Polícia Federal indicia Bivar e três candidatas laranjas do PSL em Pernambuco

Eles são suspeitos de integrar esquema que desviou dinheiro público de campanha do partido que elegeu Bolsonaro

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Brasília

A Polícia Federal indiciou nesta sexta-feira (29) o deputado federal Luciano Bivar (PSL-PE) e três mulheres de Pernambuco por suposta participação em esquema de candidaturas de laranjas para desviar verba pública do partido.

Os quatro foram indiciados sob suspeita dos crimes de falsidade ideológica eleitoral, apropriação indébita de recurso eleitoral e associação criminosa —com penas de 5, 6 e 3 anos de prisão, respectivamente.

A investigação sobre as candidaturas de laranjas da legenda teve início depois de a Folha revelar a existência do esquema em Pernambuco, em uma série de reportagens publicadas desde fevereiro. O jornal também mostrou que a mesma articulação ocorreu em Minas Gerais. 

A PF apurou se o partido cometeu irregularidades na campanha de 2018 ao apresentar candidaturas de mulheres apenas para cumprir a cota mínima obrigatória de 30%.

Apesar de figurarem no topo do ranking das que nacionalmente mais receberam dinheiro do fundo partidário e do fundo eleitoral, as então candidatas de Pernambuco e Minas Gerais tiveram um resultado pífio nas urnas —forte indicativo de que não houve campanha real.

Além de Bivar, foram indiciadas as ex-candidatas Maria de Lourdes Paixão, Érika Santos e Mariana Nunes —todas do PSL.

Procurada, a assessoria de imprensa de Bivar afirmou que a equipe de defesa do deputado ainda não teve acesso aos autos. Por isso, os advogados não vão se pronunciar neste momento. As três candidatas são representadas pela mesma equipe.

Bivar é presidente do PSL, partido pelo qual Jair Bolsonaro foi eleito presidente. Após desgaste causado pelo esquema das candidaturas de fachada, além de outras desavenças internas, Bolsonaro formalizou neste mês sua saída da legenda. 

O presidente chegou a dizer a um apoiador que Bivar estava "queimado para caramba". Agora, Bolsonaro prepara a criação de uma nova sigla, a Aliança Pelo Brasil. 

No esquema de candidaturas de laranjas, secretária de Bivar há cerca de 30 anos, Lourdes Paixão, que oficialmente concorreu a deputada federal e teve apenas 274 votos, foi a terceira maior beneficiada com verba do PSL em todo o país.

A então candidata recebeu mais dinheiro do que o próprio presidente Bolsonaro e a deputada Joice Hasselmann (SP), que foi eleita com 1,079 milhão de votos. Joice é a mulher mais votada da história da Câmara.

Lourdes Paixão, como candidata laranja, recebeu R$ 400 mil de dinheiro público eleitoral a quatro dias da eleição de 2018. Ela declarou ter gasto R$ 380 mil em uma gráfica de fachada. 

Folha visitou os endereços informados pela gráfica na nota fiscal e na Receita Federal e não encontrou sinais de que ela tenha funcionado nesses locais durante a eleição.

De acordo com a prestação de contas da então candidata, ela gastou 95% do total recebido para imprimir 9 milhões de santinhos e cerca de 1,5 milhão de adesivos.

Na quarta-feira (27), o TRE (Tribunal Regional Eleitoral) de Pernambuco reprovou por unanimidade as contas da candidata   determinou a devolução de R$ 380 mil.

O Ministério Público Eleitoral, apesar da apresentação de nota fiscal para comprovar realização das despesas, questionou a veracidade do documento. Segundo os procuradores eleitorais, seria impossível confeccionar e distribuir todo esse material a quatro dias da eleição.

Além disso, o órgão afirmou não haver nenhuma prova de que os adesivos e santinhos tenham sido, de fato, impressos e distribuídos.

Érika Santos, uma assessora do PSL, foi candidata a deputada estadual em Pernambuco e teve apenas 1.315 votos --não se elegeu. Ela recebeu R$ 250 mil para a campanha. 

Já Mariana Nunes, também candidata a deputada estadual, conseguiu 1.741 votos. O partido destinou para ela R$ 128 mil. Nunes gastou R$ 113,9 mil em uma das gráficas investigadas pela Polícia Federal.

Antes do indiciamento, a PF intimou os quatro investigados para depoimentos. Apenas duas investigadas compareceram, Érika Santos e Mariana Nunes. Bivar e Lourdes Paixão não se apresentaram, optando por ficar em silêncio.

A PF concluiu que as três foram candidaturas fictícias. O delegado responsável pelo caso deve terminar nas próximas semanas um relatório para enviar ao Ministério Público, que decidirá se vai oferecer denúncia. Depois disso, caberá à Justiça definir o destino da investigação.

Gustavo Bebianno, ex-presidente interino do PSL, também depôs à PF. Bebianno repetiu aos investigadores o que já vinha dizendo, que, em suma, a decisão sobre as candidaturas nos estados coube exclusivamente aos diretórios regionais. Cabia à Executiva Nacional apenas formalizar o repasse. 

Em fevereiro, ao ser procurado pela Folha para se manifestar sobre o assunto, Bivar repassou a responsabilidade em Bebianno. Depois, porém, em outras entrevistas, voltou atrás e corroborou a versão mantida pelo ex-ministro.

Durante a campanha, Gustavo Bebianno era presidente interino da legenda e coordenador da campanha de Bolsonaro, cujo foco era o discurso da ética e combate à corrupção. 

Bebianno depois foi nomeado ministro da Secretaria-Geral da Presidência e acabou demitido em 18 de fevereiro, em meio ao escândalo das candidaturas de laranjas.

No mês passado, o ministro do Turismo, Marcelo Álvaro Antônio (PSL), que é deputado federal licenciado, também foi indiciado. Ele, que nega as acusações, é suspeito de ter comandado o esquema mineiro. Além de Álvaro Antônio, outras 10 pessoas foram indiciadas.

 

COMO FUNCIONOU O ESQUEMA DO PSL

Qual a origem da suspeita de esquema envolvendo candidatura laranja do PSL?
Folha revelou, em 4.fev, que o ministro do Turismo do governo Bolsonaro, Marcelo Álvaro Antônio (PSL), deputado federal mais votado em MG, patrocinou um esquema de candidaturas de laranjas no estado, abastecidas com verba pública do PSL, em 2018.

Dias depois, em 10.fev, outra reportagem mostrou que o grupo do deputado Luciano Bivar (PSL-PE), presidente nacional da sigla, também criou uma candidata laranja em Pernambuco que recebeu do partido R$ 400 mil de dinheiro público na eleição

Como funcionou o esquema?
Álvaro Antônio era presidente do PSL em Minas e tinha o poder de decidir quais candidaturas seriam lançadas. As quatro candidatas receberam R$ 279 mil de verba pública de campanha da legenda, ficando entre as 20 que mais receberam dinheiro do partido no país inteiro.

No caso pernambucano, o dinheiro do fundo partidário do PSL foi enviado pela direção nacional da sigla para a conta da candidata laranja quatro dias antes da eleição; só dois candidatos receberam mais dinheiro público do PSL Nacional do que ela

Quais as evidências de que as candidaturas eram de laranjas?
Não há sinais de que elas tenham feito campanha efetiva durante a eleição. As candidatas em Minas, juntas, somaram apenas cerca de 2.000 votos. A candidata em PE recebeu 274 votos. 

Em buscas realizadas pela PF em MG no fim de abril, os policiais não encontraram nas gráficas citadas nas prestações de contas nenhum documento que indicasse que elas de fato prestaram os serviços declarados à Justiça Eleitoral; em PE, a Folha não encontrou sinais de que a gráfica usada pela candidata tenha funcionado durante a eleição

O que foi apurado até agora?
A PF afirmou que há indícios concretos de que houve irregularidades na prestação de contas das campanhas e que Álvaro Antônio era a cabeça do grupo que organizou o esquema. A suspeita é que os valores relatados foram desviados para outros candidatos ou para terceiros. Um depoimento e uma planilha obtidos pela PF sugerem que recursos do esquema foram desviados para abastecer, por meio de caixa dois, a campanha de Jair Bolsonaro e a de Álvaro Antônio.

Em PE, a operação buscou esclarecer se houve "burla ao emprego de recursos" de recursos às candidatas mulheres.  A candidata laranja do PSL Maria de Lourdes Paixão, que recebeu R$ 400 mil de verba pública eleitoral a quatro dias da eleição passada e declarou ter gasto R$ 380 mil numa gráfica de fachada, terá que devolver o dinheiro proveniente do fundo partidário, após decisão da Justiça Eleitoral.

Qual a origem da suspeita de caixa dois?
O coordenador da campanha de Álvaro Antônio a deputado federal disse à PF que acha que parte dos valores depositados para as campanhas femininas foi usada para pagar material de campanha do hoje ministro e de Bolsonaro. Em uma planilha há referência ao fornecimento de material eleitoral para a campanha de Bolsonaro com a expressão "out", o que significa, na compreensão de investigadores, pagamento "por fora"

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