Ministro do Turismo nega ameaça de morte e ironiza aparência de acusadora

Envolvido em escândalo de candidaturas de laranjas no PSL, Álvaro Antônio disse que deputada mentiu e que não houve caixa dois na campanha

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Brasília

Na segunda audiência que compareceu no Congresso para responder às acusações de ter montado um esquema de candidaturas laranjas no PSL de Minas Gerais, o ministro do Turismo, Marcelo Álvaro Antônio, foi questionado publicamente nesta quarta-feira (20) sobre a suposta ameaça de morte que teria feito contra a deputada federal Alê Silva (PSL-MG).

Sentada na primeira fileira da Comissão de Defesa dos Direitos da Mulher, a própria deputada se dirigiu diretamente a Álvaro Antônio e reiterou a acusação de que ele, por meio de interlocutores, a ameaçou de morte caso ela o incriminasse no caso das laranjas.

A deputada Alê Silva (PSL - MG) - Najara Araujo-12.abr.19/Câmara dos Deputados

"'Falem com a Alê parar com isso senão eu acabo com a vida dela', o senhor falou isso, o senhor falou isso, ou então tem muita gente mentindo", disse a deputada "A senhora mente", respondeu o ministro.

Ao negar a existência de ameaça de morte, Álvaro Antônio ressaltou que não tem perfil violento e ironizou a aparência física da deputada, afirmando que jamais ameaçaria alguém, "ainda mais uma pessoa que, para mim, já deve estar chegando na terceira idade, pelo menos no aspecto, uma pessoa mais velha" —Alê Silva tem 45 anos e é cinco meses mais jovem que o ministro, que também tem 45 anos.

O ministro do Turismo, Marcelo Álvaro Antônio (PSL)
O ministro do Turismo, Marcelo Álvaro Antônio (PSL) - Pedro Ladeira-22.out.19/Folhapress

"A deputada se aliou à Folha e ao PSOL ultimamente, com um trabalho muito afinado com o PSOL e os partidos de esquerda, nunca ameacei ninguém de morte", disse o ministro. 

Criticado por deputadas da comissão sobre por que falou sobre a idade da parlamentar, afirmou apenas que quis se referir a uma "senhora" e que em nenhum momento agiu de forma pejorativa.

A deputada, que também é aliada do presidente Jair Bolsonaro (sem partido), afirmou que jamais encontrou indícios de que o presidente tenha participado do esquema e afirmou que ele só mantém Álvaro Antônio no cargo por gratidão pessoal, porque o ministro estava em Juiz de Fora (MG) no dia em que o então presidenciável sofreu tentativa de assassinato, em 6 de setembro de 2018, auxiliando no seu socorro.

A Folha revelou, em reportagens publicadas desde fevereiro, que o PSL montou um esquema de candidaturas laranjas em Minas Gerais, comandado à época por Álvaro Antônio, e em Pernambuco, terra do presidente da legenda pela qual Jair Bolsonaro se elegeu, Luciano Bivar.

O ministro do Turismo foi indiciado pela Polícia Federal e denunciado pelo Ministério Público por três crimes.

Em abril, Alê Silva acusou em depoimento à Polícia Federal ter recebido relato de ameaça de morte vinda do ministro, que estaria vislumbrando nela a origem das denúncias que pesam contra ele.

No depoimento aos deputados, Álvaro Antônio voltou a negar a existência de esquema de laranjas e criticou por diversas vezes a Folha, afirmando, em síntese, que o jornal fez um julgamento antecipado de sua conduta, sem elementos para tanto.

Apesar de apontar e citar nominalmente por várias vezes o repórter do jornal presente à audiência, ele não quis responder às perguntas dos jornalistas, ao final da sessão, deixando o local às pressas. A Folha também já ofereceu por diversas vezes espaço para uma entrevista com o ministro ou seus defensores, mas nunca houve resposta.

Conforme mostraram as reportagens, posteriormente corroboradas pelas investigações da PF e do Ministério Público, quatro candidatas do PSL escolhidas por Álvaro Antônio receberam altas quantias de verba pública do partido e tiveram votação ínfima, sinal clássico de campanhas de fachada. Parte desse dinheiro foi parar na conta de empresas ligadas a assessores e ex-assessores do ministro. 

Questionado sobre isso na comissão por deputadas do PSOL, ele não respondeu.

"Houve uma investigação longa e extensa da PF, mais de 80 pessoas ouvidas, buscas e apreensões na sede do partido. Telefone celulares, HDs [apreendidos], não existe um só elemento, um só depoimento que me atribua qualquer procedimento inadequado", discursou Álvaro Antônio.

 

Na verdade, vários depoentes fizeram acusações contra o ministro, incluindo candidatas do PSL, e o então coordenador e assessor de sua campanha no Vale do Rio Doce, Haissander Souza de Paula.

Em um primeiro depoimento à PF,  Haissander disse que com certeza o dinheiro de uma candidata laranja não foi usado por ela e que achava que esses valores foram desviados para campanha de Álvaro Antônio e de Bolsonaro, por meio de caixa dois. Em um segundo depoimento, já em companhia de um advogado, negou o teor do primeiro.

Álvaro Antônio voltou a afirmar que não houve caixa dois —dinheiro de campanha movimentado sem conhecimento da Justiça— em sua campanha ou na de Bolsonaro, que ele coordenou em Minas. Segundo o ministro, a PF induziu Haissander no primeiro depoimento.

Conforme a Folha mostrou, o depoimento de Haissander de Paula e uma planilha apreendida na empresa Viu Midia sugerem que dinheiro do esquema de laranjas pode ter sido desviado, por meio de caixa dois, para a campanha do ministro e de Bolsonaro.

Sobre esse ponto, Álvaro Antônio voltou a criticar a Folha e afirmou que o ombudsman do jornal apontou erro nesta reportagem.

Na verdade, a ombudsman da Folha, Flávia Lima, listou manifestações de leitores que consideraram que a edição da reportagem "valorizou algo de pouco peso", o depoimento em que Haissander diz achar que os valores foram desviados, em detrimento da planilha.

Assim como em sua primeira fala, no Senado, no mês passado, vários aliados do ministro, que é deputado federal licenciado, e integrantes do governo foram à comissão apenas para elogiar o seu desempenho, sem fazer perguntas.

"Apontar o dedo para o senhor é apontar o dedo para a democracia. (...). O seu dolo é o meu dolo, é o dolo do meu presidente, o de insistir que esse país vai dar certo", afirmou Major Fabiana (PSL-RJ). 

Também tecendo vários elogios a Álvaro Antônio, o deputado Vermelho (PSD-PR), afirmou que se houver "investigação a fundo", em todos os partidos poderão ser encontrados laranjas.

Deputadas do PSOL, que é de oposição, foram as que mais questionaram o ministro.

Fernanda Melchionna (PSOL-RS) afirmou que o Turismo se transformou no ministério do laranjal e disse que Bolsonaro tem o costume de criticar bandidos que são inimigos e blindar os que são amigos. "O senhor deve desculpas às mulheres brasileiras. Mas, como para o governo Bolsonaro, bandido amigo é ministro, o senhor fica."

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