Em meio a racha no PSL, Eduardo Bolsonaro vê como normal depuração na direita

Na abertura de conferência em SP, deputado e filho do presidente afirmou que falta ao Brasil um partido conservador

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São Paulo

Em meio à disputa no PSL e ameaça de racha no partido, o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSL-SP) disse nesta sexta-feira (11) que a direita brasileira está em um momento de depuração, um processo que ele classificou como normal.

A referência foi feita na entrevista coletiva de abertura da Cpac, conferência conservadora que ocorre em São Paulo.

"Obviamente a gente está passando por um momento de depuração. É normal que haja essa discussão. A esquerda também faz essa discussão, mas de forma reservada. A direita faz publicamente", afirmou.

O filho do presidente Jair Bolsonaro (PSL) não se referiu especificamente aos conflitos dentro do PSL, que vive uma divisão entre o grupo mais alinhado ao presidente nacional do partido, deputado federal Luciano Bivar (PSL-PE), e parlamentares alinhados a Bolsonaro.

O presidente tem dado sinais de que pretende deixar o PSL e chegou a dizer nesta semana que Bivar está "queimado pra caramba".

Eduardo declarou que no Brasil as coisas se inverteram. Em geral, segundo ele, a sociedade primeiro cria uma raiz conservadora forte e só depois elege um presidente dessa linha.

Em uma crítica velada ao PSL, o deputado afirmou que também falta um partido conservador no país.

"Temos um presidente conservador, mas não temos uma grande imprensa conservadora, nem um partido conservador, com bandeiras conservadoras", afirmou.

Segundo o deputado admitiu, a situação realmente tem contornos de um racha, mas ele procurou minimizar a gravidade dessa realidade. "Pode parecer um racha, e às vezes até é. Mas nosso objetivo é atender o Brasil."

A seu lado na mesa de abertura do evento estava Matt Schlapp, presidente da União Conservadora Americana, entidade que organiza a Cpac (Conferência de Ação Política Conservadora) anualmente nos EUA desde 1973.

A presença de Bivar na entrevista havia sido divulgada pela organização do evento, mas ele foi excluído na última quarta-feira (9), em razão do aumento da tensão com o presidente.

É a primeira vez que o evento é trazido ao Brasil. Segundo Schlapp, o movimento conservador tem crescido no mundo, como uma reação a políticas que estão afetando as famílias.

"Não vamos deixar dizerem que há 36 gêneros. Não vamos deixar dizerem que nossos pais fundadores [nos EUA] foram maus ou racistas. Não vamos deixar que haja uma inundação de imigrantes ilegais que quebram nossas leis", afirmou.

De acordo com o americano, essa é uma revolta que muitos estão sentindo em vários países. "E antes que digam que somos globalistas, nós não somos globalistas. Somos internacionalistas", afirmou.

Na entrevista, tomada por militantes bolsonaristas, perguntas sobre temas políticos e que não fizessem parte da Cpac foram barradas pela organização. Houve discretas vaias quando algum profissional da imprensa se apresentava. Eduardo foi ovacionado aos gritos de "mito".

Ao dizer que não havia protocolo na conferência, o filho do presidente pegou a bandeira do Brasil e abraçou. O gesto foi comparado ao do presidente dos EUA, Donald Trump, em edições da Cpac nos EUA, pela comentarista política americana Kassy Dillon, ligada a uma instituição conservadora, em postagem no Twitter.

Em uma das raras vezes que tratou sobre temas da conjuntura, Eduardo Bolsonaro respondeu a comentários do senador Major Olimpio (PSL-SP), de que os filhos do presidente se comportavam como "príncipes".

"Não faço parte da família real", ironizou. Em seguida, disse que assuntos internos do PSL deveriam ser tratados de forma discreta. "É opinião dele [Olimpio], tem todo o direito. No momento que eu estiver atrapalhando, o próprio presidente vai puxar a minha orelha. Roupa suja a gente lava em casa", afirmou.

Eduardo disse ainda que o Cpac não pretende ser uma alternativa ao Foro de São Paulo, colegiado de partidos latino-americanos de esquerda liderado pelo PT e criado em 1990.

"Existe uma distinção muito importante entre o Cpac e o Foro de São Paulo. O Foro visa a chegada ao poder. Nesse evento aqui não, nós vamos trocar ideias e experiências sobre o que é ser conservador. É muito mais sobre identidade do que alguma coisa política para chegar ao poder", declarou.

A Cpac reúne políticos, intelectuais e ativistas de direita. A presença do presidente Bolsonaro era esperada na abertura da conferência, mas ele acabou não participando por questões de agenda.

Para este sábado (12), quando o evento se encerra, são esperadas as presenças dos ministros Ernesto Araújo (Relações Exteriores), Damares Alves (Mulher, Família e Direitos Humanos) e Abraham Weintraub (Educação).

Realizado em um hotel de São Paulo, o evento foi bancado pela União Conservadora Americana e pela fundação ligada ao PSL. O custo não foi divulgado.

Na abertura, o evento ganhou ares de um festival direitista. Youtubers e ativistas digitais conservadores eram tietados por participantes.

Entre os mais paparicados estava Allan dos Santos, do canal Terça Livre, que posava para selfies a todo momento.

Muitos representantes de grupos regionais também faziam lives. Representante do Soberanistas, surgido há cerca de seis meses, o mineiro Dawson Canedo, 35, diz que estava na Cpac porque é preciso preservar as tradições, e não acreditar em ideologias utópicas coletivistas, como nazismo e comunismo.

"Nós não somos avessos a mudanças, mas não a mudança pela mudança. Defendemos as mudanças com critérios", afirmou.

Eduardo instou os bolsonaristas a continuarem ativos nas redes sociais e fez diversas críticas à imprensa.

"O Terça Livre e o Crítica Nacional sofrem ataques de outras imprensas, dizem que são fake news. É o mesmo que vocês sofrem no seu Twitter, no seu Instagram, tomando uma penalidade. Aí você pensa 'não posso falar o que penso' e para de postar. E aí pensam que o Bolsonaro não tem mais apoio", disse o deputado.

Num telão, o deputado ridicularizou jornalistas que, segundo ele, menosprezaram, na campanha do ano passado, as chances eleitorais de seu pai, Jair Bolsonaro.

Entre seus alvos estiveram Guga Chacra (Globo News), Carlos Andreazza (O Globo e Band News), José Maria Trindade (Jovem Pan) e Reinaldo Azevedo (Folha e Band News).

Vídeos de alguns destes jornalistas falando sobre o presidente no ano passado foram exibidos, o que levou a plateia a reagir com vaias e palavras de ordem. Entre os termos gritados estiveram "Globo lixo" e "A nossa bandeira jamais será vermelha".

Numa banca montada no saguão principal do evento, a marca "Camisetas Opressoras" vendia modelos com estampas de Bolsonaro e em homenagem a ícones da direita como o ex-deputado Enéas Carneiro, morto em 2007, e o escritor Olavo de Carvalho.

Um dos modelos mais vendidos tinha a estampa de um cachorrinho que, em vez de fazer cocô, defeca o símbolo do comunismo.

Logo após a plateia entoar gritos de Ustra, em referência ao coronel-símbolo da repressão na ditadura militar, Carlos Alberto Brilhante Ustra, Eduardo afirmou que não houve golpe militar no Brasil.

“A esquerda disse que é ditadura militar mas os militares chegaram ao poder sem dar um tiro, sem matar uma pessoa, eles tinham respaldo popular."

Movimento internacional

Eduardo falou ainda sobre a necessidade de criar um movimento internacional conservador para se contrapor à esquerda, muito mais organizada, na opinião dele. E disse estar conversando sobre o assunto com Matteo Salvini, ex-vice-premiê da Itália.

“A Cpac Brasil é o próprio embrião dessa organização”, disse. “As pessoas que nos corredores vão trocar contatos e vão fazer ‘cpaczinhos’ em seus estados, e assim vai nascendo o movimento."

O deputado afirmou que essa organização não necessariamente está relacionado ao The Movement, movimento criado por Steve Bannon, ex-estrategista do presidente americano, Donald Trump.

Eduardo afirmou que começou a “namorar” o CPAC na Blair House, onde chefes de Estado ficam hospedados em visitas oficiais à Casa Branca, e onde se realizou um evento durante a visita de Bolsonaro a Trump.

“Nos encontramos na Blair House, começou ali um namoro e aqui nasceu casamento —a aliança é da Heloisa, mas hoje estou casando com o Matt”, disse Eduardo.

“Eduardo veio até mim e disse que eles estão construindo a base de um movimento conservador, no governo e na sociedade, e tive que dizer sim”, disse Matt Schlapp, organizador da Cpac americana.

Raio-X da Cpac

O que é
Conservative Political Action Conference, evento conservador americano criado em 1973

Quando
11.out e 12.out, no hotel Transamérica (zona sul de SP)

Organizadores
American Conservative Union e deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP)

Principais convidados

  • Ministro Ernesto Araújo (Relações Exteriores)
  • Ministra Damares Alves (Mulher, Família e Direitos Humanos)
  • Ministro Abraham Weintraub (Educação)
  • Mike Lee (senador dos EUA)
  • Mercedez Schlapp (ex-diretora de Comunicação da Casa Branca)
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