Descrição de chapéu Governo Bolsonaro

Em artigo, chefe da comunicação de Bolsonaro distorce fatos e comete exageros

Secretário Fábio Wajngarten contestou editorial da Folha que fez críticas ao presidente

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São Paulo

Em artigo publicado na Folha nesta segunda-feira (2), o secretário de Comunicação Social da Presidência da República, Fábio Wajngarten, apresentou visão distorcida de fatos e incorreu em exageros e imprecisões ao contestar editorial do jornal com críticas ao presidente Jair Bolsonaro.

O secretário de Comunicação Social, Fabio Wajngarten, e o presidente Jair Bolsonaro - Ueslei Marcelino/Reuters

Wajngarten publicou o texto em resposta ao editorial "Fantasia de imperador", veiculado pelo jornal na sexta-feira (29). Nele, a Folha afirmou que Bolsonaro é incapaz de compreender a impessoalidade da administração republicana.

O editorial citou como exemplos as retaliações do ocupante do Planalto à imprensa crítica por meio de medidas provisórias e a licitação que tirou a Folha das compras de serviços do governo federal, atitude descrita no texto como discriminação a um meio de comunicação.

O secretário de Comunicação chamou o editorial de infame, acusou a Folha de desrespeitar "a figura presidencial" e disse que, em vez de jornalismo, o veículo pratica "leviandade e autoritarismo".

Wajngarten, na contestação à Folha, disse ainda que as manchetes diárias do jornal sobre a economia do país são "sempre com o foco negativo". Na opinião dele, é como se não se pudesse "falar bem do que está dando certo" nem reconhecer "o acerto da condução da política econômica, além da maior reforma da Previdência jamais realizada neste pais”.

Na verdade, a Folha já publicou vários editoriais, textos que expressam a opinião do jornal e que em linhas gerais fazem uma avaliação positiva da política econômica do governo até este momento.

Em 5 de novembro, o texto "Na direção correta" afirmou que a agenda de reformas conduzida pelo ministro da Economia, Paulo Guedes, acerta ao priorizar a modernização do Estado e o controle do gasto público. Em 26 de novembro, o editorial "Modesta retomada" destacou sinais positivos de melhora da economia brasileira, ainda que em estágio inicial.

Em 21 de fevereiro, texto intitulado “Sucesso à reforma” dizia que o cerne da proposta de reforma da Previdência do governo Jair Bolsonaro cumpria três requisitos básicos (justiça na distribuição de sacrifícios, combate às aposentadorias precoces e redução dos privilégios de servidores públicos) e desejava que ela fosse bem-sucedida, “no interesse do país”.

Em seu texto, ainda, Wajngarten escreve que a Folha se junta “àqueles derrotados nas urnas em outubro passado, aos que tentaram matar o então candidato Jair Bolsonaro”.

No entanto, o jornal condenou explicitamente a tentativa de assassinato, chamando-a repetidas vezes de ataque abominável. Dedicou um editorial —“Repúdio geral”, de 7 de setembro de 2018—, em que escreve que “o atentado contra Bolsonaro não tem acolhida num país que está comprometido com a democracia”.

Igualmente, ao longo da campanha de 2018, publicou reportagens com denúncias que envolviam o então candidato Fernando Haddad (PT) ou seu entorno. Uma delas, de 30 de setembro de 2018, mostrava que o núcleo da campanha do petista trazia delatados, réus e investigados pela Justiça, principalmente no âmbito da Operação Lava Jato.

O secretário do governo escreveu que falta ao jornal a legitimidade de Bolsonaro, que goza do "respaldo da maioria dos brasileiros que o elegeu com um pouco mais de 57 milhões de votos, 55% dos votos válidos".

mais recente pesquisa Datafolha sobre a avaliação do governo apontou, porém, que o percentual de brasileiros que avalia a atual gestão como ruim ou péssima supera o daqueles que a julgam ótima ou boa.

Em seu artigo, o responsável pela comunicação presidencial também afirmou que "os frequentes editoriais da Folha de S.Paulo não correspondem à visão majoritária dos brasileiros e da opinião pública".

Segundo o levantamento, publicado no começo de setembro, a reprovação do presidente subiu de 33% para 38% em relação à pesquisa anterior do instituto, feita no início de julho. Bolsonaro é o presidente eleito mais mal avaliado em um primeiro mandato, considerando Fernando Henrique Cardoso (PSDB), Lula (PT) e Dilma (PT) em período idêntico.

Em consonância com o seu projeto editorial, que prevê independência, pluralidade e apartidarismo, a Folha mantém uma atitude crítica em relação aos ocupantes do Palácio do Planalto e aos governos de forma geral.

A relação com a Presidência da República é historicamente marcada pela tensão. FHC e Lula, por exemplo, se queixaram com frequência de reportagens do jornal. 

Uma das diretrizes do projeto editorial é "abordar os assuntos com disposição crítica e sem tabus, no intuito de iluminar problemas, apontar falhas e contradições, questionar as autoridades públicas e os poderes privados, sem prejuízo de buscar conteúdos proveitosos ou inspiradores".

Na série de críticas ao veículo, o auxiliar de Bolsonaro para a comunicação sustentou que o "comportamento reiterado" da Folha a descredencia "como fonte de informação séria para a sociedade em geral" e insinuou que falta ao jornal "compromisso com a verdade".

O projeto editorial, contudo, estabelece como princípio número um a necessidade de "confirmar a veracidade de toda notícia antes de publicá-la". As diretrizes preveem ainda a obrigação de "identificar e corrigir com destaque erros de informação cometidos", bem como "manter mecanismos transparentes de autocontrole e correção".

Além de conceder espaço para contestações dentro de reportagens —o chamado "outro lado"—, a Folha oferece abertura para que críticos do jornal e vozes dissonantes se manifestem por meio de artigos e entrevistas.

Em 7 de novembro, por exemplo, o deputado federal Marco Feliciano (Podemos-SP), aliado de Bolsonaro, escreveu para a seção Tendências/Debates o texto "Governar é fazer escolhas", no qual defendeu a decisão do presidente de determinar aos órgãos federais que cancelem as assinaturas da Folha.

Ministros como Damares Alves (Mulher, Família e Direitos Humanos), Osmar Terra (Cidadania), Tereza Cristina (Agricultura, Pecuária e Abastecimento), Ricardo Salles (Meio Ambiente) e Onyx Lorenzoni (Casa Civil) publicaram artigos na seção. O próprio Wajngarten publicou artigos ali, o mais recente em 26 de julho último.

A lista de membros do governo Bolsonaro que concederam entrevista ao jornal inclui GuedesDamaresTerraTereza e Salles. Também falou com a Folha, quando ainda estava no governo, o hoje ex-ministro Carlos Alberto dos Santos Cruz (Secretaria de Governo)

O próprio Bolsonaro recebeu a Folha em café da manhã no Palácio da Alvorada, em setembro. 

No mês seguinte, ao relembrar o encontro, o presidente deu uma declaração falsa ao dizer que o jornal publicou palavrões na entrevista e que o conteúdo da fala foi distorcido —reclamação que ele não havia feito quando a reportagem saiu.

Wajngarten repetiu em seu artigo uma distorção propagada pelo presidente da República a respeito de decisão do TSE (Tribunal Superior Eleitoral) no âmbito da investigação sobre disparos em massa por WhatsApp na época da campanha eleitoral.

O secretário de Comunicação disse erroneamente que o TSE "já refutou" o "uso indevido de zaps na campanha". Não houve, porém, nenhuma decisão da corte nesse sentido. Nenhum dos processos sobre o caso que tramitam no tribunal foi votado pelos ministros ou teve decisão sobre o mérito.

Wajngarten apontou o que chama de "tentativa permanente de tentar mostrar, com a ajuda do partido do candidato derrotado no segundo turno" —o PT de Fernando Haddad—, que houve uso irregular do envio massivo de conteúdo.

Em setembro, o TSE rejeitou, por 7 votos a 0, uma ação dos advogados de Bolsonaro sobre suposto conluio entre o Grupo Folha e a coligação de Haddad. O relator do caso, ministro Jorge Mussi, defendeu em seu voto a liberdade de imprensa e disse ser "absolutamente improcedente" a imputação.

Desde outubro de 2018, quando foi publicada a reportagem “Empresários bancam campanha contra o PT pelo WhatsApp”, outras notícias do jornal abordaram o assunto, sem sugerir o envolvimento direto de Bolsonaro.

Também é inverídica a afirmação do secretário de Comunicação Social da Presidência de que o editorial "Fantasia de imperador" defende "uma conspiração pela saída do presidente da República, num golpe contra as instituições e, principalmente, contra a vontade da maioria dos brasileiros".

Como reza seu projeto editorial, a Folha busca promover os valores da democracia representativa e, em nenhum trecho do texto, defendeu a saída do presidente. Manifestou o desejo de que Bolsonaro prestigie em seu comportamento as regras do Estado democrático de Direito.

 

Veja trechos do artigo e entenda o contexto

“As manchetes diárias do jornal sobre a economia do país —sempre com o foco negativo— também evidenciam a má-fé, a leviandade e o autoritarismo editorial do jornal contra o governo Bolsonaro. Não se pode falar bem do que está dando certo e nem dos fundamentos macroeconômicos que demonstram o acerto da condução da política econômica, além da maior reforma da Previdência jamais realizada neste país.“

Na verdade, a Folha já publicou vários editoriais, textos que expressam a opinião do jornal, com avaliação positiva sobre aspectos da política econômica do atual governo, principalmente o êxito da reforma da Previdência.

"Com o editorial, a Folha de S.Paulo se junta àqueles derrotados nas urnas em outubro passado, aos que tentaram matar o então candidato Jair Bolsonaro, para pregar o desrespeito, a mentira e a tentativa frustrada de desmoralizá-lo no cargo mais graduado da República."

O jornal condenou explicitamente o episódio. Dedicou um editorial —“Repúdio geral”— em que escreve que o atentado contra Bolsonaro não tem acolhida num país que está comprometido com a democracia.

Igualmente, ao longo da campanha de 2018, publicou reportagens com denúncias que envolviam o então candidato Fernando Haddad (PT) ou seu entorno. Uma delas mostrava que o núcleo da campanha do petista trazia delatados, réus e investigados pela Justiça.

"A fúria editorial do grupo jornalístico contra o presidente Jair Bolsonaro não é de hoje e nem começou com sua assunção à Presidência da República. Já na campanha eleitoral o jornal paulista buscou denegrir sua imagem, ridicularizar suas propostas e plano de governo."

O projeto editorial da Folha prevê independência, pluralidade e apartidarismo. O jornal mantém uma atitude crítica em relação aos ocupantes da Presidência da República e aos governos de forma geral. A relação com o Planalto é historicamente marcada pela tensão. A Folha não faz oposição a nenhum governo.

"Registro aqui apenas a tentativa permanente de tentar mostrar, com a ajuda do partido do candidato derrotado no segundo turno, o uso indevido de zaps na campanha eleitoral, o que o Tribunal Superior Eleitoral já refutou."

O TSE não tomou até hoje nenhuma decisão nesse sentido. Nenhum dos processos sobre disparos em massa por WhatsApp na campanha eleitoral que tramitam no tribunal foi votado pelos ministros ou teve decisão sobre o mérito do tema. A corte também rejeitou uma ação ajuizada por Bolsonaro que apontava conluio entre o jornal e o PT, insinuação considerada "absolutamente improcedente".

"No seu afã de prejudicá-lo, as matérias fantasiam estórias, dão respaldo a mentiras e tentam impor ao leitor sua visão caolha, retrógrada e pessimista com a situação política, econômica e social do Brasil." 

projeto editorial da Folha estabelece como princípio número um a necessidade de "confirmar a veracidade de toda notícia antes de publicá-la". Prevê ainda a obrigação de corrigir erros com destaque. O documento considera o jornalismo profissional um antídoto para fake news e intolerância.

"Os frequentes editoriais da Folha de S.Paulo não correspondem à visão majoritária dos brasileiros e da opinião pública, que não são seu quintal expansionista de estórias nebulosas, de visões autoritárias e mentirosas."

Bolsonaro é o presidente eleito mais mal avaliado em um primeiro mandato, considerando Fernando Henrique Cardoso (PSDB), Lula (PT) e Dilma (PT), de acordo com o Datafolha. Apenas um terço dos brasileiros tem opinião similar à do presidente em aspectos como o golpe de 1964, demarcação de terras indígenas e política ambiental.

"No fundo, o que o editorial do jornal faz é defender uma conspiração pela saída do presidente da República, num golpe contra as instituições e, principalmente, contra a vontade da maioria dos brasileiros."

Folha valoriza a democracia representativa e, em nenhum trecho do texto, defendeu a saída do presidente. Manifestou o desejo de que Bolsonaro incorpore em seu comportamento as regras do Estado democrático de Direito.

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