Na reta final à frente da Procuradoria-Geral da República, Raquel Dodge limitou o perímetro de ação de seu sucessor, Augusto Aras, nas pautas de costumes e ambiental —durante o processo de escolha do novo PGR, o presidente Jair Bolsonaro (PSL) disse que o novo chefe do órgão não deveria ser xiita ambiental e que teria de entender que “as leis têm de ser feitas para a maioria”.
O mandato de dois anos de Dodge termina nesta terça-feira (17). O escolhido pelo presidente ainda será sabatinado no Senado na próxima semana. Aras precisa da aprovação do plenário.
Na última semana do mandato, Dodge travou o entendimento da PGR em temas sensíveis ao Planalto em ao menos cinco pareceres e uma ação no STF (Supremo Tribunal Federal).
Entre os assuntos já tratados por Dodge estão, por exemplo, maconha, identidade de gênero, demarcação de terra indígena, cadastro rural e deportação de estrangeiros. O último tópico entrou na mira de Dodge por meio de uma ADPF (ação de descumprimento de preceito fundamental).
O processo, ajuizado na quinta-feira (12), é usado para questionar normas que não são leis. Nesse caso, trata-se de uma portaria do ministro Sérgio Moro (Justiça) sobre deportação sumária de estrangeiros considerados perigosos ou suspeitos de praticar atos contra a Constituição.
A norma foi editada no dia 25 de julho. Segundo Dodge, a portaria viola direitos constitucionais. Moro chegou a ser advertido sobre o teor do texto pela AGU (Advocacia-Geral da União).
Para a procuradora-geral, a medida “fere os princípios da dignidade humana e da igualdade”. Ela afirma que o texto “viola os direitos à ampla defesa, contraditório, devido processo legal e presunção de inocência de estrangeiros”, além de fragilizar “o direito ao acolhimento”.
No dia seguinte, sexta-feira (13), Dodge defendeu em parecer enviado ao STF que a União e a Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) editem normas para o uso da maconha medicinal.
O caso é questionado em uma ação ajuizada pelo Cidadania. Dodge sugere atender parte dos pedidos. Para ela, por exemplo, as sanções da Lei de Drogas e do Código Penal não são incompatíveis com a Constituição.
Na quarta-feira (11), Dodge enviou manifestação na qual afirma que as escolas têm o dever de combater discriminações de gênero, identidade de gênero e orientação sexual. O PSOL questionou a ausência dessas formas de preconceito no PNE (Plano Nacional de Educação). A lei foi aprovada em 2014.
“O não detalhamento dessa específica espécie de discriminação pelo plano nacional tem como efeito, além da possível imposição de silêncio sobre o tema nas escolas, a inércia, quanto ao efetivo combate a atitudes discriminatórias nesse campo”, escreveu Dodge.
No STF, ela ainda deu pareceres a favor de indígenas em marcação de terra, dizendo que não existe marco temporal preestabelecido para a garantia desse direito. Segundo ela, os direitos dos indígenas são originários, e a demarcação, apenas declaratória.
Na área ambiental, Dodge ainda pediu a inconstitucionalidade de uma MP que afrouxou regras para regularização ambiental. Procurado por meio de assessoria, Aras não comentou.
Temas abordados por Dodge e da agenda bolsonarista
No STF
- deportação sumária de estrangeiros
- discriminações de gênero, identidade de gênero e orientação sexual
- demarcação de terra indígena
- regra de regularização rural
- prazo para liberação de maconha medicinal
- inconstitucionalidade de regras para revisão de súmulas na Justiça do Trabalho
- pela condenação de responsáveis por violações de direitos dos avá-guarani na construção da Usina de Itaipu
No STJ
- federalização de investigações sobre mortes e torturas decorrentes de conflitos agrários em RO (direitos humanos)
- federalização de processos sobre chacinas em Nova Brasília (Complexo do Alemão – 1994 e 1995)
Comentários
Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.