Trabalho do ombudsman ganha amplitude, mas crescem exigências da profissão

Dentro das organizações, ouvidores enfrentam falta de transparência e acúmulo de funções

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São Paulo

Nos últimos anos, o consumidor ganhou poder e quer mais. Há cobrança cada vez maior por transparência, clareza e responsabilidade por parte das empresas, as redes sociais deram repercussão inédita às queixas e foram criadas leis que tornaram obrigatórias ouvidorias em diversos setores. Como resultado, o trabalho do ouvidor/ombudsman ganhou amplitude e importância.

Segundo profissionais que estão há décadas na carreira, no entanto, o trabalho ficou mais difícil. “Exige-se muito do ouvidor”, afirmou Maria Inês Fornazaro, ex-diretora-executiva do Procon, que preside a Associação Brasileira de Ouvidores e Ombudsman, entidade que reúne 319 profissionais.

Ela participou de debate nesta segunda-feira (23) na Folha ​em comemoração aos 30 anos do cargo de ombudsman do jornal, ao lado de Micheline Vieira, gerente de governança, ética e compliance da Central Nacional Unimed, Marcel Kitamura, ouvidor externo do Banco do Brasil, e Flavia Lima, atual ombudsman da Folha.

Apesar de ser uma área mais compreendida hoje do que há algumas décadas, a ouvidoria ainda não é levada a sério como ferramenta estratégica de gestão, segundo Maria Inês. “O ouvidor tem a função de resolver os problemas dentro da própria casa. Sem ele, a bola de neve nunca diminui.”

Da esq. para a dir. Marcel Kitamura, ouvidor do Banco do Brasil, Maria Inês Fornazaro, presidente da Associação Brasileira de Ouvidores e Ombudsmans, Flavia Lima, ombudsman da Folha, e Micheline Vieira, ouvidora da Unimed
Da esq. para a dir. Marcel Kitamura, ouvidor do Banco do Brasil, Maria Inês Fornazaro, presidente da Associação Brasileira de Ouvidores e Ombudsmans, Flavia Lima, ombudsman da Folha, e Micheline Vieira, ouvidora da Unimed, em debate na sede da Folha - Reinaldo Canato/Folhapress

Tanto a Unimed como o BB venceram o prêmio de ouvidorias da Abrarec (Associação Brasileira de Relações Empresa-Cliente) em 2018.

A ouvidoria ocupada por Micheline Vieira, na Unimed, é uma dessas asseguradas em lei. Segundo regulamentação da Agência Nacional de Saúde, todo plano de saúde deve ter um sistema de ouvidoria.

O desafio de Micheline é esclarecer os limites do serviço oferecido e tentar apontar um caminho para a resolução do problema. “Não basta dizer ‘seu plano não cobre isso’. Na medida do possível, busco uma solução, uma forma de a pessoa ser atendida com um custo mínimo”, afirma.

Para ela, muitas vezes o problema maior é a falta de clareza e de comunicação.

Ouvidor externo do Banco do Brasil, Marcel Kitamura citou a mudança cultural como foco da sua atuação. Desde que assumiu o cargo, as reclamações externas, feitas ao Procon ou ao Banco Central, diminuíram em quase 28%, e as internas aumentaram em 25%. Segundo ele, isso demonstra que o serviço de atendimento ao cliente (SAC) —a primeira instância, no jargão da área— tem sido mais resolutivo.

Kitamura afirma ter zerado as reclamações relacionadas ao débito automático no banco após ter determinado que esse tipo de ferramenta só poderia ser utilizada por prerrogativa do próprio cliente. Sua meta no cargo é resolver todas as reclamações no SAC.

Idealmente, afirmou, o ouvidor deveria ser visto como um consultor na sua organização. “Não estamos em sentidos opostos. Estamos tentando ajudar a área de negócio a valorizar a visão do cliente”, disse. “Deveria ser uma obrigação ter um estágio dentro da ouvidoria.”

No setor público, as obstruções são ainda mais enraizadas. Usando o corte de gastos como justificativa, muitos órgãos públicos obrigam seus ouvidores a responder pedidos feitos via Lei de Acesso à Informação e a acumular a função de controladores, disse Maria Inês, que foi ouvidora do município, da Câmara Municipal e do estado de São Paulo.

Na maioria dos casos, afirmou, as recomendações do ouvidor público são “solenemente ignoradas”. Diferentemente do que acontece em empresas privadas, o ouvidor público raramente tem acesso à autoridade ao qual está subordinado. Para ela, há uma tradição de litígio no país que custa ser quebrada. “O caminho a percorrer é imenso”, resumiu.

O debate foi mediado pela ombudsman da Folha, Flavia Lima, que também deu seu depoimento e respondeu a perguntas da plateia.

“Esse é um trabalho muitas vezes frustrante, porque a gente gostaria de mudar algumas coisas e resolver outras tantas”, disse. “Mas, na medida do possível, temos conseguido alguns objetivos, e o leitor que sugere, critica ou faz algum tipo de reclamação sempre tem retorno.”

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