Descrição de chapéu Governo Bolsonaro

'Dublês' de ministro general assumem articulação política de Bolsonaro

Na prática, Rogério Marinho e Tarcísio Freitas tocam tarefa do ministro da Secretaria de Governo, general Ramos

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Brasília

Quase três meses depois de o general Luiz Eduardo Ramos ter assumido o cargo de articulador político do governo Jair Bolsonaro (PSL), o Congresso ainda não enxerga no ministro da Secretaria de Governo o papel de intermediário entre as demandas dos parlamentares e o Planalto.

Embora deputados e senadores elogiem a disposição de Ramos para o diálogo e sua habilidade no trato com o Legislativo, a avaliação na Câmara e no Senado é a de que Bolsonaro ainda não deu ao auxiliar a força que ele precisa para avançar nas negociações.

Jair Bolsonaro e o general de Luiz Eduardo Ramos
Jair Bolsonaro e o general Luiz Eduardo Ramos - 03.jul.2019 - Marcos Corrêa/PR

Líderes partidários dizem, em resumo, que a caneta de Ramos não tem tinta suficiente para o tamanho do cargo que ocupa.

Como ele ainda não demonstrou capacidade de dar respostas mais efetivas a pleitos de deputados e senadores, outros personagens do governo acabaram assumindo o papel, como o secretário de Previdência e Trabalho, Rogério Marinho, e o ministro da Infraestrutura, Tarcísio Freitas.

O próprio Ramos tem falado de sua condição em audiências com os congressistas.

Num almoço com a bancada do Republicanos, o antigo PRB, na quarta-feira (18), Ramos falou que, desde que chegou, não conseguiu concretizar nenhuma nomeação das indicações políticas para cargos do governo nos estados.

De acordo com ele, ao dar autonomia aos ministros para montarem suas equipes, Bolsonaro acabou criando uma barreira àqueles que não dialoguem diretamente com os chefes da Esplanada —seja pela ausência de currículo à altura do posto ou simplesmente porque o comandante da pasta rejeita a indicação.

O impasse, segundo a análise de líderes do Congresso, só pode ser resolvido se o presidente baixar uma nova ordem, obrigando os auxiliares a acatarem todos os pedidos que chegarem via Ramos.

Como Bolsonaro não dá sinais de que fará qualquer movimento nesse sentido, a tendência é tudo continuar como está, avaliam congressistas.

Secretário da Previdência, Rogério Marinho
Secretário da Previdência, Rogério Marinho - 26.fev.2019 - Luis Macedo/Câmara dos Deputados

Aprovada a reforma da Previdência na Câmara por larga margem de votos, Rogério Marinho passou a ser reconhecido como uma ponte mais eficaz com o Planalto.

Ele atuou, por exemplo, para que o Ministério da Economia liberasse R$ 600 milhões para destravar obras do PAC (Programa de Aceleração do Crescimento). Em portaria publicada no último dia 2, grande parte desses recursos (R$ 443 milhões) foi destinada ao Minha Casa, Minha Vida.

Assim que o ministro da Economia, Paulo Guedes, confirmou a liberação do montante, o secretário telefonou a líderes da Câmara para comunicar que o dinheiro sairia.

Marinho, no entanto, rejeita o rótulo de articulador político do governo. Segundo aliados, ele prefere atuar discretamente e somente em temas ligados à economia. A expectativa, agora, é a de que abrace as negociações em torno da reforma tributária, que não está ligada à sua secretaria.

No Congresso, o ministro Tarcísio Freitas também passou a ser citado como peça importante nas conversas. Hoje, há quem atribua a ele o papel de “verdadeiro chefe da Casa Civil de Bolsonaro”.

De acordo com relatos feitos à Folha, é também com falta de cerimônia que o general Ramos tem questionado os acordos fechados pelo colega Onyx Lorenzoni (Casa Civil) com o Legislativo.

Ministro da Infraestrutura, Tarcísio Gomes de Freitas
Ministro da Infraestrutura, Tarcísio Gomes de Freitas - Evaristo Sá/AFP

Nos encontros com deputados e senadores, o ministro da Secretaria de Governo tem dito que, nas negociações para a votação da reforma da Previdência na Câmara, Onyx e a líder do governo no Congresso, Joice Hasselmann (PSL-SP), fizeram promessas que são impossíveis de serem honradas.

À Folha, no entanto, Ramos afirmou que “Onyx conduziu brilhantemente” a articulação para que a reforma fosse aprovada na Câmara.

“Como só assumi no dia 4 de julho e não participei das conversas naquele momento, não tenho como avaliar a situação que eles estavam vivendo”, disse, em referência a Onyx e Joice. “Minha preocupação agora é honrar o que foi, republicanamente, acordado com os parlamentares. Tenho feito tudo o que está ao meu alcance.”

À época, o governo se comprometeu a destinar um extra de R$ 40 milhões em emendas parlamentares até 2022 a cada deputado que votasse a favor da nova Previdência.

A proposta, feita por Onyx numa reunião na casa do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), representava um acréscimo de 65% no valor que cada deputado pode manejar no Orçamento federal de 2019 para obras e investimentos de infraestrutura em seus redutos eleitorais.

Hoje, os congressistas têm direito a R$ 15,4 milhões em emendas. Com os R$ 10 milhões extras por ano, esse valor chegaria a R$ 25 milhões.

Os mais céticos e pragmáticos dizem que, num momento de forte aperto fiscal, a promessa de Onyx dificilmente sairá do papel e que, até agora, ela só serviu para deixar Ramos “refém” da pauta do primeiro semestre.

Deputados disseram que, nessa condição, o ministro não consegue avançar no que seria seu principal objetivo: formar uma base para Bolsonaro no Congresso. Segundo essa avaliação, Ramos negocia o futuro sem conseguir honrar os acordos do passado.

Muitos parlamentares reconhecem, no entanto, que a chegada de Ramos, em substituição ao general Carlos Alberto dos Santos Cruz, criou um “ambiente muito melhor” na relação com o Planalto.

Houve até um almoço de boas-vindas ao ministro. O deputado Fábio Ramalho (PMDB-MG) reuniu dezenas de parlamentares de diversas matizes, em seu já tradicional banquete mineiro, no dia 28 de agosto, em torno de Ramos.

O bom trânsito político que o militar construiu quando integrou a assessoria parlamentar do Exército no Congresso é mantido até hoje.

Tanto que uma ala do Legislativo se solidariza com o general e admite que ele está numa condição “um tanto quanto ingrata”, uma vez que Bolsonaro chegou à Presidência rejeitando o chamado presidencialismo de coalizão. Nesse contexto, deputados e senadores não se sentem obrigados a integrar uma base fiel.

Mesmo que o Planalto fizesse um aceno e se mostrasse disposto a retomar o modelo do passado, líderes do Legislativo disseram a Ramos que a proposta seria rejeitada. Hoje, afirmaram, “governo é governo” e “Congresso é Congresso” e, por causa da forma como Bolsonaro faz política, o Parlamento tem se fortalecido e conseguido tocar sua própria pauta.

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