Sem julgar mérito, TJ extingue ação que acusava Alckmin e Serra de pedaladas

Sindicatos questionavam aval a negociações de dívidas com prejuízo ao estado

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São Paulo

O Tribunal de Justiça de São Paulo decidiu que um processo contra os ex-governadores tucanos José Serra e Geraldo Alckmin, por suspeita de improbidade, deve ser extinto sem análise do mérito.

Ambos eram réus em ação civil que os acusava de autorizar negociações de dívidas tributárias que resultariam em prejuízo ao estado. 

A operação é considerada uma espécie de pedalada fiscal pelos sindicatos paulistas dos fiscais de renda e dos procuradores do estado, que levaram o caso à Justiça. Além da condenação e da reparação de danos, as entidades pediam que a cessão de créditos dessas dívidas fosse interrompida.

Os ex-governadores de São Paulo Geraldo Alckmin e José Serra, do PSDB - Lalo de Almeida - 15.nov.2014/Folhapress

Atualmente senador, Serra foi governador de São Paulo de 2007 a 2010, sendo sucedido de 2011 a 2018 por Alckmin —que já havia comandado o estado no começo do século. 

O processo corria desde janeiro do ano passado na 14ª Vara da Fazenda Pública de São Paulo.

Em 21 de fevereiro deste ano, o juiz José Eduardo Cordeiro Rocha extinguiu a ação, sob o argumento de que os sindicatos não tinham "legitimidade ou interesse processual".

Ele entendeu que as entidades não podiam apresentar a ação, já que não eram atingidas diretamente pelo caso relatado.

O magistrado não chegou a julgar o mérito da acusação. Além da extinção, também determinou que as entidades de classe pagassem as custas processuais e os honorários advocatícios.

Os sindicatos recorreram à segunda instância. Em acórdão publicado na quarta (18), os desembargadores da 1ª Câmara de Direito Público do TJ mantiveram a extinção do processo.

O desembargador Luiz Francisco Aguilar Cortez, relator do caso, reafirmou que cabe apenas a pessoas jurídicas afetadas (por exemplo, União, estados, Distrito Federal, municípios ou entidades da administração pública indireta) ou ao Ministério Público propor ações de improbidade. 

Em relação aos outros pedidos, de reparação e cessação dos créditos, apontou que, embora o sindicato dos agentes fiscais tenha entre as suas finalidades a defesa dos interesses de seus integrantes, "não se vislumbra que, dentre os 'deveres legais e estatutários' do sindicato, inclua-se a defesa do patrimônio da Fazenda estadual".

Afirmou que as solicitações também fogem ao estatuto do sindicato dos procuradores.

O tribunal, no entanto, aceitou um dos pedidos do recurso. Decidiu que as entidades não devem bancar os honorários advocatícios da ação, porque no entendimento da corte não houve má-fé ao propor a ação.

Além dos ex-governadores, respondiam ao processo ex-secretários da Fazenda, as empresas públicas CPSEC (Companhia Paulista de Securitização) e CPP (Companhia Paulista de Parcerias) e seus respectivos presidentes à época.

A ação extinta

A ação proposta pelos sindicatos relatou supostas irregularidades na cessão onerosa do que o governo chama de direitos creditórios à CPSEC e no posterior repasse desses direitos a investidores.

O processo dizia que os problemas começaram em 2007, quando o governo do estado, ainda sob a gestão Serra, iniciou um programa de parcelamento de dívidas tributárias, como o ICMS, oferecendo vantagens aos devedores. Entre elas, descontos nos juros e nas multas por atrasos.

Já no governo Alckmin, para receber antecipadamente o dinheiro dessas dívidas, o governo negociou direitos creditórios com a CPSEC.

Nessa tratativa, o governo cedia esses créditos com um deságio —redução de preço— de até 50% à CPSEC, que transforma o passivo em debêntures (títulos da dívida).

Os títulos eram obtidos por financiadores, que se beneficiam com os seus rendimentos quando a dívida é quitada —segundo a acusação, o governo se torna garantidor dessa dívida, caso haja inadimplência. O governo nega que haja essa garantia.

Conforme a ação dos sindicatos, os “créditos bons”, cujos contribuintes têm antecedentes de bons pagadores, são repassados ao mercado. Já os “papéis podres”, com alto índice de inadimplência, voltam para o estado.

"Ou seja, pelo crédito tributário bom, aquele que ingressaria normalmente no Caixa do Tesouro, o Estado antecipa seu recebimento com significativo deságio, e ainda se compromete a garantir, até porque é acionista majoritário da CPSEC, o resgate do título no seu vencimento e pagamento dos juros aos investidores, que, em realidade, não assumem risco nenhum adquirindo esses papéis”, dizia o texto da acusação.

“Já pelo crédito ruim, o estado acaba não recebendo absolutamente nada, uma vez que eles não são negociados com investidores.” A ação dizia que a antecipação de receitas pode ser considerada uma operação de crédito, que fere a Lei de Responsabilidade Fiscal.

Também afirmava que o estado usa sua estrutura para cobrar essas dívidas, já que a CPSEC é uma empresa pública.

Mauro Ricardo, que foi secretário do governo Serra, afirmou no período da ação que não houve qualquer irregularidade nas operações, nem que o estado oferece garantia pelos débitos.

“O que a legislação veda é que os estados assumam responsabilidade pelo pagamento, o que não ocorre, e a antecipação de receitas tributárias cujos fatos geradores ainda não ocorreram”, informou.

As emissões de debêntures aconteceram a partir de 2012, nos valores de R$ 600 milhões, R$ 800 milhões e R$ 740 milhões.

Em nota conjunta, Serra e o ex-secretário Mauro Ricardo afirmaram, à época, que não houve antecipação de receita tributária e que o estado não assumiu nenhuma responsabilidade pelo pagamento das dívidas —o risco, disseram, é transferido ao investidor que adquire os títulos.

As operações de securitização de direitos creditórios no mercado financeiro dizem respeito a fatos geradores passados e tributos já constituídos por regular lançamento, diz a nota.

Segundo a nota, os próprios autores da ação não questionaram a constitucionalidade de lei que autorizou a cessão dos créditos tributários, feitas por Serra e aprovada pela Assembleia Legislativa.

Já a assessoria de Alckmin disse, também à época, que negociar os direitos creditórios foi "uma política pública voltada à melhoria da gestão da dívida ativa do estado”.

“Os atos preparatórios dessa política pública foram baseados em consultas formais à Procuradoria-Geral do Estado, que, diferentemente dos autores da ação, não respondem por categorias, sindicatos ou interesses particulares, mas pelos interesses da Fazenda Pública do Estado.” 

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