Relatos de milagres de Irmã Dulce vão de cegueira a unha encravada

De acordo com entidade social fundada pela freira, são pelo menos 14 mil ocorrências de graças alcançadas por sua intervenção

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Salvador

Quando o papa Francisco ratificou a canonização de Irmã Dulce neste domingo (13), dois relatos de milagres foram amparados para a sua escalada até a santidade: a interrupção de uma hemorragia em um parto e cura de uma cegueira.
 
Mas o número de relatos de graças alcançadas por intervenção da Irmã Dulce supera a marca de 14 mil, todos devidamente catalogados por uma equipe das Obras Sociais Irmã Dulce.
 
As histórias chegam por cartas, emails e relatos em redes sociais. Muitos delas vêm acompanhados de exames, laudos médicos, fotografias, terços e até desenhos com imagem da freira.

Há de tudo. A maioria dos relatos é sobre questões de saúde: desenganados que sobreviveram, tumores que desapareceram, dores de cabeça crônicas que cessaram, partos de risco que aconteceram com sucesso.
 
Mas também há graças alcançadas sobre os assuntos mais comezinhos. Somente em relatos entre 2017 e 2019, há agradecimentos por emprego conquistado, aposentadoria concedida, casamento reatado e incêndio que foi rapidamente debelado.
 
Uma jovem baiana escreveu numa longa carta agradecendo à Irmã Dulce por ter sobrevivido a uma espinha de peixe que ficou presa em sua garganta enquanto ela saboreava uma moqueca.
 
Outra jurou que uma unha encravada sarou instantaneamente: após rezar no Santuário da Bem-aventurada Dulce dos Pobres, ela tropeçou no altar atingindo justamente dedo machucado, que sarou na mesma hora.
 
Mesmo sem potencial para serem anexadas na causa de canonização, histórias desse tipo ganham as ruas, tomaram rumo próprio e fizeram da freira baiana uma das religiosas mais populares de toda a história do Brasil.
 
Ainda em vida, Irmã Dulce já tinha fama de milagreira. Seu trabalho social em prol dos pobres e doentes a fez ganhar fieis seguidores, que viam na freira espécie de mãe ou representante de Deus na terra.
 
Alguns episódios reforçaram a aura em torno da religiosa. Em 1939, quando ainda trabalhava no ambulatório do Círculo Operário da Bahia, ela recebeu a visita de um adolescente que ardia em febre e lhe pediu: “Irmã, não me deixe morrer na rua”.
 
A freira caminhou com o garroto até uma invasão na Cidade Baixa conhecida como Ilha dos Ratos. Ali, pediu a um transeunte que arrombasse a janela de uma casa abandonada e lá acolheu o jovem doente.
 
Já em 1952, quando um ônibus bateu de frente com um bonde nas proximidades do convento, no Largo de Roma, foi Irmã Dulce quem ajudou a quebrar vidros e resgatar os feridos que ardiam no veículo em chamas.
 
Histórias assim ficaram no imaginário dos baianos e fizeram da freira uma figura popular, não só entre os católicos.
 
“Ela era um ser humano raro. Acolhia a todos, independente de raças e credos. Por isso é tão respeitada, inclusive por pessoas de outras religiões”, afirma Maria Rita Pontes, sobrinha da freira e gestora das Obras Sociais Irmã Dulce.

Depois da morte da freira, em 1992, os relatos de milagres e graças alcançadas se multiplicaram, extrapolando as fronteiras do Brasil. Pedidos de relíquias e relatos de graças passaram a chegar de outros países, inclusive cidades como a longínqua Ho Chi Minh, no Vietnã.
 
A causa da canonização foi iniciada em 2000 e reconhecida pela Santa Sé em 2003. O primeiro degrau foi alcançado em 2009, quando o Vaticano deu à freira o título de Venerável, reconhecendo que ela viveu, em grau heroico, as virtudes da fé, da esperança e da caridade. 

Em 2011, a Igreja Católica anunciou a beatificação da freira, reconhecendo o seu primeiro milagre. O caso aconteceu em 2001, em Sergipe, quando as orações a Irmã Dulce teriam feito cessar uma hemorragia em Claudia Cristina dos Santos, que padeceu durante 18 horas após dar à luz o seu segundo filho.

Em 2019, foi reconhecido o segundo milagre: depois de 14 anos convivendo com uma cegueira causada por um glaucoma, o maestro Jose Maurício Moreira recuperou a visão em 2014.

Com uma grave conjuntivite, ele colocou uma imagem de Irmã Dulce sob os olhos e suplicou que as dores cessassem. No dia seguinte, ao acordar, a nuvem esfumaçada que ele enxergava foi se dissipando e ele voltou a enxergar. Os médicos não encontraram explicação para a cura.

Os relatos de milagres e a confirmação da canonização da primeira santa brasileira fez com que a popularidade da freira explodisse.

Desde abril, quando o milagre foi anunciado, o número de visitantes ao Memorial Irmã Dulce, em Salvador, saltou de 3.000 para 15 mil por mês. A lojinha que vende medalhinhas, terços e camisas com a imagem da freira está sendo ampliada, tamanho é o crescimento da demanda.

Além do potencial para crescimento do turismo religioso, a expectativa é que a figura da futura Santa Dulce dos Pobres se consolide como principal âncora de sua obra social.

A ideia é sua imagem se reverta em recursos para manter as Obras Sociais Irmã Dulce em funcionamento pleno. Fundada há 60 anos, a entidade que faz em média 3,5 milhões de atendimentos anuais, 100% gratuitos.

Diz Maria Rita Pontes: “É impossível separar a figura de sua obra. Para manter viva a sua imagem de Irmã Dulce, a gente precisa manter muito vivo o trabalho dela. Era tudo que ela queria”. 

Quem foi Irmã Dulce

Biografia
Maria Rita de Sousa Brito Lopes Pontes, conhecida como Irmã Dulce, nasceu em 1914, em Salvador. Responsável por construir uma das maiores obras de assistência social gratuita do país, a freira era chamada de “anjo bom da Bahia”. Morreu em 1992, aos 77 anos

Milagres
Irmã Dulce teve dois milagres reconhecidos pelo Vaticano. Em 2001, as orações em seu nome teriam feito cessar uma hemorragia de uma mulher de Sergipe que padeceu durante 18 horas após dar à luz o seu segundo filho. Em 2014, um maestro baiano voltou a enxergar após 14 anos de cegueira

Canonização
Neste domingo (13), a freira foi canonizada pelo papa Francisco, em cerimônia realizada no Vaticano. Com isso, se tornou a Santa Dulce dos Pobres, a primeira mulher brasileira a ser declarada santa pela Igreja Católica

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