Brasileiros peregrinam ao Vaticano e se emocionam em canonização de Irmã Dulce

Irmã Dulce foi canonizada pelo papa e se tornou neste domingo (13) a primeira santa brasileira

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Michele Oliveira Lucas Ferraz
Cidade do Vaticano

Bandeiras da Bahia e do Brasil, camisas verde-amarelas e uma animação que sobressaía em relação às demais nacionalidades presentes na missa no Vaticano: os brasileiros, particularmente os baianos, estiveram em peso neste domingo (13) na canonização da agora Santa Dulce dos Pobres.

Muitos dos presentes na praça São Pedro, onde ocorreu a cerimônia, diziam ter convivido de perto com a freira baiana, a primeira santa brasileira, canonizada no terceiro processo mais rápido da história da Igreja Católica —atrás apenas do papa João Paulo 2º e de Madre Teresa de Calcutá.

A soteropolitana Maria Silvana Gonzalez Cal, 58, viajou a Roma por meio de uma agência de viagens de Salvador que organizou um pacote e prometeu destinar parte do dinheiro à seção de oftalmologia do hospital criado pela religiosa em Salvador.

Maria Silvana diz ter conhecido a freira ainda criança. “Minha mãe costumava fazer doações para ela. Eu dançava música espanhola à época e, uma vez, quando ela estava doente, fizemos uma apresentação no quartinho dela."

Ela conta ter superado dois problemas de saúde graças à fé na conterrânea.

“Tive uma leucemia aguda há 21 anos. O médico me deu poucos dias de vida e estou aqui. No meio do tratamento, tive uma infecção por um fungo proveniente dos pombos. O médico que me operou disse que eu ficaria fanhosa. Fiz uma oração especial à Irmã Dulce e não fiquei fanhosa”.

A devota afirmou que fez questão de vir a Roma, acompanhada pelo marido, para homenagear e agradecer tudo o que a santa fez por ela e pela Bahia. “Sua história de vida é tocante. Ela viveu para o outro."

A médica Marília Sentges, 61, também conta ter convivido com Irmã Dulce em Salvador. Foi a religiosa quem assinou pela primeira vez sua carteira de trabalho —quando ela estava ainda na universidade, no quinto ano de medicina.

"Viemos passar uma semana em Roma para acompanhar este momento histórico”, disse. “E também para demonstrar nossa gratidão."

Ela estava com um grupo de baianos que chegou à praça São Pedro às 6h (horário local, 1h em Brasília), quando já havia fila para entrar. A movimentação era grande nas ruas adjacentes ao Vaticano e nas estações do metrô de Roma horas antes do início da cerimônia, quando o dia ainda não havia clareado.

Eles conseguiram um bom lugar na plateia, não muito distante do altar armado onde o papa Francisco celebrou a missa.

As baianas Maria de Oliveira, 29, e Sheila Weber, 42, que faziam parte do grupo, trabalhavam como voluntárias na Obras Sociais Irmã Dulce. Muitos dos presentes no Vaticano tinham alguma ligação com a instituição de caridade criada pela freira.

“É sempre uma comoção tudo relacionado a ela. A festa em Salvador será histórica. Será o maior público da Fonte Nova, maior do que um BaVi [referência ao clássico de futebol Bahia x Vitória]”, comentou Sheila, que assistirá com os amigos, na manhã desta segunda (14), a uma missa em homenagem à santa que será conduzida pelo arcebispo de Salvador, dom Murilo Krieger, numa igreja romana próxima do Vaticano.

Renata Cerqueira, 34, que mora em Lisboa há três anos, é outra que viajou para a Itália exclusivamente para acompanhar a missa de canonização. Ela mostrava no celular, orgulhosa, uma foto abraçada com Irmã Dulce quando criança, em Salvador.

“Minha família é do interior e ainda hoje vai para a capital quando precisa de atendimento médico. Ela é um exemplo, deixou um legado lindo de amar e servir”, comentou. Quando vivia em Salvador, Renata disse que trabalhou por anos, também como voluntária, nas obras de caridade da irmã.

Muitos prepararam uma roupa especial para a ocasião. Foi o caso dos oito integrantes de uma família de Sousa, do interior da Paraíba, devotos da santa, que fizeram uma camisa com o rosto da baiana estampado. Eles também chegaram cedo ao Vaticano para conseguir um lugar na plateia —Roma era o último destino do tour religioso iniciado em Fátima, Portugal. 

Um dos que chamava a atenção entre o público na praça São Pedro era o psicólogo e artista Ubirajara José da Silva, 52, vestido com uma roupa brilhante e chapéu de cangaceiro.

Segundo ele, o figurino foi inspirado na Irmã Dulce após ela aparecer durante um sonho. Ubirajara contava emocionado sua trajetória do bairro de Alagados, em Salvador, até o Vaticano, para a cerimônia deste domingo. 

“Eu era criança e a irmã passava lá recolhendo os desvalidos do bairro. Durante a infância, minha mãe sempre me levava para ver ela. Há 22 anos trabalho no hospital criado pela Dulce, desenvolvendo um trabalho de arte e terapia”, disse. “E pensar que aquele ser pequenino, simples e humilde, agora é nossa santa."

Depois da missa, os grupos que saíam juntos da praça começaram a cantar a música de axé "Baianidade Nagô", sucesso nos anos 1990. "Eu queria que essa fantasia fosse eterna, quem sabe um dia a paz vence a guerra, e viver será só festejar", entoaram, atraindo a atenção dos turistas estrangeiros.

QUEM FOI IRMÃ DULCE

Biografia
Maria Rita de Sousa Brito Lopes Pontes, conhecida como Irmã Dulce, nasceu em 1914, em Salvador. Responsável por construir uma das maiores obras de assistência social gratuita do país, a freira era chamada de “anjo bom da Bahia”. Morreu em 1992, aos 77 anos

Milagres
Irmã Dulce teve dois milagres reconhecidos pelo Vaticano. Em 2001, as orações em seu nome teriam feito cessar uma hemorragia de uma mulher de Sergipe que padeceu durante 18 horas após dar à luz o seu segundo filho. Em 2014, o maestro baiano Jose Maurício Moreira voltou a enxergar após 14 anos de cegueira

Canonização
Neste domingo (13), a freira foi canonizada pelo papa Francisco, em cerimônia realizada no Vaticano. Com isso, se tornou a Santa Dulce dos Pobres, a primeira mulher brasileira a ser declarada santa pela Igreja Católica

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