Descrição de chapéu Lava Jato

'Réu profissional', Cabral mira delação e almeja liberdade depois de três anos preso

Buscando acordo com a PF, defesa do ex-governador do RJ prepara primeiros habeas corpus

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Rio de Janeiro

O ex-governador Sérgio Cabral completa três anos preso se profissionalizando no papel de réu da Operação Lava Jato. As discussões, os longos discursos e a confissão emocionada têm ficado cada vez mais no passado, dando lugar a falas pensadas, econômicas e negociadas.

Há pouco mais de um ano Cabral negou pela última vez ter recebido propina. De lá para cá, adotou nova estratégia defensiva: confessar os crimes a fim de reduzir penas. Iniciou também tratativas para se tornar delator da Polícia Federal após recusa do Ministério Público Federal, caminho cujo sucesso ainda é incerto.

Réu em 30 ações penais decorrentes da operação e condenado a quase 268 anos de prisão, Cabral sabe que é visto como o estereótipo do político corrupto. Mas as recentes decisões do STF (Supremo Tribunal Federal) acenderam no ex-governador a esperança da liberdade.

Sua defesa prepara para o ano que vem habeas corpus para tentar revogar as três prisões preventivas e uma execução de pena provisória que pesam contra o ex-emedebista.

Será a primeira vez, desde novembro de 2016, quando foi detido na Operação Calicute, que ele apresentará tal pedido.

A primeira medida foi tentar revogar neste mês a prisão decorrente da condenação no TRF-4 (Tribunal Regional Federal da 4ª Região), única em segunda instância contra ele. A Justiça ainda decide qual magistrado é competente para analisá-la —se o de Curitiba ou o do Rio de Janeiro.Os futuros pedidos de

liberdade, contudo, dependem do pronunciamento do STF sobre temas que afetam a Lava Jato.

A decisão sobre o compartilhamento dos dados da UIF (Unidade de Inteligência Financeira) —antigo Coaf—, a ser tomada nesta semana pelo Supremo, é outra que pode interferir no andamento de processos de Cabral.

Falta também a modulação da decisão dos ministros sobre a ordem de apresentação das alegações finais. Os magistrados entenderam que delatores devem protocolá-las antes dos delatados, o que não ocorreu em nenhum processo do ex-governador. O STF ainda vai definir o que fazer com os processos já concluídos.

Enquanto aguarda os próximos passos, Cabral se adapta à nova realidade na cadeia. Ele passou a sentir animosidade de alguns companheiros de cárcere após as confissões.

O clima entre os familiares do ex-governador e os do empresário Miguel Iskin, representante de multinacionais do setor de saúde, foi o primeiro a azedar em Bangu 8 nos dias de visita.

Ele pediu transferência para o Batalhão Especial Prisional de Niterói, onde está detido o ex-governador Luiz Fernando Pezão (MDB). Autorizada pelo juiz Marcelo Bretas, a mudança foi vetada pela Vara de Execuções Penais.

Cabral divide uma galeria de seis celas de seis metros quadrados cada uma com outros quatros detentos: Eduardo Cunha (ex-deputado federal), Wilson Carlos (ex-secretário), Paulo Melo e Edson Albertassi (ex-deputados estaduais).

Passa o tempo lendo jornais, livros ou fazendo exercícios com halteres feitos de garrafas PET. A leitura já o ajudou a reduzir em 51 dias sua pena —benefício previsto na Lei de Execuções Penais.

Ao longo de três anos, Cabral foi interrogado 23 vezes, tendo ficado em silêncio em apenas duas. No início, se defendia de forma veemente. Chegou a discutir com Marcelo Bretas e com o procurador Eduardo El Hage, coordenador da Lava Jato fluminense.

Após a transferência para Curitiba em 2018, na qual foi algemado nas mãos e nos pés, adotou tom mais humilde. Falou que não soube se conter diante de tanto poder, mas manteve a linha de defesa anterior, de que fizera uso pessoal de sobras de caixa dois de campanha.

No início deste ano, decidiu assumir os crimes que lhe são atribuídos. Seus primeiros depoimentos como réu confesso foram carregados de emoção. Classificou o poder e o dinheiro como vícios.

Afirmou também ter sido achacado por deputados e feito tratos com ministros de tribunais superiores. Mencionou ainda repasses a antigos aliados que nem sequer eram tema de ações penais.

Aos poucos, se tornou mais econômico nas falas, restringindo-se aos temas dos processos em que é ouvido. Tem prestado depoimento em inquéritos em curso antes mesmo da deflagração de novas operações. Ao mesmo tempo, negocia com a PF a ampliação de suas informações.

O resultado prático na aplicação das penas ainda não é possível. Bretas não sentenciou o ex-governador em nenhum processo no qual ele tenha confessado crimes em interrogatório.

O objetivo atual é amenizar sua imagem a fim de atenuar o impacto de uma eventual soltura. O ex-emedebista se desfiliou do partido em setembro, com o intuito de sinalizar publicamente o fim de sua carreira política.

Sua liberdade, porém, é vista com preocupação no Ministério Público Federal.

El Hage classifica a saída de Cabral como um risco. A Procuradoria ainda desconfia que o acusado mantenha oculto parte de seu patrimônio obtido com propinas, apesar das confissões.

“Ele é líder da maior organização criminosa que já foi descoberta no estado do Rio de Janeiro. Não tenho dúvidas de que ele ainda tem muito poder e, em liberdade, pode continuar manipulando essa máquina que funciona a seu serviço”, disse o procurador.

A situação de Cabral

31
ações penais

12
condenações

267
anos, 10 meses e 3 dias em penas

51
dias de prisão remidos com leitura e trabalho

1
condenação confirmada em 2ª instância, mas com recursos pendentes

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