmente, conta com uma nova gestão e que esta vem contribuindo com as autoridades competentes e com a Justiça, prestando todos os esclarecimentos que se façam necessários".

"O objetivo da nova gestão é concluir os acordos de leniência e seguir com os negócios de forma ética, transparente e íntegra", afirma.

Votorantim - A Votorantim diz que, "por razão de princípio, não se manifesta sobre vazamentos".

"Se vier a existir investigação sobre os pretensos fatos, será demonstrada a verdade e a inexistência de qualquer ilícito. A Votorantim adota postura apartidária e sempre prezou pela total transparência nos processos de doações eleitorais, seguindo rígida Política Corporativa de Doações Eleitorais", afirma.

Qualicorp - A Qualicorp diz ser uma companhia de capital aberto, com milhares de acionistas nacionais e internacionais, e que todos os seus contratos são auditados por empresas renomadas.

Afirma que sua atividade "é exclusivamente privada e depende da contratação voluntária de cada cliente de plano de saúde".

"A empresa nunca pleiteou ou obteve qualquer tipo de benefício público e jamais transgrediu a lei. A companhia não comentará supostas acusações do ex-ministro, que foram rejeitadas pelo Ministério Público Federal por ausência de base fática", afirma.

Vale A Vale repudia enfaticamente qualquer alegação que procure distorcer suas doações eleitorais ou questionar sua legalidade. As doações sempre foram feitas em estrita observância da legislação e com total transparência, podendo ser conferidas no site do Tribunal Superior Eleitoral (TSE).

Amil -A Amil informa que integridade é um dos principais valores da companhia, guia de toda nossa abordagem sobre como fazemos negócios, incluindo o respeito ao compliance e à ética.

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